Mundo Científico
Estudo revela sistema nervoso distribuído em ouriço-do-mar e desafia conceitos sobre evolução
Pesquisa detalha estrutura neural inédita em espécimes jovens e reacende debate sobre a evolução dos sistemas nervosos
É possível que um animal sem cabeça esconda um "cérebro" completo em seu corpo? A questão, que parece um enigma, surge após uma descoberta intrigante feita por biólogos, reacendendo discussões sobre a evolução dos sistemas nervosos.
O Paracentrotus lividus, espécie de ouriço-do-mar encontrada entre rochas do Mediterrâneo e do Atlântico oriental, sempre foi considerado um ser de estrutura simples: espinhos afiados, comportamento discreto e uma rede nervosa rudimentar, distante da complexidade dos vertebrados. No entanto, um novo estudo, publicado em 5 de novembro na revista Science Advances, desafia essa visão tradicional.
Liderada pela bióloga molecular Maria Ina Arnone, da Estação Zoológica Anton Dohrn, em Nápoles, a pesquisa identificou, em ouriços jovens, uma organização neural mais sofisticada do que se supunha. Em entrevista ao portal Infobae, Arnone destacou: “A evolução trilhou muitos caminhos diferentes para resolver problemas biológicos semelhantes, e essa diversidade pode dificultar a nossa compreensão de sistemas nervosos tão diferentes do nosso.”
Um "cérebro integral" espalhado pelo corpo
De acordo com o estudo, conduzido em parceria com laboratórios da Itália, Alemanha e França, indivíduos juvenis apresentam um sistema nervoso integrado capaz de processar informações em diversas regiões do corpo. A equipe analisou 18 espécimes com apenas duas semanas de vida, utilizando técnicas de sequenciamento de RNA de fita simples (snRNA-seq) para mapear cerca de 25 mil núcleos celulares.
O desafio foi grande: dissociar tecidos rígidos dos ouriços sem danificar as células exigiu um protocolo específico desenvolvido no laboratório italiano. O esforço resultou em descobertas inéditas: foram identificados oito grandes grupos celulares e uma diversidade surpreendente de neurônios e fotorreceptores — 29 tipos neuronais e 15 conjuntos distintos de detectores de luz.
Os pesquisadores também localizaram genes tradicionalmente associados ao cérebro de vertebrados ativados em todo o corpo do ouriço. Algumas células apresentaram simultaneamente duas proteínas fotossensíveis — melanopsina e Go-opsina — uma combinação nunca antes registrada em deuterostômios, grupo que inclui os seres humanos.
Essas novas células sensoriais aparecem principalmente nos pés ambulacrários, estruturas usadas tanto para locomoção quanto para percepção do ambiente. A análise sugere que o corpo do ouriço juvenil concentra funções que, em outros animais, estariam restritas à cabeça. Por isso, os autores defendem que o sistema nervoso pode ser descrito como um "cérebro único", distribuído por todo o corpo.
Apesar dos avanços, muitas questões permanecem. A equipe busca saber se a mesma arquitetura aparece em outras espécies de ouriço-do-mar e como esses sistemas evoluem do estágio larval ao adulto. Segundo os cientistas, a investigação pode ajudar a esclarecer como cérebros complexos surgiram ao longo da história evolutiva — e revelar que, nas profundezas do mar, ainda há muitos enigmas biológicos a serem desvendados.
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