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Djavan relembra prisão por racismo e fala sobre legado aos filhos: 'Negro tem que estar em todos os lugares'

Cantor e compositor, que lança o disco 'Improviso', compartilha episódio em que foi confundido com ladrão em loja de piano, reflete sobre timidez causada pelo preconceito e lamenta que avanços ainda sejam tímidos: 'O negro continua sendo hostilizado'

Agência O Globo - 13/11/2025
Djavan relembra prisão por racismo e fala sobre legado aos filhos: 'Negro tem que estar em todos os lugares'
Djavan relembra prisão por racismo e fala sobre legado aos filhos: 'Negro tem que estar em todos os lugares' - Foto: Reprodução

Djavan lança um novo olhar sobre o racismo estrutural ao relembrar episódios marcantes de sua trajetória e compartilhar aprendizados transmitidos aos filhos.

Qual a diferença entre o letramento racial que recebeu de sua mãe e o que passou aos seus filhos?

Minha mãe queria me proteger. Para eu não ser hostilizado, maltratado... Fez o que tinha que fazer. Dizia: "Meu filho, tem que compreender que o negro não pode ir a todos os lugares". Hoje, digo diferente: o negro tem que estar em todos os lugares. Tem que brigar. Porque a vida é de todos. O negro tem direito à vida assim como o branco, o galego, o marrom.

Em entrevista a Bruna Lombardi, você disse que a pessoa preta aprende a viver de maneira contida por causa do racismo. Em que medida sua timidez está ligada a esse fato?

Não sei se está ligado ao fato de eu ser negro, mas acho que sim. Se proteger de uma situação adversa é natural. E acho que não mudou. O negro continua sendo hostilizado, preterido, não é aceito de maneira natural. Para conseguir uma posição, tem que mostrar dupla capacidade, trabalhar, estudar muito mais para chegar no mesmo lugar que o branco chegaria com naturalidade. A sociedade formatou um mundo para o branco. É o branco que governa, que domina as ações do mundo. Eles fizeram esse mundo para eles mesmos. O negro só entra se for muito raçudo, muito foda. Se não for, não tem espaço.

Ter sido preso numa loja de piano ao tentar comprar um instrumento foi o pior episódio de racismo que você sofreu?

Isso foi loucura. Estava ali para comprar um piano elétrico, um Fender Rhodes. E os caras me levaram porque acharam que o negro não podia estar numa loja como aquela para comprar um piano. No mínimo, era para assaltar... Pegaram a mim e o Tadeu (divulgador), nos levaram puxando numa condição humilhante. Pediram a carteira de trabalho, dei a de músico, minha categoria.

Acharam ridículo, começaram a rir e disseram: "Vai cantar agora na prisão". Chegaram na Praça da Sé, pegaram nossas bolsas de tricô e despejaram no chão. Começou a juntar gente, alguém me reconheceu, ligaram para a Odeon, minha gravadora, que mandou um advogado. Mas fiquei cinco horas lá dentro, me levaram para a cadeia junto com os marginais ali. Cinco horas! Até chegar um advogado para me tirar.