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Caminhos de Niterói: debate sobre segurança pública enfoca papel da tecnologia e da integração para reduzir criminalidade
Primeira edição do encontro, no auditório da Editora Globo, reuniu prefeito da cidade, comandante do batalhão local e especialistas como Hugo Acero, ex-secretário de Segurança de Bogotá
A transformação de Niterói na segurança pública, sobretudo na última década, foi o ponto de partida para a primeira edição do encontro Caminhos de Niterói, realizado nesta segunda (1º) no auditório da Editora Globo, no Centro, e mediado pelo jornalista Rafael Galdo, editor de Rio do GLOBO. O evento reuniu especialistas para discutir como a integração entre tecnologia, gestão territorial e ações sociais pode resultar em políticas eficientes de proteção urbana. Desde 2018, quando o Pacto Niterói Contra a Violência foi criado, o município registrou quedas significativas nos principais indicadores criminais, invertendo uma tendência histórica que colocava o município em situação mais grave que a cidade do . O Caminhos de Niterói é uma realização dos jornais O GLOBO e Extra com apoio da Prefeitura de Niterói.
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Entre os palestrantes destacou-se o colombiano Hugo Acero, um dos principais nomes da segurança cidadã na América Latina. Ex-secretário de Segurança de , Acero abriu o debate afirmando que a segurança pública não pode ser vista apenas como sinônimo de operação policial e alta letalidade de criminosos. Para o colombiano, a chave do sucesso está também no trabalho em equipe coordenado com a comunidade local, que atenda a suas reais necessidades de serviços públicos, como educação, saúde e cultura.
— Primeiro, é preciso reconhecer o problema. Quando chegamos a Bogotá, a cidade tinha uma taxa de 80 homicídios por cada cem mil habitantes. Nove anos depois, saímos com uma taxa de 23, e hoje a taxa está em 14. Na , os prefeitos têm responsabilidade constitucional e legal em matéria de segurança. Então, nosso prefeito, em uma cidade de oito milhões de habitantes, assumiu essa liderança. Liderança de quem governa, seja presidente, governador ou prefeito — disse o especialista ao lembrar que, no início dos anos 2000, o poder público na capital colombiana enfrentou guerrilhas, crime organizado e ações terroristas, comandadas pelo traficante e narcoterrorista Pablo Escobar.
O especialista detalhou que a estratégia contra o crime incluiu a convocação da Polícia Nacional, do Departamento de Inteligência, do Ministério Público, das Forças Militares e da Justiça. Para Acero, a questão fundamental da América Latina é a ausência do Estado em certas áreas.
— Se o Estado não conseguir recuperar esse território com inteligência, com investigação criminal, com justiça, com segurança e com desenvolvimento, não é possível que isso aconteça. Tem que ir atrás das ligações políticas, porque o verdadeiro traficante não mora na favela — salientou.
Outro modelo de gestão
O prefeito afirmou que a decisão de Niterói de investir em segurança pública como uma escolha política contrariou o consenso entre seus conselheiros, há dez anos. Na época, a maioria dos aliados políticos desaconselhava o envolvimento direto do município na área de segurança, argumentando que a Constituição atribui aos governadores a responsabilidade de administrar as polícias. No entanto, Rodrigo avaliou que os governos estaduais, sozinhos, já não eram capazes de enfrentar o desafio da violência urbana.
— O cidadão não é federal, não é estadual, nem municipal. Ele é cidadão. E como cidadão, ele espera do Estado brasileiro uma resposta que lhe garanta o direito de viver e uma segurança pública mais eficiente nas cidades. Na época, a cidade (Niterói) vivia uma realidade dramática, com indicadores de criminalidade superiores aos da capital fluminense. O roubo de veículos era igualmente alarmante. As ruas eram palco de assaltos à luz do dia, com a atuação do chamado “bonde do fuzil” gerando um clima de pavor entre moradores e visitantes. Niterói, há dez anos, tinha uma realidade completamente diferente da que tem hoje. Não existem soluções simples para problemas complexos — relatou.
O prefeito lembrou ainda das mudanças ao longo do tempo até o momento atual, quando o investimento municipal em segurança pública alcança R$ 19 milhões anuais destinados às polícias — R$ 12 milhões para a e R$ 7 milhões para a . Além desses recursos, Niterói investiu em programas sociais, esporte e tecnologia de monitoramento.
Alberto Kopittke, diretor-executivo do Instituto Cidade Segura e consultor responsável por apoiar a cidade na elaboração do Pacto Niterói Contra a Violência, criticou a abordagem tradicional de segurança pública no Brasil. Segundo ele, muitos prefeitos que decidem atuar na área acabam cometendo o erro de militarizar suas guardas municipais sem implementar mudanças estruturais no modelo de gestão.
— É uma visão antiga. Alguns prefeitos que resolvem entrar no tema acabam criando uma pequena PM azul-marinho. Pegam as guardas municipais, botam o fuzil na mão e dizem: “Fiz minha parte”. E sem nenhum plano, sem mudança no modelo de segurança pública, numa visão totalmente desintegrada. Eu acho que o que Niterói mostra para o Brasil é justamente esse papel da política, com P maiúsculo, de integrar as instituições, de unir a sociedade. Só existe crime organizado quando as instituições estão desorganizadas — argumentou.
Kopittke destacou o trabalho de longo prazo realizado no Caramujo, na Zona Norte, que se tornou símbolo da estratégia integrada de recuperação territorial adotada pelo município. Ao contrário do modelo de operações policiais pontuais e desarticuladas que predomina em outras cidades, disse, em Niterói o processo envolveu cinco anos de planejamento detalhado antes da entrada efetiva das forças de segurança na comunidade.
O consultor foi enfático ao criticar o modelo de operações pontuais que há décadas caracteriza a política de segurança do Rio de Janeiro. Segundo Kopittke, o Rio repete o mesmo padrão: operações policiais que sobem as comunidades e descem, sem transformação territorial efetiva.
A professora Carolina Grillo, coordenadora do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (Geni), da UFF, explicou por que o combate ao roubo de veículos deve ser considerado estratégico nas políticas de segurança pública. Segundo a especialista, o roubo é a principal causa da sensação de insegurança por parte da população, pois atinge de forma indiscriminada todos os estratos sociais.
— O tráfico de drogas é mais visível para uma parcela da população, mas não é diretamente violento. E os homicídios, é claro, são o principal indicador da violência, mas muitas vezes são concentrados numa população que possui algum envolvimento com práticas criminais. Mas o grosso da população, todo mundo, está sujeito ao risco de ser assaltado. E principalmente o roubo armado, mais do que o furto, deixa as pessoas com medo, porque representa um risco para a sua segurança física, a sua integridade física e a sua segurança patrimonial — afirmou.
Carolina detalhou o efeito multiplicador dos roubos de veículos sobre outros crimes, lembrando que os carros tomados de seus donos são utilizados posteriormente para a prática de outros roubos, como os de rua. Os veículos são mantidos no interior de territórios controlados por grupos armados e usados repetidamente em ações criminosas. Por essa razão, disse, ações como o cercamento eletrônico implementado em Niterói têm um impacto significativo na redução dos roubos em geral.
O coronel Leonardo Oliveira, comandante do 12º BPM, trouxe ao debate a perspectiva operacional das forças de segurança. Com 29 anos de carreira na corporação, tendo trabalhado em batalhões de Itaperuna, Magé, Cabo Frio e Rio de Janeiro, o oficial destacou que Niterói representa uma experiência diferenciada, pelo que classificou como esforço genuíno da gestão municipal em compreender as dificuldades institucionais enfrentadas e atuar de forma propositiva para superá-las.
A tecnologia compartilhada foi apontada pelo coronel como um dos principais diferenciais de Niterói. Ele mencionou o Centro Integrado de Segurança Pública (Cisp), que funciona como uma central de inteligência fornecendo informações em tempo real para as polícias.
—O sistema de cercamento eletrônico permite o rastreamento de veículos roubados. Em 2025, foi instalada uma nova tecnologia chamada Shotspotter, sistema que detecta automaticamente disparos de arma de fogo, permitindo que as polícias mapeiem onde ocorrem mais tiroteios e respondam imediatamente — listou ainda o comandante.
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