Economia

Fazenda entende que Milei moderou discurso para vencer eleições e deve amnter Argentina no Mercosul

Auxiliares de Haddad ainda esperam indicação de ministro da Economia do país vizinho antes de tentar qualquer contato

Agência O Globo - GLOBO 20/11/2023
Fazenda entende que Milei moderou discurso para vencer eleições e deve amnter Argentina no Mercosul
Javier MileI - Foto: Reprodução

No Ministério da Fzenda, a visão é de que no curto prazo o presidente argentino eleito, Javier Milei, adotará um tom mais moderado e pragmático nas relações econômicas com o Brasil.

Na pasta, o entendimento é de que Milei precisou amenizar o discurso já após o primeiro turno. Aceitar o apoio da candidata Patricia Bullrich, apoiada pelo ex-presidente liberal Maurício Macri, foi decisivo para a sua vitória. Não foi à toa que ele conseguiu herdar 100% desses votos no segundo turno. Isso fará com que ele monte um Ministério "mais realista", segundo um integrante da pasta.

A equipe de Fernando Haddad brasileira ainda espera a indicação do nome do novo homem forte da economia argentina, antes de tentar qualquer tipo de contato.

Como Milei tem um discurso ultraliberal, há a expectativa dentro da Fazenda de que o acordo entre Mercosul e União Europeia seja levado adiante, apesar das declarações dele durante a campanha. Para a pasta, o presidente eleito vai manter o país no Mercosul.

O assessor para assuntos internacionais do Palácio do Planalto, Celso Amorim, afirmou ao GLOBO nesta segunda-feira que uma das grandes preocupações do Brasil, neste momento, é "salvar" o Mercosul.

— Temos que respeitar o resultado da eleição, por um lado, manter as relações como dois Estados e, se possível, salvar o Mercosul. A relação entre Brasil e Argentina é a base do Mercosul e tem reflexo em toda a América do Sul — disse o assessor especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Milei já se declarou contra a manutenção do bloco comercial, mas na Fazenda a visão é que o acordo de livre comércio envolvendo países desenvolvidos deve ser respeitado pelo presidente eleito.

Integrantes do governo também lembram que os ex-presidentes Jair Bolsonaro, do Brasil, e Donald Trump, dos Estados Unidos, também adotaram discursos contra a China, assim como Milei. Mas a integração econômica entre os países cresceu nos seus mandatos. Isso pode se repetir também com Milei e envolver o Brasil, hoje governado por um presidente de esquerda, na visão da equipe econômica.

A ideia de dolarizar a economia e acabar com o Banco Central é vista apenas como uma forma de desregulamentar a economia. Hoje, argentinos mantêm dólares literalmente "debaixo do colchão" e Milei pode dar estímulos para que eles passem a circular. Com o BC, pode acontecer o mesmo, com a diminuição de regras definidas pelo banco, mas ninguém na Fazenda aposta na sua extinção completa.

O que é visto como perdido é o esforço para que a Argentina pudesse fazer parte do banco dos Brics (bloco de países que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Milei não deve "se engajar" com a instituição, mesmo podendo receber dólares do órgão de fomento.

Nas relações bilaterais, as diferenças políticas não devem ser replicadas no comércio entre os dois países. São negócios realizados no setor privado, que não devem ser afetados, a não ser que haja imposição de novas barreiras para a liberação de mercadorias do lado argentino. Isso, por sua vez, iria comprometer o perfil libertário de Javier Milei.

Na balança comercial brasileira, há um superávit de quase US$ 5 bilhões a favor do Brasil, mas não há um temor de curto prazo de que isso possa ser afetado. Os exportadores argentinos contam com a continuidade no envio de automóveis, autopeças e trigo para o mercado brasileiro, e qualquer medida pelo lado do país vizinho teria a consequente retaliação pelo lado brasileiro. O que não é visto como cenário mais provável.

Dentro da Fazenda, porém, há o receio de que ele possa ir se tornando mais radical ao longo do mandato, principalmente se nos Estados Unidos Donald Trump voltar a vencer as eleições, no ano que vem.