Poder e Governo

Articulação de Motta pelo PL da Dosimetria leva relação com Planalto ao pior momento desde início do governo Lula

Base governista recorreu até a Arthur Lira em tentativa de evitar derrota na Câmara

Agência O Globo - 10/12/2025
Articulação de Motta pelo PL da Dosimetria leva relação com Planalto ao pior momento desde início do governo Lula
Articulação de Motta pelo PL da Dosimetria leva relação com Planalto ao pior momento desde início do governo Lula - Foto: Marina Ramos / Câmara dos Deputados

A aprovação do Projeto de Lei da Dosimetria, que reduz penas para envolvidos em atos golpistas e pode beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro, desencadeou uma crise sem precedentes entre o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e o governo federal. O episódio é visto como um marco negativo, representando o momento mais delicado no diálogo entre a Câmara e o Palácio do Planalto desde o início do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Líderes governistas avaliam que, mesmo em comparação ao ex-presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL) — cuja relação com o Planalto era marcada por desconfiança —, a condução de Motta significou um rebaixamento no nível de interlocução. Segundo integrantes da articulação política, Lira ao menos avisava o governo quando pautava temas sensíveis ao Executivo.

As queixas recaem sobre o fato de Motta ter colocado o projeto em votação sem qualquer sinalização prévia ao governo. Destaca-se que, na véspera, Motta reuniu-se com a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e com o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), sem mencionar a intenção de pautar o PL da Dosimetria.

Aliados do governo aguardam agora o texto que será analisado pelo Senado, mas já apontam tendência para que Lula vete o projeto.

Durante a votação em plenário, a ministra das Relações Institucionais manteve contato direto com Guimarães, buscando informações sobre o clima e a possibilidade de adiamento da votação.

A base governista tentou negociar até o último momento para adiar a votação. Guimarães, Arlindo Chinaglia (PT-SP) e Renildo Calheiros (PCdoB-PE) buscaram audiência com Motta em seu gabinete, sem sucesso. Em seguida, recorreram a Arthur Lira, e depois abordaram Motta diretamente na Mesa da Câmara, enquanto ele presidia a sessão.

Na conversa, foi proposto um acordo para priorizar outros projetos antes da Dosimetria, mas Motta manteve a pauta e o governo acabou derrotado.

Antes da votação, o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) foi retirado à força da cadeira da Presidência da Câmara, após permanecer cerca de uma hora no local. A Polícia Legislativa foi acionada, gerando tumulto e relatos de agressões a parlamentares. O episódio resultou em acusações de quebra de decoro contra Glauber e inflamou ainda mais os ânimos entre base e presidência.

Em resposta, a Mesa restringiu o acesso ao plenário, expulsando jornalistas e assessores, o que agravou o clima de tensão.

Na retomada da sessão, parlamentares da base governista fizeram discursos contundentes, com críticas públicas inéditas à condução de Motta. O líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), afirmou:

— Vossa excelência está perdendo as condições de seguir na presidência dessa Casa.