Brasil
STF e Senado travam duelo simultâneo sobre marco temporal para terras indígenas
Julgamento no Supremo e votação relâmpago da PEC 48/2023 ampliam tensão institucional e colocam em choque interesses do governo, ruralistas e movimentos indígenas
O marco temporal para a demarcação de terras indígenas tornou-se, nesta semana, o centro de uma disputa aberta entre dois dos principais poderes da República. A partir desta terça-feira (9) e, sobretudo, na quarta (10), Senado Federal e Supremo Tribunal Federal avançam simultaneamente sobre o mesmo tema, num embate que reúne reação institucional, choque de agendas e forte pressão política.
De um lado, o STF levará ao Plenário físico o julgamento das ações que contestam a constitucionalidade da Lei 14.701/2023 — norma que restabeleceu o marco temporal após o Congresso derrubar o veto do presidente Lula. Do outro, o Senado tenta aprovar, em votação acelerada, a PEC 48/2023, que pretende inserir a tese diretamente na Constituição.
A simultaneidade das agendas, algo raro em temas estruturais, elevou o marco temporal à condição de símbolo de um tensionamento crescente entre os Poderes.
O que está em jogo
O marco temporal estabelece que povos indígenas só teriam direito às terras que estivessem ocupando — ou disputando judicialmente — em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Em 2023, o STF considerou a tese inconstitucional, afirmando que os direitos territoriais indígenas são originários, não dependem de ocupação física em 1988 e que expulsões e esbulhos históricos inviabilizam o uso de uma data fixa como referência.
A decisão levou o Congresso a aprovar a Lei 14.701, que restabeleceu o marco temporal e reacendeu o conflito. Agora, partidos de direita e entidades indígenas voltam ao Supremo para contestar — ou defender — a validade da legislação.
STF: julgamento presencial e pressão dos movimentos
Atendendo a pedido de organizações indígenas, o Supremo transferiu a análise para o Plenário físico, ampliando visibilidade política e social do julgamento. Na quarta-feira (10), o tribunal ouvirá as sustentações orais, sem previsão de votação imediata.
A decisão final do STF terá impacto direto sobre mais de 300 processos de demarcação pendentes e poderá definir os rumos da política indigenista nas próximas décadas.
Senado acelera ofensiva e mira aprovação da PEC
Enquanto o STF inicia o julgamento, o Senado tenta votar a PEC 48/2023 já nesta terça-feira. A proposta, relatada por Esperidião Amin (PP-SC), pode ir direto ao Plenário mediante calendário especial, permitindo votação em dois turnos no mesmo dia.
A ofensiva ocorre em meio ao desgaste provocado pela decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes, que limitou a apresentação de pedidos de impeachment de ministros do STF à Procuradoria-Geral da República. A medida irritou parlamentares e impulsionou o movimento para “afirmar a autoridade do Legislativo”.
Governo Lula tenta barrar avanço
O governo é contrário ao marco temporal e atua para frear a PEC. No entendimento do Planalto, a tese viola direitos originários previstos na Constituição, amplia conflitos fundiários e compromete a política indigenista.
Pressões externas: CNBB e bancada ruralista
A CNBB divulgou nota classificando o momento como “gravíssimo” e criticando o que considera “retaliação ao STF”. Para a entidade, o marco temporal representa o maior retrocesso indígena desde 1988.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), por outro lado, sustenta que a tese traz segurança jurídica, previsibilidade ao agronegócio e limites para futuras demarcações. É hoje a principal força política pela aprovação da PEC.
Um choque institucional em curso
O país inicia uma semana decisiva: o STF pode reafirmar a inconstitucionalidade do marco temporal, enquanto o Senado tenta constitucionalizá-lo. O impasse deve moldar não apenas a política indigenista, mas também o equilíbrio de forças entre Congresso e Supremo em um dos confrontos institucionais mais intensos dos últimos anos.
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