Economia

Multa de 40% sobre o FGTS lidera o ranking de assuntos mais reclamados na Justiça do Trabalho. Confira a lista

Mais de 1,7 milhão de ações chegaram aos tribunais em todo país.

Agência O Globo - EXTRA 31/07/2023
Multa de 40% sobre o FGTS lidera o ranking de assuntos mais reclamados na Justiça do Trabalho. Confira a lista
FGTS - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O pagamento da multa rescisória de 40% do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é hoje o assunto mais reclamado pelos brasileiros na Justiça Trabalhista, segundo o ranking elaborado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) com dados sobre processos movidos até maio de 2023. O tema esteve presente em 205.229 ações e saltou para o topo da lista que em anos anteriores já foi liderada por aviso prévio e atraso no pagamento da rescisão.

A lista de temas mais recorrentes tem reclamações sobre pagamento de horas extras, em segundo lugar, e adicional de insalubridade, na terceira posição. As verbas rescisórias e o aviso prévio completam os cinco primeiros lugares. Confira a relação completa no ranking abaixo.

Para especialistas, após a implementação da reforma trabalhista, em 2017, houve um aumento na frequência de pedidos e reclamações de pagamento das verbas rescisórias. Além disso, a Justiça do Trabalho está recebendo cada vez mais as ações que são fruto das consequências da pandemia de Covid-19 no mercado de trabalho.

— Observamos que o que tem chegado às Varas é resultado da pandemia. Começamos a ver reclamações de trabalhadores que foram dispensados ou que, por ocasião da redução de jornada, não tiveram redução efetiva. E temos muitos pedidos de horas extras — explica o juiz do Trabalho Marcelo Segal, do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro (TRT-1): — Na Justiça do Trabalho, é comum termos vários pedidos na mesma ação. O ranking do TST é uma radiografia do que mais está sendo buscado.

Em 2023, foram recebidos 1,72 milhão de novos processos na Justiça do Trabalho de todo o país. Segundo o TST, somando as ações residuais, chega-se a 1,871 milhão.

Na avaliação de Michelle Pimenta Dezidério, advogada trabalhista do escritório Chediak Advogados, em casos de pedidos de horas extras e outras verbas, é necessário recalcular o recolhimento do FGTS e, consequentemente, da multa rescisória. A indenização de 40% é a penalidade para a empresa pela rescisão do contrato sem justa causa.

— É uma verba expressiva. Um dos motivos de esses valores estarem sendo cobrados é o que estamos enfrentando como um reflexo do pós-pandemia, com o encerramento das empresas. As que não pagam verbas rescisórias são empresas que não terão uma continuidade, estão em recuperação judicial ou mesmo abriram falência. Em geral, elas não têm perspectiva de continuar. A indenização de 40% não pode ser parcelada. Quando chega à Justiça do Trabalho, em geral, são empresas que quebraram, estão fechadas — avalia Michelle.

Punição por atraso

No caso da demissão sem justa causa, a multa rescisória paga ao trabalhador é de 40% sobre todo o valor que foi depositado pelo empregador na conta vinculada de FGTS do empregado, no período de tempo trabalhado naquela empresa.

Por exemplo, se o valor total depositado no período é de R$ 100 mil, a multa de 40% será de R$ 40 mil.

O prazo para o pagamento da multa do FGTS é de dez dias, com as demais verbas rescisórias — que correspondem ao saldo de salário, às férias e ao 13º salário proporcionais e ao aviso prévio indenizado ou trabalhado, entre outras. Se o patrão não paga no prazo estabelecido por lei, é penalizado e tem que pagar o valor de um salário do funcionário, a título de multa.

— Se o ex-funcionário entra com um processo trabalhista, este empregador que não pagou terá que observar na ação a data da audiência na Justiça do Trabalho. Neste caso, ele terá até este dia para efetuar o pagamento. Se não o fizer, será multado em mais 50% de todo o valor devido ao trabalhador. Não é barato — explica a advogada Michelle Pimenta Dezidério.

Domésticas pedem vínculo e hora extra

Embora a Justiça do Trabalho não apresente os dados segregados sobre ações envolvendo trabalho doméstico, especialistas dizem que os processos também estão em ascensão. Para o reconhecimento de vínculos, são mais de 97 mil ações. Segundo dados do IBGE, há quase seis milhões de trabalhadores domésticos no país. Atualmente, três em cada quatro empregados do setor no Brasil trabalham sem carteira assinada.

— Essa informação é preocupante, pois a informalidade aumenta os riscos de ações trabalhistas para o empregador. Isso significa que é mais importante do que nunca regularizar a situação dos trabalhadores domésticos para evitar riscos de ações trabalhistas — alerta Mário Avelino, presidente do Doméstica Legal.

Segundo ele, quando o funcionário é formalizado, a principal reclamação é sobre horas extras e falta de controle de ponto.

Entrevista: Marcelo Pertence, desembargador, no TRT-MG

Diante do ranking dos assuntos mais reclamados, quais são suas impressões?

Primeiramente, dos seis primeiros itens, quatro deles são vinculados a verbas rescisórias. A verba que o trabalhador receber no momento em que é dispensado é uma verba de caráter alimentar, ou seja, é fonte de sobrevivência quando ele perde o emprego. Isso também chama a atenção sobre a relevância da Justiça do Trabalho para atender a população que vive do trabalho, para os menos favorecidos da sociedade.

A que fatores podemos atribuir a falta destes pagamentos pelas empresas?

Houve uma alteração na reforma trabalhista (promulgada em 2017) que acabou com a assistência do sindicato no momento da rescisão do contrato. Neste momento, as empresas e os empregados resolviam isso, evitando entrar na Justiça. As empresas que não pagam alegam dificuldades financeiras e queda de atividade econômica. Momentos de crise são usados para justificar a retirada de direitos, o que não é verdade. O trabalho tem que ser digno.

E no caso da multa de 40% e do próprio recolhimento de FGTS? O que acontece?

Muitas vezes, a empresa atrasa por causa do menor controle dos sindicatos. Além disso, nos últimos anos, o setor de fiscalização do Ministério do Trabalho foi bastante enfraquecido. Do lado das empresas, a penalidade não é tão alta. Observando as multas administrativas, elas não inviabiliza a empresa.

O que mudou na Justiça do Trabalho com a pandemia?

As ações na Justiça do Trabalho têm aumentado. Houve um declínio após a reforma trabalhista, depois um período de instabilidade com a pandemia. Mas agora verificamos que os trabalhadores estão demandando mais e pedindo direitos básicos, da própria sobrevivência. Na hora em que ele fica sem emprego, vai viver de quê?

Alguns empresários e setores produtivos defendem a queda da multa de 40%. Qual a sua avaliação?

A multa de 40% está na Constituição Federal. Qualquer mudança depende de uma alteração constitucional.

Ranking de Assuntos mais Recorrentes na Justiça do Trabalho até maio de 2023

Multa de 40% do FGTS (205.229 processos)

Horas extras (203.080 processos)

Multa do artigo 477 da CLT (180.759 processos)

Adicional de insalubridade (179.113 processos)

Verbas rescisórias (157.213 processos)

Aviso prévio (156.017 processos)

Horas extras/adicional de horas extras (153.911 processos)

Multa do artigo 467 da CLT (137.090 processos)

Férias proporcionais (130.882 processos)

Intervalo intrajornada (129.422 processos)

FGTS (123.175 processos)

Verbas rescisórias/13º salário (116.929 processos)

Honorário da Justiça do Trabalho (114.944 processos)

Rescisão indireta (114.526 processos)

Indenização por dano moral (108.657 processos)

Fonte: TST