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Médico é condenado a remover conteúdo falso sobre câncer de mama após ação do governo
O ministro Alexandre Padilha afirmou no domingo, 16, após repercussão de matéria do Estadão Verifica, que tomará as medidas cabíveis para impedir médicos antivacina de continuar publicando conteúdos falsos para lucrar com protocolos de tratamento sem embasamento científico.
Não será a primeira vez que o governo atuará contra profissionais da saúde que divulgam informações sensacionalistas em seus perfis de redes sociais.
Em outubro, a Advocacia-Geral da União (AGU) conseguiu a condenação de um médico com 1,5 milhão de seguidores que associou o exame de mamografia ao aumento da incidência de câncer de mama. Ele precisou remover o conteúdo falso de suas contas do Instagram e no YouTube.
No vídeo, o médico responde à pergunta de uma seguidora. Ela relata ter dois cistos nos seios e estar em acompanhamento, mas quer saber o que pode fazer para resolver o problema. Como resposta, ele desencoraja a internauta a continuar realizando mamografias, que são o principal exame de rastreamento para o câncer de mama.
"Ficar fazendo mamografia? Uma mamografia gera uma radiação para a mama equivalente a 200 raios-X. Isso aumenta a incidência de câncer de mama, por excesso de mamografia", afirma.
O mesmo médico diz à seguidora que os dois cistos provavelmente estão relacionados a uma "deficiência de iodo", alegação que, novamente, contraria as evidências científicas.
Na decisão liminar, o juiz federal reforçou que a afirmação do médico "não encontra amparo na sedimentada e atual pesquisa sobre o assunto, podendo causar danos a mulheres que venham, inadvertidamente, seguir suas orientações, deixando de consultar seu médico particular e efetuando, se a isso indicada, o questionado exame de mamografia".
A ação civil pública para responsabilização do médico foi ajuizada em março deste ano, fruto de parceria da AGU com o Ministério da Saúde e a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República. O processo faz parte do projeto "Saúde com Ciência", de promoção da integridade da informação em temas de saúde pública.
A informação correta pode fazer a diferença entre a vida ou a morte de uma mulher, afirma a procuradora-geral da União, Clarice Calixto, em nota da AGU. "Estamos celebrando muito essa vitória da nossa AGU, porque é um marco na defesa da vida das mulheres. A advocacia pública acredita que é nosso dever proteger a saúde, enfrentando a desinformação sobre o câncer de mama."
O que dizem os especialistas?
O câncer de mama é um dos cânceres mais comuns entre mulheres no Brasil e no mundo, e o diagnóstico precoce, por meio de métodos de rastreio reconhecidos, incluindo a mamografia, é um dos pilares para melhores desfechos clínicos, de acordo com a médica oncologista Angélica Nogueira, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC).
"A propagação de informações incorretas ou enganosas representa risco concreto à saúde pública", diz Angélica. "Rejeitamos veementemente a disseminação de conteúdo médico-científico que não esteja respaldado por evidência robusta e que possa induzir ao erro, ao atraso no diagnóstico ou a escolhas de saúde inadequadas."
De acordo com a mastologista Fabiana Makdissi, líder do Centro de Referência em Tumores da Mama do A.C. Camargo Câncer Center, a informação divulgada pelo médico é "totalmente errada". A mamografia utiliza uma quantidade de radiação extremamente baixa, entre 0,1 e 0,4 milisieverts (mSv), medida considerada segura para a realização de exames médicos.
"Estamos falando de um exame que oferece muito mais benefícios do que qualquer tipo de risco. Esse é o único exame capaz de reduzir em até 30% a mortalidade por câncer de mama, quando realizado regularmente", destacou Fabiana em entrevista em outubro de 2024, quando o Estadão denunciou médicos que divulgavam mentiras sobre o câncer de mama nas redes sociais.
"A quantidade de radiação da mamografia é menor do que uma viagem de avião ou do que tantas outras coisas que emitem radiação e a paciente muitas vezes nem sabe. A radiação existe em todos os ambientes, então mesmo a somatória de radiação de exames anuais não seria suficiente para lhe causar mal", completa.
O câncer de mama é uma doença multifatorial. "O principal fator de risco é o envelhecimento celular, que pode estar associado a fatores como obesidade, sedentarismo, tabagismo e consumo de álcool", explica a mastologista.
As pesquisas mostram que as mulheres que fazem mamografia não têm mais incidência da doença e nem maior mortalidade - pelo contrário, o exame reduz o risco de morte por câncer de mama.
Também é infundada a informação de que cistos e câncer de mama podem ser causados por deficiência de iodo, segundo o mastologista Marcelo Bello, diretor do HC III, unidade referência do Instituto Nacional de Câncer (Inca) para o tratamento do câncer de mama.
"O câncer de mama não tem qualquer relação direta com o iodo, uma vez que a glândula mamária não produz nem depende desse elemento para a produção de leite. Essa teoria carece de fundamento e não deve ser levada em consideração", disse Bello à época.
A oncologista Laura Testa, chefe da equipe de Oncologia Mamária do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), explica que "existe um dado experimental de que eventualmente o iodo em condições muito específicas pode ter uma atuação no receptor de estrogênio e que eventualmente pudesse ter uma correlação (com o câncer de mama), mas é em linhagens celulares, não temos evidência nenhuma nem em animais, muito menos em humanos, de que isso seja uma causa de câncer de mama".
"Se fosse assim, a gente provavelmente não teria câncer de mama, porque o iodo é 'suplementado' com sal iodado, então não faz o menor sentido essa afirmação", enfatiza.
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