Poder e Governo

Após 'fico' de Guajajara no ministério, Galvão confirma que vai assumir cadeira de Boulos na Câmara

Físico é presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e chegou a ser demitido do Inpe por Jair Bolsonaro, em 2019

Agência O Globo - 22/10/2025
Após 'fico' de Guajajara no ministério, Galvão confirma que vai assumir cadeira de Boulos na Câmara
- Foto: Reprodução

O cientista Ricardo Galvão (Rede), atual presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), será o sucessor de Guilherme Boulos (PSOL) na Câmara dos Deputados, depois de o ex-líder sem teto ser nomeado para a Secretaria-Geral da Presidência. Ele espera uma comunicação formal da ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara (PSOL), de que ela ficará no governo pelo menos até março, mas o GLOBO apurou com ela que isso já está acertado.

A garantia era necessária para que Galvão tenha cerca de seis meses de mandato, sem correr o risco de perder o gabinete em meio a rumores de que ela poderia antecipar a saída para depois da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP-30, em novembro. Guajajara afirma que ficará na Esplanada até próximo do prazo limite para desimcompatibilização exigido pela Justiça Eleitoral a quem ocupa cargos na administração pública e deseja concorrer a um novo mandato em outubro.

Isso porque Galvão é apenas o terceiro suplente da federação do PSOL com a Rede em São Paulo. Foram abertas duas vagas antes, com Sônia Guajajara e Marina Silva (Rede), ministra do Meio Ambiente. A posse de Boulos no cargo responsável pela articulação com a sociedade civil, notadamente os movimentos sociais, disponibiliza a terceira cadeira. Com o retorno de qualquer desses ministros para a Câmara, os deputados federais Luciene Cavalcante e Ivan Valente, ambos eleitos pelo PSOL em São Paulo, detêm a preferência antes do presidente do CNPq.

— Estamos com a incerteza de que a ministra irá sair do ministério ou não, algo que até agora não nos foi informado. Se houver a vaga, eu assumirei. Conversei hoje com a ministra Marina Silva e assumirei o mandato até o final de março. Mas a bola está com ela (Guajajara) — afirma Ricardo Galvão.

Em nota, a assessoria da ministra dos Povos Indígenas afirma que a decisão está tomada, independentemente dos rumores, alardeados pelo próprio suplente. "A informação não procede (de que ela iria para a Câmara em novembro). A ministra Sonia Guajajara será candidata à reeleição e sairá no prazo que a legislação eleitoral exige para descompatibilização", diz a nota. A data limite é de seis meses antes do pleito, ou seja, 4 de abril.

Fontes do PSOL também apontam que a ministra vai permanecer no posto até essa época.

Galvão, desse modo, estaria disposto a exercer o mandato com prazo de validade de seis meses, deixar a Câmara e concorrer novamente em 2026. Já o comando do CNPq seria definido em conjunto com a ministra Luciana Santos (PCdoB), engenheira elétrica que já foi vice-governadora de Pernambuco, em uma aliança com Paulo Câmara (PSB), e prefeita de Olinda.

Quem é Ricardo Galvão

Natural de Itajubá (MG), Galvão formou-se engenheiro de telecomunicações pela Universidade Federal Fluminense (UFF), fez mestrado na Unicamp e doutorado em Física de Plasmas pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos. Construiu carreira no Instituto de Física da USP, onde se tornou professor titular e coordenou projetos de pesquisa em fusão nuclear.

Também dirigiu o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, presidiu a Sociedade Brasileira de Física e integra a Academia Brasileira de Ciências.

Ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Galvão ganhou projeção nacional em 2019, quando rebateu críticas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) aos dados do órgão federal sobre o avanço do desmatamento na Amazônia. Ele reagiu em público, afirmando que o trabalho era técnico, auditável e produzido por servidores de carreira, episódio que levou à sua saída do cargo.

Ele obteve 12.845 votos nas eleições para deputado federal, em 2022, ficando na 86º posição na lista de mais votados e como terceiro suplente da Federação PSOL-Rede para o cargo no estado. Ele assume, aos 77 anos, pela primeira vez, um cargo eletivo, depois de ser nomeado por Lula para presidir o CNPq, logo no início do mandato do petista.

Grupo de Marina avalia deixar a Rede

Galvão é próximo de Marina Silva, ministra do Meio Ambiente que já teria sinalizado a intenção de mudar de partido antes das próximas eleições, segundo fontes próximas à direção do PSB, o que levaria a uma migração também do seu grupo de aliados. Ao assumir o mandato de deputado, contudo, Ricardo Galvão precisaria aguardar até a janela de março a abril para concluir esse movimento sem correr o risco de ser destituído do cargo por infidelidade partidária.

— Olha, o que acontece, todo mundo sabe, são algumas alas divergentes dentro da Rede Sustentabilidade. Agora, as tratativas, se vamos sair ou não, estão sendo conduzidas pela ministra Marina Silva, e eu faço parte do grupo dela. Se ela, que está conduzindo as tratativas, mudar para outro partido, nós seguiremos ou deixaremos a política. Isso será discutido mais tarde — diz Galvão.

A negociação da ministra com o PSB tem ocorrido por meio do prefeito do Recife, João Campos, que está à frente do partido desde junho. Além da estrutura partidária mais robusta, ele ofereceu a Marina a possibilidade de ser candidata ao Senado por São Paulo, em uma articulação que depende do presidente Lula e do PT. A prioridade é manter o vice-presidente Geraldo Alckmin na chapa de reeleição em 2026, mas ele próprio tem sido cotado para disputar uma dessas vagas de senador ou mesmo ao governo do estado.

Antes de anunciar a mudança de ares, Marina quer esgotar juridicamente uma briga interna na Rede Sustentabilidade, sigla na qual perdeu força com a eleição do presidente Paulo Lamac, do grupo rival de Heloísa Helena. Caso se concretize, a filiação marcará um retorno de Marina ao PSB. Em 2014, depois da morte de Eduardo Campos durante a campanha, a então candidata a vice encabeçou a chapa e disputou o Planalto, mas ficou em terceiro lugar.