Vida e Saúde

Estudo mapeia como a psilocibina remodela circuitos cerebrais ligados à depressão

Descoberta abre caminho para novas possibilidades terapêuticas ao modular a plasticidade cerebral

Agência O Globo - 07/12/2025
Estudo mapeia como a psilocibina remodela circuitos cerebrais ligados à depressão
Estudo mapeia como a psilocibina remodela circuitos cerebrais ligados à depressão - Foto: Depositphotos

Uma colaboração internacional liderada por pesquisadores da Universidade Cornell, nos Estados Unidos, utilizou uma combinação de psilocibina — composto psicoativo dos chamados cogumelos mágicos — e o vírus da raiva para mapear como e onde o psicodélico reconfigura as conexões cerebrais. O estudo demonstrou que a psilocibina enfraquece circuitos de feedback córtico-cortical, capazes de aprisionar pessoas em pensamentos negativos.

Além disso, o composto fortalece vias para regiões subcorticais responsáveis por transformar percepções sensoriais em ação, aprimorando respostas sensório-motoras. Os resultados foram publicados na revista científica Cell.

Considerada uma candidata promissora para desenvolvimento farmacêutico, a psilocibina já demonstrou, em ensaios clínicos, reduzir sintomas depressivos por semanas ou até meses após uma única dose.

O vírus da raiva empregado foi desenvolvido por colaboradores do Instituto Allen de Ciências do Cérebro, em Seattle, para mapear o complexo diagrama de circuitos cerebrais — em analogia aos carros do Google que percorrem todas as ruas de um bairro.

"Com a psilocibina, é como se estivéssemos adicionando todas essas estradas ao cérebro, mas não sabemos para onde elas levam", explica Alex Kwan, professor de engenharia biomédica da Cornell Engineering e autor principal do artigo. "Aqui, usamos o vírus da raiva para analisar a conectividade porque esses vírus são projetados para se transmitir entre neurônios, pulando de uma sinapse a outra."

Principais descobertas do mapeamento cerebral

Inicialmente, os pesquisadores injetaram uma dose única de psilocibina nos neurônios piramidais do córtex frontal de camundongos. No dia seguinte, aplicaram uma variante do vírus da raiva capaz de se transmitir por uma sinapse e marcar neurônios conectados com proteínas fluorescentes. Após uma semana de incubação, a equipe capturou imagens do cérebro e comparou os resultados com camundongos controle, que receberam apenas o vírus.

A marcação fluorescente revelou que a psilocibina enfraqueceu as conexões recorrentes dentro do córtex, o que pode explicar por que pessoas deprimidas ficam presas em pensamentos negativos.

"A ruminação é um dos principais pontos da depressão, quando há um foco excessivo e repetitivo nos mesmos pensamentos negativos", esclarece Kwan. "Ao reduzir esses ciclos de feedback, nossas descobertas sugerem que a psilocibina pode reconfigurar o cérebro para enfraquecer esse ciclo."

Os pesquisadores também observaram que a área sensorial do cérebro passou a se conectar mais fortemente à região subcortical, fortalecendo a ligação entre percepção e ação.

Implicações para futuras terapias

A equipe inicialmente esperava encontrar conexões entre uma ou duas regiões, mas ficou surpresa ao constatar que a reconfiguração provocada pela psilocibina envolveu o cérebro inteiro.

"Estamos realmente analisando mudanças em todo o cérebro, em uma escala inédita. Normalmente, nos concentramos em pequenas partes do circuito neural", pontua Kwan.

O mapeamento extensivo também demonstrou que a quantidade de atividade neuronal pode determinar quais regiões são reconfiguradas pela droga. Isso levou os cientistas a demonstrar que, ao manipular a atividade neural em uma região, é possível alterar como a psilocibina remodela os circuitos.

"Isso abre muitas possibilidades terapêuticas, como evitar parte da plasticidade negativa e potencializar especificamente a positiva", conclui Kwan.

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