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Entenda como Veneza se tornou uma plataforma de lançamento do Oscar
Segundo diretor artístico, festival estava numa posição única para se beneficiar de um abraço mútuo de premiações de cinema e candidatos a prêmios. Só faltava 'uma nova injeção de energia e uma nova identidade'
Hoje em dia a corrida pelo Oscar começa em Veneza, na Itália. Dos últimos 10 vencedores de melhor filme, quatro estrearam lá, incluindo, mais recentemente, “Nomadland” de Chloé Zhao, em 2020. Esse filme também levou o prêmio principal do festival, o Leão de Ouro, tornando-se o segundo filme depois “A forma da água” (2017, de Guillermo del Toro) a reivindicar essa dupla distinção.
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Esta é uma reviravolta notável para um festival de cinema que abre esta quarta-feira e vai até 7 de setembro, e cuja posição internacional incialmente estava caindo. Grande parte do crédito por esta reviravolta vai para o cabeça do festival, Alberto Barbera. Quando o atual mandato de Barbera como diretor artístico começou, em 2012, o festival lutava para atrair filmes dos estúdios de Hollywood.
— Era muito mais fácil ir (ao Festival Internacional de Cinema de) Toronto gastar menos dinheiro e fazer uma promoção adequada para o mercado interno. Mas perder a presença dos estúdios de Hollywood era um grande risco para Veneza — diz Barbera, acrescentando que temia um efeito em cadeia desastroso se os grandes estúdios americanos virassem as costas ao seu festival.
Barbera convenceu a Bienal de Veneza, que administra o festival, a reformar salas de exibição e instalações que não eram atualizadas há décadas. Ele também voava para Los Angeles duas vezes por ano para se reunir com chefes de estúdios e empresas cinematográficas independentes para cortejá-los. Em seu segundo verão no cargo, os esforços deram frutos quando o festival abriu com “Gravidade”, de Alfonso Cuarón, estrelado por George Clooney e Sandra Bullock:
— A Warner Bros. não tinha tanta certeza de que o filme pudesse ser um sucesso comercial.
O filme recebeu ótimas críticas, arrecadou mais de US$ 700 milhões e rendeu a Cuarón o Oscar de melhor diretor. Era exatamente o que Barbera queria. Desde então, não se passou um ano sem que um grande candidato ao Oscar estreasse em seu festival, incluindo os sucessos de bilheteria “La La Land” (2016), “Nasce uma estrela” (2018), “Coringa” (2019) e “Duna” (2021), bem como os sucessos indie “Spotlight: segredos revelados” (2015) e “Tár” (2022).
Um ano depois de “Gravidade”, o festival abriu com “Birdman”, de Alejandro G. Iñárritu, que ganhou o Oscar de melhor filme em 2015.
— Foi quando tudo realmente começou como uma plataforma de lançamento do Oscar — conta Guy Lodge, crítico de cinema da “Variety”, em recente entrevista por telefone.
Segundo ele, Veneza, que necessitava de “uma nova injeção de energia e uma nova identidade”, estava numa posição única para se beneficiar de um abraço mútuo de festivais de cinema e candidatos a prémios que era, na altura, relativamente novo (ele observou que “Oppenheimer”, de 2023, foi o primeiro vencedor de melhor filme que não estreou em um festival norte-americano ou europeu desde “Os Infiltrados”, de 2006).
— Acho que os distribuidores, os estrategistas de premiação e os publicitários começaram a perceber que tinham essa plataforma de lançamento muito aberta para seu tipo de candidato ao Oscar em um ponto que não era muito cedo nem muito tarde, e que lhes daria tempo suficiente fazer barulho em Veneza e ter tempo suficiente para trabalhar nos meses seguintes, à medida que o verão se transforma em outono — diz.
‘Verniz de pretígio’
Junto com os grandes filmes de estúdio, títulos menores também se beneficiaram ao serem exibidos e coroados em Veneza. Lodge apontou “Nomadland” como um filme que provavelmente foi ajudado pelo troféu do festival:
— Se esse filme tivesse sido lançado em Sundance, por exemplo, e fosse muito mais um filme do tipo Sundance, acho que poderia não ter permanecido no rumo, já que Veneza realmente deu ao filme uma espécie de verniz de prestígio.
A nova estatura do festival tornou-o, sem dúvida, especialmente resiliente face aos recentes desafios e perturbações. O festival encontrou uma forma segura de avançar com a sua 77ª edição em 2020, seis meses após o surto de Covid. E no ano passado, o festival apresentou uma edição robusta, apesar da greve dos roteiristas e dos atores. A competição principal de 23 títulos incluiu trabalhos de Sofia Coppola, Ava DuVernay, Michael Mann e Yorgos Lanthimos, que ganhou o Leão de Ouro por seu filme surreal de terror e fantasia “Pobres criaturas”.
— Nós nos comprometemos com uma data de lançamento no final do ano nos EUA antes de irmos a Veneza, com a esperança de que as greves já estivessem resolvidas — conta Ed Guiney, um dos produtores do filme, numa entrevista por telefone do set do novo filme de Lanthimos, “Bugonia”, nos arredores de Londres. — Isso também funcionou muito bem para nós porque recebemos muita atenção para o filme em Veneza, porque ele ganhou o Leão de Ouro e porque foi bem avaliado, etc., etc., mesmo sem a presença dos atores. E isso deu um bom impulso e permitiu que chegasse ao ponto em que nosso elenco se juntasse a nós na estreia americana.
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“Pobres criaturas” foi o segundo longa consecutivo de Lanthimos a competir em Veneza depois de “A favorita” (2018), que também foi coproduzido pela empresa de Guiney, Element Pictures. Depois de conquistar o Leão de Ouro, “Pobres criaturas” acabou ganhando quatro Oscars (de 11 indicações), incluindo melhor atriz para Emma Stone, uma das dezenas de estrelas que não andaram no tapete vermelho do festival por causa da greve.
— Tenho muito respeito pelos cineastas que não retiraram seus filmes porque algumas das estrelas não puderam estar presentes — diz por telefone Laura Poitras, que ganhou o Leão de Ouro em 2022 por seu documentário “All the beauty and the bloodshed”, e que fez parte do júri internacional do ano passado. — Estávamos definitivamente solidários com os atores e escritores em greve. Embora a programação do festival tenha permanecido praticamente inalterada (“Challengers” de Luca Guadagnino foi o único título importante retirado do programa), o impacto da greve foi real. Você sentia que os atores não podiam ser celebrados.
Embora reconhecendo que o festival se tornou um alimentador da temporada de premiações, Poitras acredita que Veneza “também tem sido um lugar para inovação e belos filmes”, elogiando dois filmes que também ganharam prêmios importantes em 2022: “Saint Omer”, de Alice Diop; e “Sem ursos”, de Jafar Panahi.
Lodge diz que havia alguma preocupação inicial de que a integridade do festival fosse comprometida pelo influxo de grandes produções de Hollywood. Mas durante sua gestão, Barbera acalmou esse medo por meio de uma “programação rigorosa e bastante aventureira de títulos menos conhecidos”, especialmente na lista principal da competição.
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Embora a programação atual inclua alguns dos filmes mais famosos deste ano, incluindo “Coringa: delírio a dois”, com Joaquin Phoenix e Lady Gaga, e “The room next door”, de Pedro Almodóvar, estrelado por Tilda Swinton e Julianne Moore, Barbera ressalta ansiosamente que mais de metade dos filmes da competição são de diretores novos no festival.
— Há muitas surpresas — assegura.
Independentemente de quantos futuros indicados e vencedores do Oscar possam estrear no festival, Barbera disse estar “particularmente satisfeito” com a programação deste ano, que foi montada a partir de mais de 4 mil inscrições:
— O objetivo de um festival é descobrir novos talentos, explorar os limites do cinema contemporâneo, novas expressões e novas vozes.
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