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Sobras de esmeraldas: o sonho dos garimpeiros pobres da Colômbia

Mineiros de Muzo, cidade colombiana, disputam por esmeraldas que sobram de uma grande mineradora na esperança de mudar de vida

Agência O Globo - EXTRA 18/07/2024
Sobras de esmeraldas: o sonho dos garimpeiros pobres da Colômbia

Na cidade colombiana de Muzo, capital mundial da esmeralda, o que é lixo para alguns, pode se tornar o tesouro de outros. Nessa pequena comunidade, que fica nas montanhas do leste dos Andes, a empresa multinacional de mineração chamada Serviços de Mineração Esmeralda (EMS, em inglês) deposita toneladas de terra processada de suas operações em um recinto semelhante a uma gaiola. Algumas vezes por mês, eles permitem que centenas de mineiros - conhecidos como caçadores de tesouros - vasculhem os detritos e levem para casa as pedras preciosas que encontrarem.

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Entre os mineiros está Miguel Hernandez, de 72 anos, que segura uma bengala enquanto espera do lado de fora da gaiola, onde alguns esperançosos estão na fila desde às três da manhã.

— Que nosso Pai Celestial me dê um presente para que eu possa comprar uma casa nova. É o que eu mais quero — disse ele à AFP.

Muitos caçadores de esmeraldas trazem suas próprias pás e sacos. Depois de encher os sacos com o máximo de terra que puderem carregar, eles levam os sacos até um riacho próximo e filtram o que encontraram para ver se há alguma esmeralda escondida dentro deles. Várias associações de mineiros foram autorizadas pela EMS para ajudar a coordenar a logística, organizando-os em diferentes grupos para tentar neutralizar o caos.

— Eu não entro lá porque as pessoas são terríveis. Eles agarram você, jogam você, pisoteiam você — disse Maria Rodriguez, de 58 anos, que acompanhava seu marido mineiro.

O recinto permanece aberto por cerca de quatro horas de cada vez e, no final, muitos voltam para casa de mãos vazias na maioria das vezes.

Febre verde

Os caçadores de esmeraldas vêm de toda a América do Sul para Muzo, uma cidade com cerca de 9 mil habitantes, cerca de 200 quilômetros ao norte da capital Bogotá.

— A mineração causa um problema muito delicado. As pessoas vêm com a expectativa de que serão milionárias um dia — disse à AFP Ximena Castaneda, prefeita de Muzo — Alguns chegam e ganham dinheiro, enquanto outros nunca ganham — continuou ela.

Uma economia secundária surgiu em torno da loucura da mineração, com vendedores vendendo alimentos, bebidas e ferramentas fora da área de mineração, gerando até US$5 mil (cerca de R$27,3 mil) por dia, de acordo com as associações de mineração.

— Estou nas minas aqui há 30 anos e as esmeraldas saíram, mas a cada dia está ficando mais difícil — disse Gilberto Cifuentes, de 54 anos, à AFP.

Desigualdade

A Colômbia é um dos maiores produtores de esmeraldas do mundo, com exportações de gemas totalizando US$122 milhões (R$668.4 milhões) em 2022, de acordo com a Federação Nacional de Esmeraldas. No entanto, a maior parte dos lucros vai para corporações multinacionais de mineração ou para famílias poderosas de mineradores.

As estruturas atuais remontam à década de 1980, quando mineradores de esmeraldas rivais desencadearam uma “guerra verde” que matou milhares de pessoas nessa região do centro da Colômbia.

Victor Carranza, conhecido como “o czar das esmeraldas”, aproveitou o apoio de grupos paramilitares e traficantes de drogas para impor um monopólio e intensificar ainda mais o conflito, de acordo com relatórios de inteligência. As consequências revelaram uma desigualdade gritante no setor de mineração.

A EMS, que não se posicionou à AFP, opera uma fundação em Muzo que realiza vários programas sociais. Ainda assim, alguns acreditam que a EMS poderia fazer mais para retribuir à comunidade empobrecida ao redor das minas.

Steven Ariza, de 35 anos, supervisiona uma das associações de mineiros depois que o líder anterior do grupo foi baleado e morto em 2022. Ele disse à AFP que o grupo defende que a EMS contrate mais trabalhadores de Muzo, forneça suprimentos localmente e, de modo geral, invista na região.

Steven Medina, de 24 anos, também busca conscientizar a população sobre a situação dos mineiros. Medina leva compradores estrangeiros em visitas regulares às minas para mostrar a realidade por trás das pedras preciosas, a maioria das quais acaba na Europa ou nos Estados Unidos.