Vida Esportiva
Referência mundial em resgates de ondas grandes, Alemão de Maresias desvenda detalhes das operações em Nazaré
Paranaense criado no litoral paulista é grande amigo de Carlos Burle, que sofreu grave acidente no mar da cidade portuguesa semana passada, mas não participou do salvamento do surfista
Do fim de outubro ao início de março, as praias de Nazaré, em Portugal, são invadidas por ondas gigantes, que atraem surfistas do mundo inteiro. As águas podem ultrapassar 30 metros de altura e não exigem apenas muito preparo de quem decide encará-las. Também requerem caronas de pilotos de jet-skis e outros motoristas de moto aquática de prontidão na retaguarda dos surfistas.
O ideal é que estes últimos entrem em ação apenas para levar os atletas de volta à areia, mas, caso algum acidente aconteça, como o sofrido pelo brasileiro Carlos Burle na última semana, eles são acionados para o salvamento. Cumprindo esta função há mais de 20 dos seus 56 anos, o paranaense Edilson Assunção, conhecido como Alemão de Maresias, é referência mundial em resgates aquáticos em condições extremas e conhece os segredos de Nazaré.
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Criado na cidade paulista que lhe rendeu o apelido, Alemão tem uma relação visceral com as águas salgadas. Freesurfer há três décadas, apaixonou-se pelo big surf e pelo mar gigante de Nazaré. Por conta de um cânion submarino próximo a sua costa, a praia portuguesa forma ondulações únicas, de mais de 60 pés (18 metros), e é considerada o melhor destino do mundo para a prática do big surf. Faz dez anos que, na alta temporada de ondas grandes, Alemão se reveza entre desafiar as águas rebeldes em cima da prancha e pilotar com maestria os jet-skis que levam os surfistas para dentro do mar e os resgata depois dos tubos.
— Nazaré é uma operação diferente dos outros picos de surfe, onde você pode pegar a sua prancha e ir surfar. Lá exige um trabalho em equipe. Exige que você tenha uma estrutura mínima que te dê capacidade de ir lá enfrentar as condições que oferecem. O auxílio da moto aquática, nessas condições, faz toda a diferença tanto na quantidade de ondas que o surfista pode pegar, quanto na capacidade dele de enfrentar ondas ainda maiores — explica ele.
O segredo por trás da segurança no surfe de ondas grandes
Para enfrentar as ondas gigantes portuguesas, Alemão afirma que é necessário, antes de tudo, estar prepararado para "tomar um caldo e aguentar um caldo". Algo que exige um trabalho multidisciplinar:
— Mesmo sendo surfista, você precisa de pelo menos um ano de treinamento intenso. Deve treinar apneia, funcional, yoga e muito cardio. E as atividades não são só na piscina, mas também no mar, para que se habitue com as condições adversas.
Além disso, no mar nazareno, só é possível surfar com segurança a partir do tow-in (a- técnica em que o surfista é rebocado por um jet-ski), e a quantidade de pilotos e veículos em torno de um surfista aumenta na medida em que o tamanho das ondas crescem. Segundo Alemão, quando as o. Dos cinco aos dez metros, é preciso um piloto para levar o surfista até o pico e outro de apoio, chamado de segundo resgatista. Se as ondas passam dos 20 metros, um motorista para a condução inicial e dois veículos focados apenas no salvamento.
Tem ainda uma equipe de prontidão fora das águas. Na montanha rente ao mar fica o spotter, pessoa que visualiza o que está acontecendo no oceano e passa as informações por meio de um rádio. Ali também está o câmera, que dá assistência captando imagens do mar, dos surfistas e dos pilotos. E, caso haja alguma emergência, a marina local é acionada. Todos ficam em comunicação direta com um rádio no mesmo canal.
— Eu sou um dos coordenadores (das equipes de tow-in). Além de piloto de surfistas de ondas grandes, sou socorrista. Já fiz vários cursos de primeiros socorros, de salvamento aquático, de vários tipos de salvamento e treinamento. Eu me especializei na pilotagem de moto aquática e, hoje, me tornei uma referência não só aqui de Nazaré. Já venho fazendo esse trabalho há muitos anos, então já tenho uma certa bagagem — conta Alemão.
Heróis das ondas gigantes
No momento em que Carlos Burle se acidentou, no último dia 3, o mar ultrapassava os 20 metros. O surfista desceu em em linha reta, sem conseguir curvar a prancha para alcançar o jet-ski que o aguardava. Foi encoberto por uma sequência de três ondas e chegou perto de desmaiar. Alemão não estava nessa equipe, mas, no mesmo dia, também realizou um resgate, um pouco menos complexo: o skimboarder Lucas Fink tombou com uma moto aquática e ficou à deriva no mar, mas conseguiu subir no veículo pilotado pelo socorrista e não sofreu nada mais grave.
— Foi muito importante ver a conexão, a sinergia, o resultado do treinamento que a gente sempre vem fazendo, para poder fazer tudo com excelência em situações como essa. Algumas coisas fogem do nosso controle, mas sempre damos nosso máximo. Eu acho que essas experiências que a gente viveu agora deixam mais uma lição, para a gente tomar cuidado com alguns detalhes e seguir sempre na busca da evolução e da dedicação da melhoria da performance, não só no surfe, mas também na área do resgate. Desde o acidente da Maya Gabeira, em 2013, muita coisa mudou para melhor — afirma Alemão, referindo-se ao caso da brasileira que, quase morreu tentando surfar uma onde em Nazaré.
Maya tentava bater o recorde de Garrett McNamara (78 pés ou 24 metros), na Praia do Norte, quando caiu e ficou submersa por minutos, até ser arrastada para a areia por uma equipe de apoio, da qual Burle fazia parte. Inconsciente, ela recebeu o primeiro atendimento de socorristas e precisou ser reanimada antes de ser levada a um hospital. A atleta sobreviveu com uma fratura no tornozelo.
Veterano do big surf, aos 58 anos, Burle foi quem levou Alemão a Nazaré pela primeira vez, em 2015. Por conta de tamanha proximidade, ainda que esteja acostumado com esse dia a dia, saber que o grande amigo correu risco de morte estremeceu o socorrista:
— Vê-lo naquela situação foi bem difícil porque eu não estava lá no momento, eu não estava lá para resgatá-lo por questões de logística de equipe. Fiquei sabendo e fiquei muito triste, me abalou bastante num primeiro momento. Mas logo pessoas que estavam comigo foram para o hospital ver o que estava acontecendo com ele e depois, já fora do hospital, a gente trocou ideia, ele estava bem, e eu fiquei muito feliz.
Apesar do susto, Alemão não pensa em abrir mão de sua paixão pelas ondas gigantes de Nazaré:
— Viver essa situação é difícil, mas o que vale é o comprometimento que cada um tem para, quando estiver ali, poder ajudar o próximo da melhor maneira possível. O sentimento é de gratidão por ter esse dom de poder ajudar os outros nas mais diversas circunstâncias, principalmente em condições extremas como essa.
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