Finanças

Crise com Congresso esvazia cerimônia de Lula: Motta e Alcolumbre não comparecem à sanção do IR

Presidentes da Câmara e do Senado ignoram convite; ausência aprofunda desgaste com o Planalto

Agência O Globo - 26/11/2025
Crise com Congresso esvazia cerimônia de Lula: Motta e Alcolumbre não comparecem à sanção do IR
- Foto: Cléber Medeiros/Agência Senado

A cerimônia de sanção que amplia a faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, considerada pelo Planalto um gesto simbólico para tentar reorganizar a relação com o Congresso, foi marcada por duas ausências de peso. Convidados para o evento desta quarta-feira, os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), decidiram não comparecer ao Palácio do Planalto, justamente no momento em que o governo enfrenta seu período mais crítico de tensão com o Legislativo neste terceiro mandato de Lula.

Pela manhã, a assessoria de Hugo Motta informou que o deputado "cumpre agenda interna" e não participaria da cerimônia. Apesar disso, o presidente da Câmara publicou em suas redes sociais uma mensagem celebrando a sanção e exaltando a "união dos Poderes", adotando um tom institucional que contrasta com o atual ambiente de desgaste.

“Este é o resultado da união dos Poderes em favor do Brasil. Com respeito às atribuições legislativas, diálogo e equilíbrio, o país avança”, escreveu Motta em seu perfil no X.

No Senado, Alcolumbre também optou pela ausência. O gesto ocorre no auge do atrito com o governo, motivado pela indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias, para a vaga de ministro do STF deixada por Luís Roberto Barroso. A escolha contrariou o presidente do Senado e gerou rompimento com o líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA).

Alcolumbre considerou que o Planalto atropelou a articulação política e reagiu colocando em votação uma "pauta-bomba": aprovou projeto que concede aposentadoria integral e paritária para agentes comunitários de saúde (ACSs) e agentes de combate às endemias (ACEs), medida que, segundo o governo, pode gerar impacto de R$ 100 bilhões em dez anos.

O senador sinalizou ainda que não atuará para proteger o governo na tramitação do PL Antifacção e marcou a sabatina de Messias na CCJ para 10 de dezembro, em intervalo curto que pode dificultar a articulação política do indicado junto aos senadores.

Crise acumulada

A ausência simultânea dos dois presidentes reflete um acúmulo de atritos que, pela primeira vez, se mostram de forma coordenada nas duas Casas.

Na Câmara, o ponto de ruptura foi o desgaste entre Hugo Motta e o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ). A relação já vinha tensionada desde a PEC da Blindagem e piorou na votação do projeto antifacção, quando Motta escolheu um opositor para a relatoria. A situação se agravou com a fuga de Alexandre Ramagem (PL-RJ) para os Estados Unidos — episódio em que petistas acusaram Motta de leniência com o deputado condenado na trama golpista. O mal-estar levou integrantes da bancada a pedirem desculpas, mas selou o distanciamento.

Desde então, Motta tem afirmado a interlocutores que não pretende dialogar com a ministra Gleisi Hoffmann, reforçando o clima de afastamento.

Cerimônia esvaziada

A sanção do Imposto de Renda era vista pelo Planalto como uma oportunidade de exibir convergência institucional em torno de uma pauta considerada estratégica — não apenas para a agenda econômica, mas também para o ano eleitoral. A presença de Motta e Alcolumbre seria usada pelo governo como sinal de retomada do diálogo após semanas de tensão.

O esvaziamento do evento, entretanto, aponta na direção oposta: o Congresso não vê sinal de trégua, e tanto Câmara quanto Senado optaram por demonstrar distanciamento no momento em que o Planalto buscava transmitir a imagem de unidade.