Poder e Governo

Nikolas Ferreira é condenado a indenizar mulher trans em R$ 40 mil por chamá-la de 'homem'

Decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo afirma que deputado, por ser uma pessoa eleita, é 'dotado de maior potencial nocivo' para incentivar outras discriminações

Agência O Globo - 24/11/2025
Nikolas Ferreira é condenado a indenizar mulher trans em R$ 40 mil por chamá-la de 'homem'
Nikolas Ferreira - Foto: Kayo Magalhães / Câmara dos Deputados

O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) foi condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) a pagar R$ 40 mil por danos morais a uma mulher transgênero. Em 2022, à época vereador de Belo Horizonte, o parlamentar chamou a autora do processo de "homem" após ela expor, em um vídeo que viralizou nas redes sociais, que um salão de beleza se recusou a lhe atender. Segundo Nikolas, as críticas realizadas às reclamações da mulher estavam vinculadas ao debate público "sobre ideologia de gênero", sem intenção de deslegitimar sua dignidade. Ainda cabe recurso.

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Em decisão publicada nesta segunda-feira, o juiz André Salvador Bezerra afirmou que Nikolas legitimou a conduta discriminatória sofrida pela mulher. Segundo o magistrado, por ser uma pessoa eleita pelo voto popular, o parlamentar "é dotado de maior potencial nocivo perante toda a sociedade, configurando um verdadeiro incentivo para que outros estabelecimentos discriminem outras mulheres transgêneros pelo país afora".

Entenda o caso

Em junho de 2022, a mulher procurou um salão de beleza para realizar um procedimento estético. O atendimento, contudo, foi negado pelo estabelecimento, que alegou atender somente "mulheres biológicas". Para relatar o ocorrido, ela publicou um vídeo na rede social TikTok, conteúdo compartilhado por Nikolas.

"Essa pessoa aqui se considera mulher, mas ela é homem, e estava alegando transfobia. Então agora você é obrigado a depilar um pênis ou, caso contrário, você é transfóbico", afirmou o deputado, em declarações que "ridicularizaram a luta pela igualdade de tratamento", conforme o a decisão.

A autora pediu primeiro R$ 20 mil, valor depois majorado para R$ 50 mil. No processo, a defesa de Nikolas afirmou que a republicação do vídeo "se limitou ao exercício da liberdade de expressão e manifestação político-ideológica, sem ofensas direcionadas à autora ou práticas discriminatórias".

Segundo o parlamentar, as críticas realizadas às reclamações da mulher estavam vinculadas ao debate público "sobre ideologia de gênero", sem intenção de deslegitimar sua dignidade. Nikolas também alegou imunidade parlamentar, o que foi negado por não se tratar de declaração pertinente ao exercício do mandato.

"O que é, contudo, a ideologia de gênero mencionada pelo réu? Trata-se de termo utilizado por determinados grupos religiosos, que insistem em negar a pessoas o direito de se atribuir a um gênero diverso daquele que lhes foi atribuído quando nasceram", diz outro trecho.

Ainda conforme a decisão, "não há dúvida de que a autora sofreu dor apta à caracterização dos danos extrapatrimoniais, de notável repercussão, por proferidas por titular de mandato eletivo". Nikolas também deveria custear as despesas processuais e honorários fixados em 10% do total da indenização.

Recorrente

Em abril deste ano. A decisão da juíza Priscila Faria da Silva, da 12ª Vara Cível de Brasília, tratou de um episódio no plenário da Câmara, em 2023, .

A magistrada analisou uma ação apresentada pela Aliança Nacional LGBTI+ e a Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas. As associações sustentam que, na data de 8 de março de 2023, o deputado discursou no Plenário da Câmara dos Deputados “de maneira irônica e ofensiva aos transgêneros, fantasiando-se com uma peruca amarela e apresentando-se como ‘Deputada Nikole’”.

Nesse caso, a defesa do deputado também sustentou, ao longo do processo, que a manifestação de Nikolas estava dentro da imunidade parlamentar e respeitou o direito à liberdade de expressão.

À época, o então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), criticou a ação de Nikolas: “o Plenário da Câmara dos Deputados não é palco para exibicionismo e muito menos discursos preconceituosos. Não admitirei o desrespeito contra ninguém. O deputado Nikolas Ferreira merece minha reprimenda pública por sua atitude. A todas e todos que se sentiram ofendidas e ofendidos, minha solidariedade".

Em 2024, . Na ocasião, Nikolas questionou a identidade de gênero de Erika, que é uma das duas mulheres transexuais com mandato no Congresso Nacional.

Na representação, Erika pediu uma indenização de R$ 5 milhões por transfobia. Segundo ela, Nikolas veiculou trechos da discussão em suas redes sociais, onde acumula milhões de seguidores que também proferiram ofensas a ela. "Sua declaração transfóbica não apenas perpetua o preconceito e a discriminação, mas também encoraja comportamentos hostis e agressivos por parte do público", diz trecho do documento.