Economia

Privatização da Sabesp será por follow-on, diz Tarcísio a deputados de SP

Projeto deve tramitar em regime de urgência, segundo o governador; oposição diz que desestatização deveria vir em formato de PEC, e não projeto de lei

Agência O Globo - GLOBO 17/10/2023
Privatização da Sabesp será por follow-on, diz Tarcísio a deputados de SP
Tarcisio Freitas - Foto: Reprodução

O governador Tarcísio de Freitas confirmou nesta terça-feira, em reunião com deputados da base, que a privatização da Sabesp será por follow-on, ou seja, oferta subsequente de ações na Bolsa de Valores — um novo lote de ações que não existia. A ideia é que o estado de São Paulo deixe de ter o controle majoritário da Sabesp para ter uma participação acionária entre 15% a 30%, segundo pessoas que estiveram presentes no encontro. Hoje, o governo é dono de 50,3% das ações da companhia.

Segundo um interlocutor próximo de Tarcísio, o follow-on se dará para captar grandes investidores, com o objetivo de atrair capital para os investimentos necessários em saneamento. Ou seja, não será uma diluição de ações, e sim a venda para dois ou três grandes investidores.

Na apresentação feita a deputados, a qual O GLOBO teve acesso, o governo ainda cita o modelo de golden share como um dos principais pontos do projeto. Com o modelo, o governo mantém o poder de veto ao estado quanto ao limite de exercício de votos por acionistas ou grupo de acionistas. Nome da companhia, sede e objetivo social também se manterão inalterados.

Outro destaque é a criação do Fundo de Apoio à Universalização do Saneamento no Estado de São Paulo (Fausp), destinado a prover recursos para ações de saneamento básico, inclusive voltadas à modicidade tarifária no setor. A ideia é que o estado destine para o fundo, no mínimo, 30% do valor líquido obtido com a desestatização.

“Também serão destinados ao fundo os valores auferidos pelo estado a título de dividendos ou juros sobre o capital próprio distribuídos pela Sabesp, que deverão ser aplicados, anualmente, em medidas que proporcionem modicidade tarifária nos setores de abastecimento de água e esgotamento sanitário do estado de São Paulo”, diz o texto apresentado pela secretária de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, Natália Resende.

Os recursos do Fausp ainda poderão ser utilizados em casos de emergência ou calamidade pública, em razão de eventos climáticos extremos, para apoio a ações de saneamento e de saúde pública para atendimento à população afetada.

Em julho, Tarcísio já tinha anunciado que sua gestão escolhera como modelo de privatização uma oferta adicional de ações (follow-on) que permita que um único acionista privado tenha maior participação na empresa, tornando-se um acionista de referência, ou seja, com participação acionária relevante. Na prática, a iniciativa privada teria significativo poder decisório sobre a gestão da empresa.

A expectativa é que Tarcísio envie o projeto à Alesp entre terça e quarta-feira. Além da autorização para a desestatização, o PL prevê a antecipação da universalização para 2029 e a redução tarifária com foco na população vulnerável.

A redução da tarifa no curto e longo prazo, um dos focos de preocupação de deputados, será garantida, segundo o governo, com o “uso de recursos do Estado gerados na transação (venda das ações), dividendos próprios, além de melhorias na regulação e incentivo a ganhos de eficiência com gestão privada”.

A privatização da Sabesp será o maior desafio de Tarcísio na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Isso porque o projeto conta com a objeção do PT, segunda maior bancada da Casa, e suscita dúvidas até entre aliados do governador.

Deputados da oposição ouvidos pelo GLOBO acreditam que, mesmo com dificuldades, Tarcísio teria condições de aprovar a proposta. Por isso, partidos como o próprio PT e o PSOL devem buscar vias judiciais para barrar a venda da empresa.

Uma das discussões diz respeito ao modelo da proposta: Tarcísio vai enviar um Projeto de Lei (PL), mas a oposição argumenta que a desestatização deveria vir em formato de Proposta de Emenda à Constituição (PEC). A diferença prática se dá no número de votos necessários para aprovação. A primeira necessita de 48 deputados favoráveis (a chamada “maioria absoluta”). Já a segunda, 57 (“maioria qualificada” ou três quintos do parlamento).

Outra estratégia, que já está em concurso, será fazer pressão popular contra Tarcísio, trazendo à tona possíveis desvantagens que a venda da empresa pode acarretar para a população. Parlamentares têm divulgado, por exemplo, que a própria oposição foi quem instaurou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar possíveis irregularidades e práticas abusivas cometidas pela Enel, segunda empresa com mais queixas registradas no Procon-SP. A companhia ocupou o primeiro lugar em 2021 e 2020.

Protestos contra privatizações

O plano do governador paulista de privatizar a companhia de saneamento básico e fazer a concessão de linhas metroferroviárias motivou uma greve de funcionários do metrô, da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e da Sabesp no início do mês. A paralisação de nove linhas metroferroviárias foi usada por Tarcísio para justificar a necessidade de estudos para as desestatizações, dado que apenas as linhas privatizadas do Metrô e da CPTM mantiveram o funcionamento naquele dia.

— Dizem que são contra as privatizações. Mas quais são as linhas que estão funcionando hoje? Aquelas concedidas à iniciativa privada. Isso mostra que estamos na direção certa, que temos, sim, que estudar (as privatizações) — declarou o governador em coletiva de imprensa no dia da greve.

Representantes das três categorias cobraram de Tarcísio um plebiscito para consultar a população sobre a desestatização da Sabesp e o avanço das concessões de linhas do metrô e trem. O argumento das entidades era de que a entrega para a iniciativa privada significa um “desmonte dos serviços públicos”.

Tarcísio, por outro lado, sustentou que a privatização foi decidida nas urnas, com a sua vitória. Embora seja, de fato, uma promessa de campanha, a venda da Sabesp é rejeitada pela maioria (53%) dos paulistas, como mostrou pesquisa Datafolha realizada entre os dias 3 e 5 de abril de 2023. Somam 40% os que são favoráveis.