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A fraqueza de homem
Haroldo Lima é um homem que orgulha-se de sua dignidade, esteio de nossa sociedade, homem probo, advogado emérito, conhecedor profundo das leis. É meu primo, nos damos bem desde os tempos de colégio. Um apologista aos bons costumes e à moral da educação ocidental. Nunca teve problemas financeiros, conhece o mundo, hoje é um sessentão conservado. Caminha diariamente, não relaxa na musculação da Academia. Semana passada caminhando na praia, eu fui abraço por trás, era Haroldo, alegre, sorrindo, andou a meu lado conversando descontraidamente, com ar de felicidade, filosofou.
– Tudo pode acontecer com qualquer cidadão do mundo, com qualquer cristão, com qualquer homem de bem.
Fiquei surpreso com o pensamento espontâneo e tempestivo, perguntei o que havia acontecido. Haroldo colocou a mão em meu ombro, diminuímos a caminhada, ele confidenciou-me sua história quase sussurrando.
– O Cão está me provocando! Veja você meu primo, um homem como eu, crente em Deus, assisto à missa todo domingo, temente ao castigo divino, caí na tentação do Satanás. O Diabo tomou forma de uma morena da cor de mel, de um sorriso cativante, de uma tentação encantadoramente diabólica. Leonor, minha querida e santa mulher, contratou um jovem para trabalhar em casa. A capeta veste uma bermuda desfiada, esburacada para suas faxinas. Normal para ela, para mim, uma loucura. O sangue ferveu em minhas veias ao me deparar com as pernas roliças, perfeitas, daquela mulher. Todo dia Leonor sai para a casa dos filhos, ver os netos, eu fico sozinho trabalhando no quarto que transformei em escritório. Chica, a jovem, é esperta, na cozinha prepara um gostoso almoço, ela tem mãos de ouro, mãos encantadas, em tudo que pega, dá vida. Até engordei, contrariando meu zeloso médico. A diabinha em forma de mulher percebeu meus olhares para seu corpo fascinante. Certo dia, por volta das dez da manhã, ela entrou no meu gabinete, eu trabalhava em cima de um processo difícil. Chica varria distraída, vestia a bermuda jeans desfiado salientando o maravilhoso traseiro. Acabou-se minha concentração, eu olhava com o rabo do olho para a endiabrada, o sangue esquentava. O Demônio conhece bem as fraquezas humanas. Ela se aproximou, perto do birô, perguntou se eu era advogado, se soltava preso da cadeia. Foi direta, contou-me que um amigo estava preso, roubou o celular de um menino, deu azar, era filho de um sargento, no outro dia estava preso. No maior dengo, me chamando de patrão, disse que faria tudo, tudo mesmo (outra provocação da diabinha) para soltar o amigo e quanto eu cobrava para soltar o rapaz. Eu me contive, a satânica de voz angelical, chegou-se bem junto, o decote mostrava os seios pequenos e duros. Levantei-me respirando fundo, disse que iria pensar no caso, evitei continuar olhando, estava à beira de uma besteira. Sai do escritório.
À noite contei à Leonor sobre o namorado da moça, claro que omiti os detalhes do Demônio acendendo fantasias libidinosas. No sábado fui com a jovem Leonor à cadeia conversar com o marginal. Como não houve ferimento e ser primário, solicitaria habeas-corpus para o preso esperar o julgamento em liberdade. O Delegado de plantão, meu amigo, olhou para mim e para jovem e deu as ordens.
- Vou soltar esse bandido que roubou um celular, o Presidente já disse que não é crime. Pode ir Dr. Haroldo daqui para o meio-dia ele estará solto. Vou apenas dá-lhe uns conselhos e três palmadas.
Pegamos meu carro de volta ao meu santo lar, fiquei surpreso quando ela falou no maior descaramento que notava meus olhares e queria agradecer com amor, pelo que fiz por ela. Entramos num motel da Via Expressa. Foi uma tarde maravilhosa. A diabinha sabe tudo na cama, me ensinou o caminho do purgatório. Ainda não tive coragem de me confessar, se eu morresse hoje, iria para o inferno!
Uma vez por semana, num motel, a diabinha me deixa no céu. Nunca pensei que um dia poderia ser envolvido pelos caprichos do Demônio. O Cão sabe provocar nossas fragilidades. Até se veste com bermuda esfarrapada.
Perto de casa nos despedimos, atravessei a avenida pensando, avaliando como o Diabo se aproveita da fraqueza de um homem.
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