RJ em Foco
Do Cristo à Rocinha: como seria o Rio sem o emaranhado de fios na paisagem? IA ajuda a responder
Projeções com inteligência artificial mostram como monumentos e construções históricas poderiam ser contempladas sem os postes e emaranhados

Patrimônio Mundial, o Rio conquistou o título da Unesco por sua paisagem urbana, como a do Cristo Redentor. Mas, para ver a estátua de braços abertos ao longe, muitas vezes, turistas e cariocas precisam desviar o olhar da fiação que se acumula em postes, como na Rua São Clemente, em Botafogo. Esse é apenas um dos monumentos “escondidos” por emaranhados na cidade. Tudo ficaria mais clean caso os cabos estivessem enterrados, não é mesmo? Para revelar essa beleza, O GLOBO pediu que a inteligência artificial (IA) projetasse algumas paisagens sem “obstáculos”.
Aterros do Rio:
Lixo de comportamento:
Na vida real, basta olhar para a Igreja da Penha. Um par de tênis pendurado na rede pode atrapalhar a vista para o templo, que nasceu como uma capela no século XVII, no alto de mais de 380 degraus. Já na Rua Uranos, no vizinho bairro de Ramos, postes e emaranhados de fios colados à marquise do Edifício Iza, tombado pelo município, escondem a delicadeza do estilo art déco.
— A cidade fica horrorosa, impraticável. É uma poluição visual — reclama Mônica Mendonça, que trabalha num consultório dentário do Iza.
E nem precisaria do exercício da imaginação ou de IA para que toda a cidade tivesse o mesmo tratamento dado à orla, assim como às ruas internas de Copacabana, Ipanema, Leblon, de boa parte da Barra da Tijuca e do Centro, e a áreas centrais da Zona Norte, que têm fios aterrados. Em 2011, o Plano Diretor do Rio estipulou prazo de cinco anos para que toda a fiação fosse levada para debaixo da terra.
Mas a Light recorreu, e o caso foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF). A Procuradoria-Geral do Município informou que a Corte entendeu que o custo seria alto para colocar os fios no solo, e a prefeitura perdeu, assim como a paisagem carioca.
— A Zona Norte tem a menor cobertura vegetal do Rio. E, muitas vezes, o argumento usado para fazer podas assassinas na região é que, se ventar forte, a árvore cortará o fio. Se a fiação fosse subterrânea, não precisaria disso — observa o historiador Rafael Mattoso.
Cedae x concessionárias:
Gasto ou investimento?
A Light afirma ter a maior rede subterrânea da América Latina, com seis mil quilômetros (além do Rio, isso inclui partes da Baixada Fluminense e do Vale do Paraíba). A companhia argumenta que a implantação da rede subterrânea custa até dez vezes mais que a aérea, um gasto que teria de ser repassado aos consumidores. Já a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) observa que a escolha de como instalar a rede é da concessionária e que, quando o enterramento é uma exigência da administração pública, “os custos devem ser assumidos pelo requisitante”.
Integrante do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU-BR), Leila Marques observa que a rede em postes tem mais desgaste e chances de acidentes. Para ela, essa substituição seria um investimento, não um custo:
— Qualquer cidade que se propõe a ser turística, como a nossa, precisa ter a paisagem limpa.
Depois das lamparinas, das velas e do óleo de baleia, a eletricidade chegou às ruas por ordem de Dom Pedro II, em 1879, mas só se expandiu pela cidade no século XX. Os primeiros postes foram instalados no Centro, e a rede era subterrânea em alguns pontos, como a Avenida Central (hoje Rio Branco), símbolo das reformas do então prefeito Pereira Passos. Mas, com o rápido crescimento da cidade, a solução foi expandir a rede aérea.
Caçada ao fio sem função
Mais de 140 anos depois, a rede é uma miscelânea. A Light ocupa a parte mais alta dos postes. Os cabos de telecomunicações, em maior número, estão mais abaixo. Com a entrada de novas empresas no mercado, a quantidade de fios se multiplicou. Por isso, a Prefeitura do Rio criou a Operação Caça-Fios, que recolheu 90 toneladas de material dos postes em três anos — 99% são condutores de sinais de internet e TV sem uso.
— Acaba sendo um trabalho que a prefeitura não deveria fazer, porque não é ela que instala esse material. Mas, para evitar acidentes, temos que remover tudo — observa Rafael Thompson, presidente da Rioluz.
A situação é mais enrolada nas comunidades. Na Rocinha, os emaranhados são parte da paisagem. Para melhorar o aspecto, a associação de moradores organiza mutirões para fazer um caça-fios local. Algumas casas e becos, antes da limpeza, sequer eram iluminados pelo sol, mas ainda há muito a ser feito. O GLOBO usou a IA para retirar todo esse cabeamento de um trecho da favela, o que descortinou uma comunidade mais arejada. A tecnologia também revelou uma nova perspectiva na Escadaria Selarón, na Lapa, e em ruas de Madureira e da Tijuca. As imagens estão no site do jornal.
A Light afirma que as operadoras de telefonia e TV, que usam seus postes, “são responsáveis por manter a ocupação conforme as normas técnicas vigentes, evitando o acúmulo de fios”. Por sua vez, o Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (Conexis) argumenta que as operadoras “seguem os padrões estabelecidos em regulamentos e normas técnicas para a instalação de fios e cabos nos postes”.
Dados do edital:
Para uma mudança progressiva na rede elétrica e de telecomunicações, uma esperança surgiu em julho deste ano, com a sanção de uma alteração no Código de Obras do município. Desde então, novas edificações da cidade são obrigadas a instalarem dutos nos passeios, com objetivo de garantir que os fios, quando possível, sejam enterrados.
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