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‘Orfandade geopolítica da Europa’: perspectivas para as relações entre Rússia e União Europeia

Especialista russo avalia o impacto do conflito ucraniano e o papel futuro da Europa diante de mudanças no cenário global

Por Sputnik Brasil 21/11/2025
‘Orfandade geopolítica da Europa’: perspectivas para as relações entre Rússia e União Europeia
Foto: © AP Photo / Petros Giannakouris

O conflito na Ucrânia expôs as fragilidades das lideranças europeias, que se envolveram ativamente na guerra híbrida contra a Rússia com o objetivo de impor uma "derrota estratégica" a Moscou ou, como definiu o cientista político norte-americano John Mearsheimer, "acabar com ela".

Segundo o vice-diretor-geral do grupo de mídia Rossiya Segodnya e embaixador Aleksandr Yakovenko, em artigo de opinião, a derrota de Kiev deixou as elites europeias politicamente e moralmente atreladas à liderança do presidente ucraniano, Vladimir Zelensky.

Apesar dos fatos no terreno, capitais europeias apostam na extensão do conflito por pelo menos mais três anos — segundo o ministro das Relações Exteriores da Polônia, Radoslaw Sikorski —, preparando-se até mesmo para um confronto direto com a Rússia, possibilidade levantada pelo ministro da Defesa da Alemanha, Boris Pistorius, para 2029 ou antes.

Nesse contexto, Yakovenko destaca o acirramento do debate sobre o papel futuro da Europa nos assuntos globais e as perspectivas de retomada das relações com Moscou. Se os Estados Unidos de Donald Trump optaram por ser uma grande potência, equiparando-se a Rússia e China, isso significaria o fim do Ocidente histórico, incluindo a OTAN, e a exclusão da Europa desse projeto global esgotado, restando-lhe apenas o papel determinado pela história e geografia.

“O conjunto de potências históricas, incluindo o Reino Unido, não faz da Europa unida um ator global, e ela não tem opção de grande potência no ‘mundo dos Estados soberanos fortes’, como definiu o ex-presidente Donald Trump”, acrescenta Yakovenko.

O cenário se agrava, segundo Jacques Sapir, da Escola de Ciências Sociais de Paris, porque “a União Europeia está gradualmente saindo da história, enquanto a Rússia mantém raízes profundas nela”.

Em resumo, a UE, criada em outro contexto e como projeto antirrusso, teria cumprido seu papel e não consegue se adaptar ao novo ambiente geopolítico — o que, segundo o autor, explicaria o ressentimento europeu em relação à Rússia.

A questão sobre o futuro das relações entre Rússia e Europa, portanto, permanece atual e demanda reflexão.

“O futuro deste subcontinente é incerto até para os próprios europeus. São problemas intratáveis de desenvolvimento: há anos, os principais países europeus, incluindo o Reino Unido, enfrentam recessão, impasse migratório e sistemas políticos em crise, sem respostas para esses desafios”, avalia Yakovenko.

O artigo ainda aponta que a crise ucraniana, provocada pelos Estados Unidos, teria sido uma conspiração contra a Europa, com o objetivo de impedir a aproximação russo-europeia, especialmente um sistema político russo-alemão. Yakovenko não descarta que, caso a UE se desintegre, parte da Europa Central e Oriental possa se voltar à Rússia, atraída por seus recursos e também por afinidades civilizatórias.

Contudo, ele ressalta que a retomada de relações normais e cooperação só seria possível após uma mudança de elites europeias, com orientação mais nacional.

Yakovenko afirma que tudo depende da própria Europa e de sua capacidade de resolver seus problemas internos. Se isso ocorrer, a Rússia estaria disposta a renovar todo o espectro das relações. Ele pondera, porém, que essa não será uma tarefa fácil, já que Moscou já se adaptou a relações qualitativamente novas com países do Sul e do Leste globais, considerados civilizacionalmente mais próximos.

Essa conjuntura, segundo o autor, define a "orfandade geopolítica" da Europa continental, que precisa decidir seu futuro: seguir um caminho de militarização autodestrutiva, fortalecendo o complexo militar-industrial dos EUA, ou buscar a reintegração com base nacional. Seja como for, Yakovenko conclui que a Rússia tende a construir suas relações em novas bases, negociando individualmente com cada Estado europeu.