Finanças

Tarifaço de Trump: ordem executiva reduz tarifas de café, tomate, banana e açaí

Governo brasileiro considerou a medida positiva, mas insuficiente

Agência O Globo - 17/11/2025
Tarifaço de Trump: ordem executiva reduz tarifas de café, tomate, banana e açaí
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump - Foto: © AP Photo / Alex Brandon

Donald Trump decidiu eliminar as chamadas tarifas recíprocas para carne bovina, tomate, café, banana, açaí e outros produtos agrícolas. A medida visa a diminuir os custos para o consumidor americano, em uma tentativa da Casa Branca de reagir à derrota nas eleições locais do início deste mês. É também reconhecimento implícito de que a política tarifária de Trump pressionou os preços nos Estados Unidos.

No caso do Brasil, as tarifas recíprocas determinadas em abril estão em 10%; em julho foi anunciada uma sobretaxa de 40%. O alívio, nesse caso, será limitado aos 10% de taxas recíprocas.

“Recebi informações adicionais e recomendações de diversas autoridades que, seguindo minha orientação, têm monitorado as circunstâncias envolvendo a emergência declarada no Decreto 14257 (de 2 de abril). Depois de analisar as informações e recomendações que eles me forneceram, a situação das negociações com diversos parceiros comerciais, a atual demanda interna por determinados produtos e a atual capacidade interna de produzi-los, decidi que é necessário modificar mais o escopo dos produtos sujeitos às tarifas recíprocas (impostas em abril e ajustadas em setembro)", afirmou Trump em seu novo decreto.

Ou seja, os itens ainda podem estar sujeitos a outros tipos de taxas. O Brasil, principal fornecedor de café dos EUA, ficou sujeito a uma tarifa recíproca de 10% — mas, em julho, anunciou uma tarifa “punitiva” de 40%, que entrou em vigor em agosto, deixando os produtos brasileiros sobretaxados em 50%.

Decreto

Os produtos agrícolas do Brasil que constam do decreto ainda enfrentarão a tarifa adicional de 40%, de acordo com um funcionário da Casa Branca que falou sob condição de anonimato.

Membros da equipe econômica do governo Lula veem como positiva, mas insuficiente, a decisão anunciada ontem por Trump. Técnicos ressaltam o fato de que a tarifa sobre produtos brasileiros será reduzida em apenas 10 pontos percentuais, caindo de 50% para 40%.

Isso significa que as exportações brasileiras de café e carne bovina, entre outros, continuam sujeitas a tarifas substanciais. O tarifaço de Trump exacerbou a escassez desses dois produtos e levou os preços ao consumidor a níveis recordes.

Acordos recentes

Os consumidores dos EUA pagaram quase 20% a mais pelo café em setembro em comparação com o ano anterior, de acordo com dados do próprio governo americano. E as vendas de café brasileiro para os EUA desabaram: entre agosto e o fim de outubro, houve uma queda 51,5% em relação ao mesmo período de 2024, segundo dados do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).

Documento divulgado no site da Casa Branca explica que a mudança foi motivada pelo “progresso significativo” feito pelo presidente em acordos bilaterais. Esses acordos, afirma o texto, “tiveram e continuarão a ter amplos impactos na produção nacional e na economia como um todo, incluindo acesso aprimorado a mercados para nossos exportadores agrícolas”.

São citados especificamente os acordos e protocolos de entendimento fechados com Malásia, Camboja, Tailândia e Vietnã, no Sudeste Asiático; Argentina, El Salvador, Equador e Guatemala, na América Latina; Reino Unido, União Europeia e Suíça; além de promessas de investimento de Japão e Coreia do Sul.

“Muitos dos acordos comerciais anunciados e negociações em andamento envolvem países que produzem volumes substanciais de itens agrícolas que não crescem ou não são produzidos em quantidades suficientes nos Estados Unidos.”

O decreto foi publicado no site da Casa Branca no início da noite. Pela manhã, o representante de Comércio dos EUA, Jamieson Greer, havia dito que Trump reduziria algumas tarifas, graças aos acordos recém-fechados:

— Quando você olha para o Sudeste Asiático e para a América do Sul, é de lá que vem muita coisa: café, cacau, bananas, esse tipo de produto.

AEB: ‘decepcionante’

O anúncio ocorre ainda um dia após o encontro do chanceler brasileiro, Mauro Vieira, com o secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio. Vieira já havia dito que os americanos sinalizaram que dariam uma resposta “muito em breve” à primeira proposta brasileira de um acordo provisório, formalizada no início de novembro em uma reunião virtual de alto nível de integrantes do governo brasileiro e Greer.

O relaxamento parcial do tarifaço não atende totalmente ao pleito do Brasil, que pede uma suspensão temporária, até o fim das negociações bilaterais, do tarifaço de 50%, em vigor desde agosto, além do fim de sanções diplomáticas a autoridades brasileiras e seus familiares.

Já o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou que o anúncio de ontem deve beneficiar o Brasil, um dos principais fornecedores de café e carne para o mercado americano. Para Fávaro, a medida confirma a retomada da normalidade nas relações entre Brasília e Washington, com o país voltando a ocupar seu “lugar natural”:

— Quem vai fornecer café, açaí, banana?

Fávaro reconheceu que ainda há vários pontos pendentes na negociação entre os dois países, mas disse estar otimista:

— A partir do momento em que os dois líderes, os dois presidentes se encontraram, estabeleceu-se a boa diplomacia — afirmou, em referência ao encontro entre Trump e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no fim de outubro, na Malásia.

De agosto a outubro: Déficit com os EUA cresce 341% após tarifaço e pressiona exportações brasileiras

Advogados nos EUA do escritório Barral Parente Pinheiro Advogados, que tem o ex-secretário de Comércio Exterior Welber Barral entre os sócios, avaliam que um alívio mais amplo no tarifaço sobre o Brasil pode estar a caminho, mas ainda depende das negociações entre Brasília e Washington.

O presidente executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, considerou as mudanças anunciadas por Trump “decepcionantes”, diante das expectativas criadas após a reunião dele com Lula e a abertura de negociações:

— Surpreende que, com as negociações entabuladas, saíram algumas coisinhas e nada mais — afirmou. — No fundo, no fundo, o que Trump quer é reduzir o custo interno para os EUA. As carnes bovinas estão com o preço muito alto (lá), cair 10% não mudaria nada, teria que ser mais forte.

Os preços ao consumidor dispararam para níveis recordes em meio à redução do rebanho bovino doméstico. A demanda resiliente, porém, faz com que o país dependa cada vez mais de importações para preencher a lacuna.

Abiec vê previsibilidade

A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) disse ter considerado a decisão americana “muito positiva”: “a medida reforça a confiança no diálogo técnico entre os dois países e reconhece a importância da carne do Brasil”. E afirmou que “a redução tarifária devolve previsibilidade ao setor”, lembrando que os EUA são o segundo maior mercado da carne bovina do Brasil.

Já o Cecafé informou estar em contato com seus pares americanos “para analisar, cuidadosamente, a situação”.

Em nota, a Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas) disse ter recebido "com entusiasmo" o anúncio de redução das tarifas para a entrada de frutas brasileiras no mercado americano. Mas lamentou "o fato de a uva, segunda fruta brasileira mais exportada para os Estados Unidos, ter ficado de fora da lista. A exclusão ocorre em um momento sensível: no terceiro trimestre deste ano, as exportações de uva para os Estados Unidos registraram uma queda de 73% em valor e quase 68% em volume em relação ao mesmo período de 2024".