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Parte da cidade de Petrópolis deixará de ser tombada? Iphan decidirá questão nesta terça-feira; saiba mais

Se o projeto for aprovado, a área tombada no município será reduzida em 38%

Agência O Globo - 25/11/2025
Parte da cidade de Petrópolis deixará de ser tombada? Iphan decidirá questão nesta terça-feira; saiba mais
- Foto: Reprodução

O destino de boa parte da área protegida como patrimônio histórico em Petrópolis, na Região Serrana do Rio, pode ser decidido nesta terça-feira. A proposta de mudança no tombamento do bem cultural denominado “Avenida Koeler: Conjunto Urbano-Paisagístico”, apresentada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), é o primeiro item na pauta da reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural que será realizada na sede da autarquia, em Brasília. Se o projeto for aprovado, a área tombada em Petrópolis será reduzida em 38%.

Aprovação parcial:

Queda de parapente:

A dinâmica da reunião de hoje prevê a leitura do parecer, seguida por debate e votação. Se receber o sinal verde, a proposta segue para o Ministério da Cultura, e caberá à ministra Margareth Menezes homologar ou não a alteração. Quem acompanha de perto o assunto teme que a aprovação abra caminho para surgimento de empreendimentos imobiliários nas áreas que terão a proteção retirada e o consequente impacto na qualidade de vida na cidade histórica.

Centro sem mudanças

Um abaixo-assinado virtual contra a medida, na plataforma change.org, contabilizava 2.290 apoiadores no início da noite de ontem. O texto que justifica a petição, assinado pelo grupo SOS Petrópolis Urgente, afirma que a proposta “abre caminho para uma onda avassaladora de especulação imobiliária que degradará não apenas o patrimônio do centro histórico, mas também todo o seu entorno, comprometendo profundamente a mobilidade urbana e a viabilidade do turismo cultural”.

A alteração, que tecnicamente é chamada de “rerratificação” do tombamento, vem sendo discutida pelo Iphan em encontros presenciais e virtuais com moradores de Petrópolis ao longo do ano. Para a advogada Myriam Borh, criadora do abaixo-assinado e que por anos presidiu a Associação de Moradores do Centro Histórico da cidade, o debate precisa ser ampliado antes de a decisão ser tomada.

— Das sete reuniões em que o Iphan alega ter feito uma explanação sobre a proposta, participaram poucas pessoas. A grande população não teve acesso, não sabe o que é esse projeto. Nós enviamos uma carta ao Iphan solicitando a paralisação do trâmite para que a gente possa ter tempo para fazer a nossa defesa mais técnica em relação ao trabalho apresentado — diz Myriam.

A carta à qual a ativista se refere foi enviada ontem ao presidente do Iphan e aos conselheiros que vão apreciar o assunto hoje. O texto — assinado por representantes da AMA Centro Histórico, da Associação Amigos de Petrópolis e do Instituto Civis — classifica como “precedente gravíssimo” a alteração e pede a retirada do assunto da pauta da reunião.

A proposta apresentada pelo Iphan não prevê destombamentos na região central da cidade, que concentra a maior parte dos imóveis de valor histórico. Nessa área, haverá acréscimo no perímetro de proteção visando garantir a integridade paisagística do local. As mudanças acontecem, sobretudo, no entorno dos principais rios que cortam a cidade e seus afluentes, que perderiam a proteção na linha de cem metros contados a partir de cada cada margem. Parecer técnico juntado ao processo de rerratificação prevê que, dos 11,89km² protegidos atualmente, restem apenas 7,35km², uma redução de 38,18% da área.

Morador de Petrópolis há 37 anos — e há dois meses de volta ao Rio —, o artista plástico Luiz Áquila acompanha o assunto com interesse e se posiciona de forma contrária à alteração:

— Uma liberalização do tombamento é algo muito perigoso, porque Petrópolis, pelo menos o núcleo central da cidade, conseguiu escapar das garras da especulação imobiliária. A preservação não é de monumentos. É não deixar surgir um prédio de dez andares porque ele vai aumentar a quantidade de automóveis nas ruas e a pressão sobre a cidade. É preciso preservar a qualidade urbana.

Para baixo do tapete

Presidente da Comissão de Planejamento, Uso, Ocupação e Parcelamento do Solo, Política Agrícola, Política Urbanística e Habitação da Câmara de Petrópolis, o vereador Thiago Damaceno reconhece a importância do tombamento para a cidade, mas acredita que a revisão é bem-vinda:

— Tem uma série de áreas a partir das margens dos rios que foram tombadas dentro de uma visão pautada principalmente no Plano Koeler lá de trás, mas que são trechos que sofreram muitas modificações. Não tem mais justificativa para um tombamento hoje — acredita o vereador.

Sobre a possibilidade da liberação de novas construções e os problemas adicionais que isso pode causar, o vereador diz que não há projetos tramitando na Casa no momento e que é preciso analisar caso a caso:

— Todo empreendimento traz impacto positivo e negativo. Temos que avançar na legislação de estudo de impacto viário e estudo de impacto de vizinhança, mas não dá para esconder o problema debaixo do tapete como tem sido feito. Acaba acontecendo um outro problema: a moradia fica garantida para quem tem muito dinheiro, e as pessoas que têm menos condição acabam sendo empurradas para morar em locais de maior risco.

Problemas ampliados

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Piabanha se manifestou contrário ao processo de rerratificação. Em carta enviada ao Iphan em agosto, a entidade pede que a autarquia “reconsidere a proposta (...) de modo a manter os rios e os trechos originalmente contemplados no tombamento, garantindo assim a preservação plena do patrimônio histórico, paisagístico e ambiental de Petrópolis”.

— A cidade precisa ser pensada como um todo. Não se pode sair adensando locais que estão sujeitos a ampliar o problema de mobilidade urbana, o problema de drenagem — diz Rafaela Facchetti, diretora do comitê.

Quanto às críticas sobre a possibilidade de adensamento da cidade, o Iphan diz que a proposta “estabelece diretrizes mais claras e específicas sobre suas delimitações, promovendo uma abordagem integrada de preservação” e que “amplia a área tombada no núcleo histórico da cidade, incorpora toda a Vila Operária do Alto da Serra e passa a proteger novos elementos do complexo fabril de Cascatinha”.

A prefeitura de Petrópolis foi procurada, mas não respondeu ao contato feito por e-mail.