Política

Motta aposta em pautas de apelo popular para se reposicionar

Presidente da Câmara saiu desgastado com aprovação da PEC da Blindagem e perdeu protagonismo para Alcolumbre

Agência O Globo - 25/10/2025
Motta aposta em pautas de apelo popular para se reposicionar
Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados - Foto: Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados

O presidente da Câmara, (Republicanos-PB), intensificou nas últimas semanas os movimentos para reafirmar seu protagonismo político no momento em que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), se consolida como principal interlocutor do Congresso com o Palácio do Planalto.

Collor:

Fux:

À frente da Câmara desde fevereiro, Motta tenta se reposicionar após o desgaste provocado pela aprovação da PEC da Blindagem, que criava barreiras para processar parlamentares e foi derrubada no Senado depois de forte reação popular.

À época, o deputado defendeu o texto sob o argumento de “proteger o livre exercício do mandato parlamentar”, mas o desgaste foi inevitável. Em um episódio simbólico, o parlamentar foi vaiado em evento com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Rio.

Desde então, Motta passou a apostar em pautas de apelo popular e repercussão nas redes como forma de reposicionar a Câmara. Entre as medidas, aprovou a urgência do projeto que proíbe a cobrança de taxas por bagagem de mão em voos, que classificou como “abuso” das companhias aéreas. A proposta, de autoria de Da Vitória (PP-ES), prevê gratuidade para volumes de até dez quilos.

A iniciativa, porém, foi ofuscada pelo Senado, que se antecipou e aprovou um projeto semelhante. Por ter tramitado em caráter terminativo na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o texto segue direto para a Câmara. O autor é o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), que alega que a resolução da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) deixa brechas para cobranças adicionais.

Motta tenta costurar um acordo para que o texto do Senado seja apensado ao da Câmara — ou seja, tramite de forma conjunta.

Segurança pública

A ofensiva na Câmara também se dá na área da segurança pública, após Motta “limpar a pauta” e abrir espaço para temas de maior aceitação pública. Nos últimos meses, a Casa ficou refém do debate da anistia aos envolvidos no 8 de janeiro de 2023 e, depois, da reformulação da iniciativa com o PL da Dosimetria — a proposta foi colocada de lado devido a um impasse político.

Em setembro, Motta aprovou a urgência de oito projetos que endurecem penas e criam tipos penais — entre eles o que transforma em crime hediondo a falsificação de bebidas após casos de intoxicação por metanol.

A série de votações foi acompanhada por vídeos nas redes sociais, num gesto lido como tentativa de se aproximar de um eleitorado mais amplo e se distanciar da imagem de político de bastidores.

Governistas e oposicionistas concordam que a fragilidade política tem levado Motta a oscilar entre os lados. Citam votações como a aprovação da urgência da anistia, seguida da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.

—Internamente, Hugo promove um ritmo produtivo e alivia tensões. E esses assuntos são as principais demandas da população — avalia o líder do PDT, Mário Heringer (MG).

Enquanto Motta busca visibilidade, Alcolumbre ampliou sua influência sobre o governo. O senador atuou para adiar a votação de vetos ao novo licenciamento ambiental — gesto que evitou uma derrota do governo e reforçou seu papel de fiador político de Lula no Legislativo.

Nas últimas semanas, o senador também participou de reuniões com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sobre o impasse na Lei de Diretrizes do Orçamentárias (LDO) de 2026.

Paralelamente, Alcolumbre comemorou a autorização do Ibama para pesquisas de petróleo na Margem Equatorial, projeto que beneficia o Amapá e reforçou sua imagem de articulador político no Senado.

Para o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues, não há atrito entre os presidentes, mas apenas uma diferença de estilo e de trajetória.

— Não existe crise entre os dois. Motta é presidente pela primeira vez e Alcolumbre, pela terceira, além da diferença de idade entre eles. Davi já teve essa experiência de comandar antes — disse.

Fantasma de Lira

Deputados do centro reconhecem que o Senado se tornou o principal eixo de poder e dizem que Motta tenta reagir. A avaliação é que, diante da força de Alcolumbre e do risco de antecipação da eleição da Mesa Diretora, o paraibano busca manter a Câmara coesa e afastar o fantasma da antecipação da volta do ex-presidente Arthur Lira (PP-AL), que ainda influencia os bastidores.

Em seu entorno, há queixas de que ele se deixa influenciar por Lira, pelo senador Ciro Nogueira (PP-PI) e líderes próximos, como Doutor Luizinho (PP-RJ), Antonio Brito (PSD-BA) e Isnaldo Bulhões (MDB-AL).

Ciente dos riscos, Motta tem buscado preservar o diálogo com o Senado e adotar uma linha de menor atrito. A mudança de postura foi bem recebida pelo governo. O líder José Guimarães (PT-CE) elogiou Motta por ter dado aval para a votação de parte do pacote fiscal que mira destravar o Orçamento do ano que vem.

— O presidente Hugo Motta pediu que eu resolvesse isso. Ele tem ajudado a construir as soluções — disse o líder do governo na Câmara.

Aliados descrevem a estratégia atual como uma gestão de baixo risco político. Motta tem priorizado projetos de consenso, como o pacote da educação, que resultou na aprovação, em uma única sessão, de oito propostas unânimes — entre elas o piso de professores temporários e incentivos a estudantes de licenciatura.

Ao mesmo tempo, o deputado vem pressionando o governo por mais previsibilidade na liberação das emendas.

No Republicanos, aliados admitem que a PEC da Blindagem “deixou cicatriz” e exigiu uma guinada. A percepção interna é que o presidente ainda busca um novo equilíbrio — entre o discurso de independência e a necessidade de reconstruir pontes, dentro e fora da Casa.