Internacional
Ucrânia: sob ameaça de ataque iminente, moradores abandonam Pokrovsk
Habitantes da cidade ucraniana dão como certo que ela será totalmente devastada pela artilharia russa

As placas no trem anunciavam, sem rodeios, sua missão: “Evacuação”. Com abraços e despedidas emocionadas, famílias carregavam crianças e idosos a bordo de vagões na estação central de trem da cidade de Pokrovsk, no Leste da Ucrânia.
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Com o Exército Russo à sua porta e se aproximando rapidamente, Pokrovsk é uma cidade que se curva à realidade. A polícia circula com alto-falantes anunciando instruções abandonar a cidade. Funcionários municipais despacharam livros de biblioteca, carteiras escolares e estátuas de parques e praças.
Até o final da tarde, com um toque de recolher em vigor, as ruas estavam assustadoramente desertas na semana passada, exceto por veículos militares circulando.
O ataque surpresa do exército ucraniano à Rússia no mês passado foi uma das apostas mais ousadas de Kiev na guerra, trazendo rápidos ganhos em território e prisioneiros capturados. Mas a centenas de quilômetros de distância, dentro da Ucrânia, a evacuação total de Pokrovsk é uma evidência dos riscos da operação.
A Ucrânia calculava que sua incursão além da fronteira forçaria a Rússia a desviar tropas para se defender lá. Em vez disso, Moscou continuou com seu avanço implacável no Leste da Ucrânia, e Pokrovsk, um importante centro logístico e de trânsito, está no caminho da destruição.
— Não aconteceu como o planejado — disse Mykyta Pohorelyi, de 19 anos, que estava indo embora com sua mãe e irmã, sobre a movimentação do exército ucraniano na Rússia.
O presidente Volodymyr Zelensky e seu principal comandante militar admitiram que a ofensiva na Rússia, iniciada em 6 de agosto, ficou aquém do objetivo de forçar Moscou a retirar forças da região de Donbas, na Ucrânia.
Já é tarde demais para garantir que Pokrovsk será protegida do bombardeio de artilharia, admitiu o administrador militar da cidade.
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Nos rápidos combates em campos e aldeias próximas, o Exército ucraniano recuou em alguns lugares mais de um quilômetro por dia, disseram soldados que lutavam na área. Os russos estão agora a dez quilômetros da cidade.
O presidente da Rússia, Vladimir V. Putin, “ainda está pensando em como manter os territórios ocupados e não pensa em como proteger seu povo”, declarou Zelensky sobre a resposta de Moscou à incursão da Ucrânia.
O comandante militar da Ucrânia, general Oleksandr Syrsky, disse que a Rússia deslocou 30.000 soldados para se defender da Operação Kursk, mas não da ofensiva em Donbas, a região de minas de carvão e campos de girassol que tem sido um dos principais alvos russos em sua invasão de dois anos e meio.
As forças russas desde abril passaram por cinco linhas defensivas a leste de Pokrovsk, disse Serhiy Dobryak, o administrador militar da cidade. Com apenas mais duas linhas restantes, a incursão na Rússia e o possível desvio que poderia causar eram essencialmente uma última esperança.
A cidade por enquanto não corre risco de captura iminente, disse ele, mas as autoridades esperam um bombardeio de artilharia sustentado que provavelmente deixará Pokrovsk em ruínas. Esse tem sido o destino de outras cidades ucranianas como Bakhmut e Avdiivka, que a Rússia bombardeou até os destroços antes de forçar a Ucrânia a recuar.
— Eles vão trazer a artilharia para perto e destruir a cidade. Isso é certo — afirmou Dobryak.
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Com essa perspectiva iminente, a população da cidade caiu de cerca de 62.000 habitantes no início de agosto para 36.000 hoje. Sinais de pessoas fugindo estão em toda parte.
Na estação de trem, os vagões rangiam e tilintavam. Os freios foram acionados com um chiado, sinalizando uma partida.
Uma mãe observou a filha se despedindo com lágrimas do marido, que ficaria para continuar trabalhando em uma mina de carvão.
— Não chore. Deixe-me chorar por você — disse ela.
As mercearias fecharam. As calçadas estão cheias de armações de cama, televisões de tela plana e sacolas plásticas cheias de roupas.
Um toque de recolher está em vigor, exceto por quatro horas no final da manhã e da tarde.
— O inimigo está cada vez mais perto — lamentou Ihor Kopytsya, dono de uma papelaria que estava tentando embarcar o último lote de seus cadernos, canetas e mochilas antes do bombardeio começar.
Questionado sobre a aposta militar de que um ataque à Rússia retardaria o avanço em direção a sua cidade, ele a classificou como uma tentativa digna:
— Eles esperavam que funcionasse, mas não funcionou — lastimou ele.
Volodymyr Porosyuk, 20, estava fugindo com sua avó, Zoya Porosyuk, 88.
— Quando os expulsarmos, voltaremos. Se houver algo para voltar — frisou Porosyuk.
Em uma escola reaproveitada para registrar pessoas deslocadas internamente, voluntários de um grupo de ajuda, Light of Donbas, entregavam animais de pelúcia às crianças enquanto embarcavam nos ônibus, para aliviar a viagem. “As pessoas percebem que terão que sair para sempre”, disse Alyona Fyodorova, voluntária.
Nina Mashtikhina, 71, que estava se mudando para viver com sua filha no Oeste da Ucrânia, disse que o exército fez o melhor que pôde, mesmo que a cidade não seja salva.
— Agradeço a eles. São bons rapazes — disse ela.
Mas outros moradores questionaram por que tropas foram enviadas para a Rússia, quando poderiam ter servido melhor protegendo sua cidade nas trincheiras a leste de Pokrovsk.
— Eles deveriam ter defendido aqui — criticou Iryna Sekreteva, de 39 anos que estava indo embora com o filho de 15 anos, Bohdan.
Uma curta viagem fora da cidade, um comandante de artilharia ucraniano assistia a um vídeo transmitido por drones de reconhecimento. Mostrava soldados russos invadindo quintais da vila de Mykhailivka, envoltos pela fumaça de incêndios.
Os combates ocorreram em uma série de pequenos movimentos. O Exército russo depende em grande parte de unidades de infantaria. Os soldados correm e se escondem em árvores ou casas abandonadas perto das posições ucranianas, depois atacam. O Exército ucraniano relatou 58 desses confrontos perto de Pokrovsk, somente na quinta-feira.
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Nas proximidades, em um campo, soldados suados e cobertos de poeira da 15ª Brigada da Guarda Nacional Ucraniana disseram que estavam mirando uma posição russa perto de uma escória de mina de carvão que apenas cinco dias antes havia sido uma fortaleza ucraniana. "Nós simplesmente não temos mais gente", reconheceu o comandante, que pediu para ser identificado por seu apelido, Doker, de acordo com o protocolo militar ucraniano.
A resposta lenta da Rússia à incursão de Kursk pode refletir desorganização em seu exército, disse Johan Norberg, analista militar da Agência de Pesquisa de Defesa Sueca, ou alternativamente pode ser uma troca estratégica — capturando mais território na Ucrânia enquanto deixa seu próprio território pouco guardado.
— Eles tinham impulso em Donbas, então por que não continuar com isso? A Rússia pode facilmente trocar território por tempo. A incursão teve um custo para Putin internamente e externamente, sinalizando uma incapacidade de defender a fronteira — explicou Norberg, sobre o possível cálculo russo, com a intenção de voltar para Kursk mais tarde.
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No entanto, nada reduziu o ímpeto do avanço russo, forçando um triste ajuste de contas para aqueles que agora deixam Pokrovsk.
Vitalia Trusov, de 37 anos, economista da empresa nacional de ferrovias, sentou-se em uma cadeira na calçada abraçando sua filha, observando tudo o que estava em sua casa sendo carregado num caminhão de mudança.
— Estamos indo embora para sempre. Construiremos uma nova vida em algum lugar tranquilo — ressaltou Trusov.
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