RJ em Foco
Especialista em desbloquear celulares roubados dava curso on-line para ‘alunos’ de 11 estados
Allan Gonsalves usava programas da Índia e de Bangladesh. Operação contra esquema prendeu mais de 30 pessoas e recuperou cerca de 2.500 celulares
A prisão de Allan Gonsalves, de 30 anos, em maio deste ano na Baixada Fluminense, revelou que a receptação de celulares não tem limites. A partir de sua captura, a investigação mostrou que o acusado prestou consultoria para criminosos de 11 estados e ainda vendeu cursos em que ensinava remotamente o debloqueio de aparelhos. Ontem, numa nova fase da Operação Rastreio, a prendeu 32 pessoas suspeitas de participar do esquema no país, além de ter apreendido 2,5 mil aparelhos. Só no Estado do Rio foram roubados e furtados, em média, 200 celulares por dia este ano.
Crime organizado:
Marketing do crime:
Os policiais foram às ruas para cumprir 132 mandados judiciais em São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina, Alagoas, Pernambuco, Maranhão, Piauí, Pará e Rondônia, além do Rio. Segundo a Polícia Civil, esta é a maior operação já feita contra roubo, furto e receptação de celulares.
Os alvos são “alunos” e clientes de Allan. De acordo com a polícia, eles fizeram o curso on-line ou forneciam os dados de aparelhos roubados para que Allan fizesse o desbloqueio de forma remota. Numa outra ponta do esquema, estariam os responsáveis por reinserir os dispositivos de origem ilícita no mercado. Muitos endereços onde foram cumpridos mandados de busca e apreensão são estabelecimentos comerciais, como lojas, boxes e quiosques. Durante a ação, os policiais apreenderam R$ 52 mil em espécie.
Foco nos receptadores
Antes da revenda dos aparelhos, o grupo tentava acessar informações sensíveis da vítima, disponíveis em aplicativos de bancos, por exemplo. Com esses dados, conseguiam fazer empréstimos fraudulentos e transferir valores das contas. O governador Cláudio Castro afirmou que o furto e o roubo de celular não são crimes que geram muitos latrocínios (mortes), mas acabam tirando a paz da população.
— Hoje as pessoas mal andam com carteira; levam tudo no celular. Então, quando ele é roubado, gera muito medo porque não é só um celular. É um crime que tira a paz e gera insegurança nas pessoas.
Este ano, 19.780 celulares foram roubados no Estado do Rio de janeiro a setembro — o número é 26% maior que em 2024. Os furtos registrados em delegacias foram ainda mais numerosos: 34.456 casos nos primeiros nove meses, 22% a mais que no mesmo período do ano passado. O delegado Victor Tuttman, titular da Delegacia de Repressão ao Crime contra a Propriedade Imaterial (DRCPIM), contou que, desde o início da Operação Rastreio, a polícia identificou algumas rotas de escoamento dos celulares roubados. Segundo ele, os aparelhos do Rio são espalhados para diversos estados.
— Hoje temos alguns centros que vêm recebendo aparelhos roubados do Rio. Em Santa Catarina, por exemplo, já identificamos um deles. Também fizemos apreensões no Piauí. Mas é uma atuação contínua para identificar essas rotas — explicou.
O secretário de Polícia Civil, Felipe Curi, afirmou que parte importante do combate aos furtos e roubos de celulares é o foco na receptação dos aparelhos que, segundo ele, é quem fomenta a cadeia criminosa:
— Estamos fazendo um trabalho muito grande em cima do receptador para impedir que o ladrão, aquele que rouba ou furta o aparelho, tenha como escoar o equipamento. Nessa operação, nós desarticulamos uma rede de pessoas responsáveis pela receptação, pelo desbloqueio e pela reintrodução desses aparelhos no mercado clandestinamente.
De acordo com Curi, também foram identificadas no Rio algumas favelas que são “abrigos” para quadrilhas que atuam nesses crimes. Uma delas é o Complexo da Maré:
— Essas comunidades oferecem uma espécie de proteção para que esses criminosos possam fazer o desbloqueio e revender os aparelhos.
‘Reset’ em 40 segundos
No Rio, Allan Gonsalves atuava remotamente para desbloquear aparelhos de vários estados da federação. As investigações revelaram que o criminoso conseguia retirar as restrições ao Imei (número único de 15 dígitos que identifica cada aparelho) dos aparelhos roubados, que eram revendidos. Segundo a polícia, ele usava programas estrangeiros da Índia e de Bangladesh para realizar o processo. Em depoimento, o acusado disse que levava somente 40 segundos para fazer o procedimento em alguns aparelhos. Além desse serviço, ele também oferecia cursos on-line para ensina a técnica por R$ 300.
A polícia descobriu que Allan retirava o Imei do aparelho roubado das blacklists das operadoras. Depois, um programa desvinculava do aparelho a conta principal, eliminando todos os dados do proprietário. Com isso, o aparelho voltava ao padrão de fábrica. Uma outra técnica era usar uma ferramenta que permite inserir no telefone o Imei de um “celular morto” e, assim, liberar o aparelho para uso novamente. O serviço de debloqueio custava de R$ 60 a R$ 400, a depender da complexidade do aparelho. A defesa de Allan não foi localização pelo GLOBO.
Felipe Curi alerta para a compra de celulares usados. O proprietário de um aparelho fruto de crime pode ser acusado de receptação, que tem pena de um ano a quatro anos de prisão:
— Pelo aplicativo Celular Seguro (do governo federal) é possível verificar se há alguma restrição no aparelho. É importante que as pessoas desconfiem de celulares com valores muito abaixo dos praticados no mercado e exijam sempre a nota fiscal.
A Polícia Civil do Rio vai devolver hoje 1,6 mil celulares recuperados pela corporação. Os donos legítimos estão sendo convocados por ligação ou mensagens a comparecer aos pontos de entrega. Desde o início do ano, já foram entregues 2,8 mil aparelhos.
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