Política

Fala de Lula sobre uso de andador gera críticas de entidades e até da base aliada

Após cirurgia no quadril, presidente disse que pessoas o verão 'sempre bonito', sem muleta ou andador

Agência O Globo - GLOBO 27/09/2023
Fala de Lula sobre uso de andador gera críticas de entidades e até da base aliada

A declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de que não seria fotografado usando andador ou muleta após cirurgia no quadril, que será realizada nesta sexta-feira, teve repercussão negativa entre grupos cuja bandeira é o ativismo pelas pessoas com deficiência e até entre políticos da base aliada. O petista afirmou durante a live "Conversa com o Presidente", na última terça-feira, que "vocês não vão me ver de andador, de muleta, vocês vão ver sempre bonito como se eu não tivesse operado", trecho classificado como capacitista.

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A fala do presidente não foi bem recebida entre políticos da base e da oposição. A deputada federal Tábata Amaral (PSB-SP) disse que "as palavras importam e essa fala, intencional ou não, vai na contramão da luta por inclusão e respeito de milhares de pessoas com deficiência que utilizam equipamentos de acessibilidade".

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O senador Flávio Bolsonaro (PL-SP) compartilhou o vídeo e questionou se o autor da declaração fosse o pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), se haveria repercussão maior sobre o caso. "Troca só os personagens", disse. A senadora Mara Gabrilli (PSD-SP), que ficou tetraplégica após sofrer um acidente de carro em 1994, classificou a declaração do petista como "capacitista":

"Caminhar, seja com andador, muleta ou cadeira de rodas não enfeia ninguém, tampouco subtrai o potencial do ser humano. E ainda demonstra o quanto essa pessoa deve lutar para conseguir exercer cidadania", postou ela nas redes sociais na terça.

Presidente da Comissão de Defesa da Pessoa com Deficiência da OAB-CE (Ordem dos Advogados do Brasil), Emerson Damasceno afirma que o petista pode corrigir erros assim no convívio com PcDs:

— O presidente tem uma missão que é viabilizar a entrada de pessoas com deficiência na administração pública. A simples convivência com essas pessoas ajuda o país a ter mais inclusão. Sem convivência não há inclusão — diz ele, que é ativista pela causa nas redes sociais. — Lula pode usar (andador ou muletas) de forma transitória, mas nós utilizamos isso diariamente e não nos envergonhamos disso.

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A inclusão da qual Damasceno faz coro foi, inclusive, comemorada quando na posse, em janeiro, o presidente subiu a rampa do Palácio do Planalto com pessoas que representavam a diversidade brasileira. No ato, o influenciador e ativista Ivan Baron representou as pessoas com deficiência; nesta quarta-feira, ele também pontuou a crítica ao presidente.

"É nítido que ele não falou por mal, mas ao mesmo tempo não podemos deixar esse erro capacitista passar despercebido. Durante grande parte da minha vida eu não quis usar muleta ou andador após crescer vendo as pessoas associarem esse tipo de tecnologia assistiva como algo feio", publicou ele. "Se em dado momento replicamos pensamento atrasado, temos o dever de nos corrigir e buscar sempre a nossa evolução. Desejo melhoras (a Lula) e, sim, também queremos vê-lo de muletas, andador etc. Será didático", finalizou.

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Damasceno apontou que a reparação de erros pode acontecer quando o petista assumir a própria condição no pós-operatório:

— O presidente aparentemente não percebeu ainda que, ao invés de tentar fugir disso, ele deveria abraçar isso. Porque o que é bonito, é o que é diverso.

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Histórico de declarações

Esta não foi a primeira vez que o presidente se referiu a pessoas com deficiência de forma considerada capacitista. Em abril deste ano, ela já havia afirmado numa reunião com ministros e governadores, em Brasília, que pessoas com "deficiência mental" têm "problemas de desequilíbrio de parafuso". Na ocasião, era discutida uma política de prevenção de violência nas escolas.

Na época, o apresentador Marcos Mion, inclusive, usou as redes sociais para manifestar indignação. Pai de Romeo, diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), ele afirmou que o discurso reforçava preconceitos e estigmas e se sustenta em capacitismo.

Após a repercussão negativa, o presidente foi às redes sociais para se desculpar:

"Gostaria de pedir desculpas sobre uma fala que fiz na semana passada, durante reunião sobre violência nas escolas. Conversei e ouvi muitas pessoas nos últimos dias e não tenho vergonha de assumir que sigo aprendendo e buscando evoluir", publicou.