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'Chantilly de pimenta' é usado como método de tortura em presídio de Mato Grosso, aponta relatório

Inspeção do Tribunal de Justiça revela práticas sistemáticas de tortura cometidas por policiais penais na Penitenciária Ferrugem, em Sinop.

23/12/2025
'Chantilly de pimenta' é usado como método de tortura em presídio de Mato Grosso, aponta relatório
Imagem ilustrativa gerada por inteligência artificial - Foto: Nano Banana (Google Imagen)

Detentos da Penitenciária Ferrugem, em Sinop (MT), relataram conviver diariamente com humilhações, espancamentos e torturas, conforme aponta relatório do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, que inspecionou a unidade em outubro. Confinados em um pátio cercado por cães e policiais armados, os presos descrevem um ambiente de medo e violência, atribuindo os abusos à força de elite da polícia penal, o Serviço de Operações Especializadas (SOE).

O documento, com 240 páginas, detalha agressões praticadas por policiais penais contra os 1.595 detentos do presídio, conhecido pela estrutura precária e métodos considerados medievais. Segundo testemunhas, agentes demonstravam prazer ao submeter presos a torturas e humilhações, agindo com o aval da direção do presídio e ignorando ordens externas.

O diretor da unidade, Adalberto Dias de Oliveira, o subdiretor Antônio Carlos Negreiros do Santos e o policial Paulo César Araújo Costa foram afastados por 180 dias, conforme determinação do Tribunal de Justiça, mas seguem recebendo remuneração. O espaço segue aberto para manifestação dos servidores citados.

Procedimento chantilly

Entre os métodos de tortura, destaca-se o chamado "procedimento chantilly", em que o policial aciona spray de pimenta na própria mão e esfrega o produto nos olhos dos detentos, especialmente quando estão em posição de submissão. O relatório aponta que a prática ocorre há pelo menos cinco anos, criando riscos graves à saúde dos presos devido à aspiração do agente químico em ambientes fechados e superlotados, como a cela conhecida como "latão".

Imagens analisadas pelo Tribunal mostram policiais disparando armas químicas pelas aberturas das celas, atingindo presos sem possibilidade de defesa. Em alguns casos, dois agentes agiam simultaneamente em celas vizinhas, caracterizando agressão deliberada.

Em resposta às denúncias, a Secretaria de Estado de Justiça de Mato Grosso (Sejus) informou ter instaurado procedimento administrativo para apurar os fatos, ressaltando que os episódios ocorreram durante o início de um motim, quando detentos tentaram destruir celas e avançar contra policiais. Leia a íntegra da manifestação abaixo.

Depoimentos e rotina de abusos

O detento Diogo Henrique Damasceno Moraes relatou que, em 26 de outubro, após a janta, policiais armados e cães foram usados para intimidar presos após um incidente envolvendo o sequestro de um detento. Ele afirmou ter sido espancado e submetido ao "chantilly de pimenta" durante uma tentativa de fuga em 2024, prática confirmada por outros oito detentos ouvidos pelo grupo de fiscalização do Tribunal.

Para a Justiça de Mato Grosso, os relatos e imagens evidenciam o uso indevido do poder estatal para a prática de tortura, projetando a imagem de um poder paralelo dentro da unidade prisional.

Manifestação da Secretaria de Estado de Justiça de Mato Grosso

A Sejus informou ter recebido o relatório de inspeção do Tribunal de Justiça em 12 de dezembro e instaurou apuração interna, conduzida pela Corregedoria-Geral, para examinar minuciosamente os fatos. A Secretaria reforçou que, em 2025, não houve denúncia formal sobre tortura na penitenciária e reiterou não compactuar com abusos, prometendo responsabilização caso os crimes sejam confirmados.