Economia

Motoristas e entregadores de aplicativo não chegam a consenso com empresas para regulamentação do serviço

O governo indicou o dia 12 de setembro como prazo final para um acordo entre plataformas e trabalhadores

Agência O Globo - GLOBO 13/09/2023

Mais de noventa dias após o início das reuniões do grupo de trabalho criado pelo governo federal para discutir regras do trabalho intermediado por aplicativos, representantes dos entregadores e motoristas e das empresas não chegaram a um acordo para a remuneração mínima aos trabalhadores. Os próximos passos para uma possível regulamentação do setor dependem agora de uma decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Na terça-feira, representantes dos entregadores, das empresas e do governo se reuniram novamente, mas não houve acordo. No site do governo, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) afirmou que "ficou acertado a continuação das conversas bilaterais com as empresas para encontrar um acordo".

No entanto, segundo o presidente da Associação dos Motofretistas de Aplicativos e Autônomos do Brasil (AMABR), Edgar Francisco da Silva, não houve nenhum acordo:

– Nada foi fechado com os aplicativos. O ministério vai levar todo o histórico do GT nesses 90 dias para o presidente Lula e ver o que ele vai decidir fazer. Estamos aguardando o resultado da reunião de hoje com o presidente – afirma.

Lula hoje tinha uma agenda durante a tarde com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, e a presidente da CAIXA, Rita Serrano. Dentro do governo, o MTE lidera os trabalhos no grupo.

Segundo o ministério, uma proposta única de regulamentação deve ser entregue nos próximos dias a Lula. No texto, a pasta disse, inicialmente, que os motoristas de aplicativo "chegaram a um denominador comum" e que construíram uma proposta para ser entregue ao governo, o que foi negado por representantes da categoria e por empresas ouvidas pela reportagem. Posteriormente, o ministério alterou a publicação.

Presidente da Federação Nacional dos Sindicatos de Motoristas por Aplicativo (Fenasmapp), Leandro Cruz explicou que a proposta ainda não foi definida:

– Vamos continuar as reuniões. Estão para definir a data.

Remuneração mínima é impasse

O governo indicou o dia 12 de setembro como prazo final para um acordo entre plataformas e trabalhadores. No entanto, não houve avanço nas negociações. No fim do mês, quando expira o período do GT, o governo poderá decidir por ampliar o prazo de trabalho por mais 150 dias ou encerrar as atividades do grupo.

O objetivo do presidente Lula era ter um acordo fechado nesta semana para poder endereçar o tema durante discurso na Assembleia da ONU, em Nova York, no próximo dia 19 de setembro.

O principal impasse, até aqui, continua em torno dos valores de remuneração mínima de trabalho, que os entregadores e motoristas consideram insuficientes. As empresas apresentaram duas propostas.

Grandes plataformas, como Uber e iFood, representadas pela Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), sugerem repasse mínimo que varia de R$ 6,54 para entregadores que usam bicicleta, R$ 12 para motociclistas e R$ 21,22 para motoristas de transporte.

Já o Movimento Inovação Digital (MID), que representa Loggi e Rappi, além de 1.253 pequenas empresas regionais, propôs valor mínimo de R$ 7 para entregadores por bicicleta; R$ 11 para motociclistas; e R$ 17 para motoristas.

A Amobitec afirmou em nota que as reuniões "trataram de temas complexos" e que as negociações prosseguem.

"Será necessário mais tempo para o debate aprofundado pelas bancadas sobre as propostas, incluindo a análise detalhada de seus impactos. A Amobitec reforça seu interesse em continuar colaborando para a construção de um modelo regulatório equilibrado, que busque ampliar a proteção social dos profissionais e garantir a segurança jurídica da atividade", disse a entidade, em nota.

O MID e o MTE foram procurados, mas ainda não responderam.

Entenda

Os trabalhadores - Antes mesmo de instaurar o GT, o Ministério do Trabalho e Emprego divulgou que estimava ter 3,05 milhões de trabalhadores nessas plataformas no Brasil. Um dos intuitos era criar um cadastro único para a categoria, com o objetivo de identificar os trabalhadores e criar políticas voltadas a eles).

Quem são - Estudo feito pelo Cebrap, que analisou dados de corridas e entregas fornecidos por 99, iFood, Uber e Zé Delivery, empresas associadas à Amobitec, calculou que o contingente de pessoas que atuam com os aplicativos é de cerca de 1,6 milhão no Brasil, sendo 274.281 motoristas e 385.742 entregadores.

Quase a totalidade é do sexo masculino (97% dos entregadores e 95% dos motoristas). A média de idade é de 33 anos (entregadores) e de 39 anos (motoristas). A maior parte tem ensino médio completo ( 60%) e se declaram pretos ou pardos (62% dos motoristas e 68% dos entregadores).

O GT - O grupo de trabalho foi estabelecido por decreto no dia 1º de maio. Conta com 15 representantes do governo, 15 dos empregadores e 15 dos trabalhadores.

Prazo - Os trabalhos do comitê para estabelecer a regulamentação podem acontecer durante 150 dias, prorrogáveis pelo mesmo período. O intuito inicial, porém, era concluir a proposta de regulamentação do trabalho de apps até início do segundo semestre deste ano.

Outros países - Na Espanha, a regulação impôs às empresas de aplicativos a contratação dos trabalhadores, até então autônomos, como empregados, com direito a férias e descanso remunerados. No Reino Unido, por decisão judicial, o tempo de jornada do trabalhador não é contabilizado apenas quando em viagem, e sim a partir do momento em que liga o aplicativo e enquanto estiver disponível para serviço.

Na Califórnia, nos Estados Unidos, há uma lei desde 2019 que obriga a contratação com natureza empregatícia desses trabalhadores.