Economia

Clientes começam a entrar na Justiça contra a 123Milhas. Saiba como ingressar com a ação

Advogados pedem que clientes com viagens próximas tenham os embarques mantidos

Agência O Globo - EXTRA 23/08/2023
Clientes começam a entrar na Justiça contra a 123Milhas. Saiba como ingressar com a ação

Clientes que compraram pacotes de viagens com a 123Milhas e têm embarques próximos já estão ingressando na Justiça contra a empresa na tentativa de não perder o voo. O advogado Yannick Robert, advogado escritório PRP Advogados e professor de Direito nas faculdades integradas Hélio Alonso (FACHA), está ingressando com cinco ações de consumidores que adquiriram passagens aéreas pelo pacote "Promo", com viagens marcadas de setembro a dezembro, e receberam o e-mail de que seus embarques foram cancelados. Os clientes receberam a proposta de oferecimento de um voucher para viagens futuras e que só poderia ser utilizado no próprio site.

O advogado questiona oferta de voucher, e entrou com pedido de liminar solicitando que clientes com viagem próxima não deixem de embarcar.  

-- No escritório, estou com cinco clientes com viagens marcadas para Portugal, França e Itália. Não sei se a liminar vai ter tempo hábil para salvar a viagem, mas os consumidores foram avisados em cima da hora, e não conseguirão comprar outras passagens. Estou notificando a 123Milhas porque o compromisso tem que ser honrado e cumprido. Além disso, ingressamos na Justiça com pedido de liminar. Já o processo de pedido indenizatório vai levar um tempo até que saia uma sentença. A empresa estava oferecendo pacotes com preços muito baixos. É quase uma pirâmide, fazendo um negócio que não tem lastro, ainda mais com variação de câmbio, e preços das passagens -- avalia Yannick. 

Frustração

A funcionária pública Úrsula Mana, de 44 anos, comprou passagens aéreas para Lisboa, em abril. A viagem aconteceria no dia 15 de setembro. Ela pagou à vista no PIX R$ 6.300 por bilhetes para ela e o marido. No último sábado, recebeu um e-mail da 123Milhas oferecendo um voucher e dizendo que a viagem foi cancelada. Ela tentou todos os canais de atendimento da empresa, mas não conseguiu contato. 

-- É frustrante. Você vem se planejando o ano inteiro, planejando cada detalhe da viagem com antecedência. Eu não consigo remarcar as férias. Já tentei contato com eles, mas nenhum canal responde, ou só tem respostas genéricas. Já abrir uma reclamação no Procon. Quando você está pagando muito mais barato, pode até desconfiar. Mas eu paguei mais de R$ 3 mil por passagem, o que condiz com a realidade,  por isso não desconfiei. Nunca havia comprado nesse tipo de site, sempre tive medo -- contou Úrsula. 

 A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) pediu esclarecimentos à empresa sobre a suspensão de pacotes de viagens, e questione porque a 123 milhas disponibilizou aos consumidores apenas um e-mail como forma de contato, os motivos que levaram a empresa a não atender as demandas referentes a adiamento ou cancelamento de serviços e ressarcimento, além de perguntar se a plataforma de vendas online tem condições de cumprir as obrigações contratuais assumidas.

De acordo com a Senacon, a modalidade de venda de passagens por meio de transferência de milhas precisa atender a previsão do Código de Defesa do Consumidor (CDC). 

Além disso, a devolução exclusivamente por meio de voucher, como definiu a empresa em comunicado, fere a legislação. Segundo a secretaria, o reembolso deve garantir que os consumidores não tenham prejuízo e a opção por voucher não pode ser impositiva, nem exclusiva.

Para Graziela Fortunato, especialista em Finanças Pessoais na Escola de Negócios PUC Rio, a empresa tem um modelo de negócio e deveria ter calculado o risco, e não repassar o risco do negócio ao consumidor

-- É um pouco tarde para eles começarem a cancelar viagens assim. Os juros estão altos há muito tempo, e o câmbio está alto há muito tempo. É uma estratégia de venda, um modelo de negócio que a empresa deveria ter calculado os riscos de não funcionar -- afirma ela. 

Somente o Procon-SP recebeu mais mil reclamações contra a empresa, somente no último fim de semana quando o anúncio de suspensão dos pacotes foi tornado público. 

Como ingressar na Justiça

De acordo com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), o primeiro passo é tentar resolver diretamente com a empresa. Porém, como há relatos de dificuldade no contato direto com a empresa - que costuma ser um atendimento através de um robô e que não soluciona o problema - o cliente pode utilizar a plataforma consumidor.gov.br ou ainda no Procon.

Se mesmo tentando a negociação, a empresa não resolver o problema, a última medida é o ingresso na Justiça. Segundo o Idec, raramente as empresas indenizam o consumidor por danos em negociação amigável, "então a abertura de processo judicial se mostra como uma medida eficaz caso você tenha sofrido danos adicionais com a perda das passagens ou viagem".

Se o valor do pacote somado com eventuais danos for inferior a 20 salários mínimos (R$ 24.400), é possível entrar com processo no Juizado Especial Cível, gratuitamente e sem advogado. É possível ingressar a ação no JEC presencialmente ou em alguns Estados pela internet. Na Lei não há uma determinação de algum procedimento específico, e como os JECs foram instituídos de forma estadual, isso pode variar conforme cada tribunal.

Já para ingressar a ação presencialmente, basta comparecer ao JEC mais próximo de sua residência com documentos pessoais (RG e CPF) e comprovante de residência, e das informações sobre o réu (CPF ou CNPJ e endereço).

Os fatos que justificam a ação devem ser levados por escrito em uma petição, sem opiniões pessoais ou emoções e buscando descrever os acontecimentos de forma clara e objetiva.

O cliente também pode buscar a orientação de um advogado especializado em Direito do Consumidor para entrar com pedido de liminar. Já no Juizado de Pequenas Causas, o consumidor pode ingressar com ações no valor de até 40 salários mínimos (R$ 52.800).

Os clientes também podem ingressar em uma ação civil pública contra a empresa. Neste caso, é preciso acompanhar qual entidade ou órgão está entrando com o processo, e pedir sua inclusão após a divulgação do edital. Na maioria dos casos, é preciso ser associado a estes órgãos.

A empresa foi procurada, mas não respondeu ao contato.