Finanças

Estabilidade na taxa de desemprego pelo 3ºmês seguido é um sinal de que o mercado de trabalho começa a desacelerar? Entenda

Apesar de ter renovado o menor nível da Pnad, índice ficou abaixo do esperado, com cortes na indústria e comércio

Agência O Globo - 01/11/2025
Estabilidade na taxa de desemprego pelo 3ºmês seguido é um sinal de que o mercado de trabalho começa a desacelerar? Entenda

Após sucessivas quedas, a taxa de desemprego ficou no trimestre encerrado em setembro, renovando o menor nível da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, divulgada pelo ontem. O índice veio acima do esperado por analistas de mercado, que estimavam queda para 5,5% em setembro, indicando os primeiros sinais de redução de ritmo do mercado de trabalho, com comércio e indústria cortando vagas.

Erro:

Calculadora do 13º:

Nos três meses anteriores, encerrados em junho, que servem de base de comparação para o resultado de ontem, a taxa de desocupação estava em 5,8%.

Com sinais ambíguos, o rendimento médio real foi de R$ 3.507, o maior da série histórica da pesquisa, iniciada em 2012, valor 4% mais alto do que o mesmo período do ano passado. Segundo analistas, são indícios de que o mercado ainda está aquecido, apesar da estabilidade na taxa de desemprego, e deve fazer o Banco Central manter a taxa básica de juros em 15% ao ano na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que acontece nas próximas terça-feira e quarta-feira.

Míriam Leitão:

Cláudia Moreno, do C6 Bank, só vê um corte nos juros em março de 2026. Para ela, a maior renda pode impulsionar o aumento no preço dos serviços e pressionar a inflação:

— O (Gabriel) Galípolo (presidente do Banco Central) vem falando que a gente está em um mercado de trabalho muito exuberante. Ele usou frases fortes para falar sobre isso. Entendo que ele olhe bastante também para o efeito que isso vai ter na inflação.

Emprego

Embora o percentual tenha se mantido estável, a população desocupada caiu para seu menor número já registrado desde o início da pesquisa: 6,045 milhões, com queda de 209 mil pessoas em comparação com o trimestre encerrado em junho e menos 809 mil pessoas no ano.

E o emprego formal não para de crescer. O número de empregados com carteira assinada chegou a 39,229 milhões, o mais alto da série histórica.

Sinais:

Economistas afirmam que os últimos resultados ainda reforçam o cenário de mercado de trabalho aquecido, mas a atividade econômica em ritmo mais lento indica que o desemprego não deve ter mais espaço para quedas expressivas nos próximos meses.

— Ainda é um cenário de mercado aquecido porque a gente está estabilizando um patamar da taxa de desemprego no mínimo histórico e também da população ocupada em um nível bem alto. Começamos agora a ver uma mudança no ritmo. Os últimos resultados confirmam isso. Estamos indo para uma certa estabilização, aquela desaceleração que todo mundo fala começa primeiro por isso — disse Rodolpho Tobler, economista do FGV Ibre.

Para ele, esse movimento está relacionado à atividade econômica, que até o início desse ano teve impulso puxado pelo agro e outras atividades, mas que começa a mostrar desaceleração em alguns setores no terceiro trimestre.

Energia:

— É natural que o mercado de trabalho siga na mesma linha — completa o analista.

O economista Bruno Imaizumi, da 4intelligence, acrescenta que a renda vem crescendo e impulsiona a demanda.

— Se por um lado a ocupação veio mais fraca, o lado do rendimento sustenta a massa de renda do trabalho e o consumo das famílias.

Ele explica que há mais contratações de temporários no fim de ano, com eventos como Black Friday e Natal. Com isso, na sua visão, a taxa de desemprego pode cair mais até o fim do ano, chegando a 5,3% em dezembro.

Fora do alcance:

Os economistas consideram que, mesmo com a desaceleração esperada para o mercado de trabalho no próximo ano, a taxa de desemprego não deve aumentar muito. Mudanças estruturais nas relações de trabalho, principalmente depois da pandemia, como a digitalização e o aumento do trabalho remoto, além de alterações no próprio perfil da população reduzem a taxa.

Imaizumi cita ainda a Reforma Trabalhista, que diminuiu custos de judicialização de empresas, acabou fazendo com que pequenas e microempresas conseguissem empregar mais. A digitalização e desburocratização na abertura de empresas, para o economista, levou a uma explosão de microempreendedores individuais, que, por sua vez, acabam começando a contratar funcionários.

Ele menciona também o aumento do trabalho por plataformas digitais, como aplicativos de transporte particular e entrega.

— A questão dos aplicativos ajuda na redução do desemprego, apesar do rendimento ser compensado por mais horas trabalhadas. Quando a pessoa fica desempregada consegue se ocupar rapidamente.

Segundo ele, essas mudanças estruturais ocorreram praticamente ao mesmo tempo no mercado de trabalho e tem ajudado a explicar esse bom desempenho nos últimos anos.

—Não conseguimos separar o que foi mais relevante, mas temos evidências de que tudo isso contribuiu para um mercado mais pujante hoje — afirma Imaizumi.

Mudanças estruturais

Segundo Tobler, do Ibre, são justamente essas mudanças que permitem o aumento do emprego mesmo em um contexto desfavorável, de juros altos e desaceleração econômica.

— Se voltarmos há uns cinco anos, dificilmente imaginaríamos que teríamos uma taxa de desemprego muito abaixo de 7%. Historicamente isso não era visto no Brasil. Todas essas mudanças estruturais permitem que a gente tenha uma desaceleração da atividade econômica, sem que isso gere um aumento mais forte da taxa de desocupação ou um problema muito grande de inflação.

Cláudia Moreno acrescenta que é possível observar esse movimento olhando os números de inflação de serviços.

— Lá atrás, patamares de desemprego super baixos eram compatíveis com a inflação de serviços subindo muito, perto de 8% ou 9%. E a gente está vendo a inflação de serviços rodar mais perto de 6% ou 7%.

Para ela, esse fato indica que houve uma queda estrutural da desocupação, e que o nível neutro da taxa de desemprego, quando não gera inflação nem desinflação, deve ter caído no Brasil.

E não foi só a taxa de desemprego que caiu. O índice de subutilização da mão de obra caiu de 14,4% para 13,9%, a menor da série histórica. Essa taxa compreende os desempregados, os que trabalham menos horas do que gostariam, e os que gostariam de trabalhar mas estão indisponíveis no momento. Ainda assim, são 15,8 milhões nessa situação.