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Jihadismo avança, 20 anos após 11/9, apesar da Guerra ao Terror dos EUA

06/09/2021

“Nenhuma batalha é vencida. Não são sequer lutadas. Ela apenas revela ao homem sua própria loucura e desespero, e a vitória é uma ilusão de filósofos e tolos”. O escritor americano William Faulkner descreveu assim o que seria a guerra em seu livro O Som e a Fúria. Poderia ser o sumário da Guerra ao Terror promovida pelos EUA ao longo de 20 anos, iniciada na sequência dos atentados do 11 de Setembro.

Foram US$ 8 trilhões gastos, bombardeios, ocupações, invasões e manobras militares e de inteligência em 85 países, muitos dos quais continuam arruinados, como Afeganistão, Iraque, Iêmen, Líbia, Síria, Tanzânia, Somália.

Ao menos 7 mil soldados americanos e 387 mil civis mortos. Mesmo assim, novos grupos militantes islâmicos surgem em cada canto de algum país onde houve uma ação americana. “Se há vencedor nessa guerra, venceu de um jeito bem feio, e foi uma vitória contestável”, afirma ao jornal O Estado de S. Paulo Dave Shellenberger, do Soufan Group, centro de análise de inteligência dos EUA.

Durante duas décadas, buscar a vitória na Guerra ao Terror foi a fixação da política externa americana.

“Os ataques de 11 de setembro de 2001 tiveram como objetivo, nas palavras de Osama bin Laden, destruir o mito da invencibilidade americana, e nisso ele teve sucesso”, escreveu na revista Foreign Affairs Nelly Lahoud, membro do centro de estudos New America e autor do livro The Bin Laden Papers. “Em última análise, Bin Laden mudou o mundo, apenas não da maneira que ele queria. Ele esperava, com seus ataques, retirar os americanos do Oriente Médio, mas produziu uma resposta esmagadora dos EUA, que levou a anos de conflitos e um aumento nas fileiras do jihadismo global.”

Os ambiciosos esforços dos EUA, em nome do contraterrorismo, incluíram a tentativa de mudança de regimes no Oriente Médio e de conquistar a simpatia dos muçulmanos – um tiro que saiu pela culatra. A ocupação prolongada no Afeganistão, por exemplo, acabou com os vestígios de simpatia dos primeiros anos após a invasão dos EUA e a queda do Taleban. No Iraque, o efeito foi o contrário ao esperado: a invasão produziu insurgência e fez surgir o Estado Islâmico.

Para a maioria dos analistas, o principal erro da Guerra ao Terror foi não definir um inimigo específico. Esse erro, que perduraria nos governos Bush, Obama e Trump, garantiu que o conflito se espalhasse e tivesse uma duração indefinida.

“Tendo abandonado o conceito de guerra contra uma organização terrorista específica, os americanos nunca seriam capazes de concordar sobre quando ela poderia ser vencida. Se houve um momento em que a guerra estava conceitualmente condenada, foi este”, afirma o escritor Spencer Ackerman, autor de O Reinado do Terror, livro sobre como a era do combate ao terrorismo ajudou a moldar a política americana.

Apesar do erro inicial, os EUA ainda tiveram muitas oportunidades – como a morte de Bin Laden, em 2011 – para declarar vitória e trazer suas tropas de volta. Mas Bush e seus sucessores desperdiçaram as chances. De acordo com Ackerman, eles repetiram outro erro conceitual: não conseguiram reconhecer como as ações dos EUA no exterior iriam inevitavelmente repercutir, produzindo cada vez mais inimigos.

“As muitas políticas díspares da Guerra ao Terror, implementadas nos últimos 20 anos, exibiam um elemento fundamental e nocivo: todas tinham como premissa a visão de que muçulmanos, e não brancos em geral, eram saqueadores, alienígenas, vindos de civilizações hostis”, afirma Ackerman. “As feridas que a Guerra ao Terror infligiu à democracia e ao Estado de Direito dos EUA, por meio de políticas como a normalização da tortura, o uso de ataques de drones, a vigilância em massa de dados de comunicações e a vasta expansão de poder presidencial serão difíceis de curar.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autor: Rodrigo Turrer
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