Economia

Puxada por demanda e câmbio, renda no campo cresce 37%

23/11/2020

Enquanto a indústria, varejo e os serviços ainda mal conseguiram se recompor do baque provocado pela paralisação da atividade em razão da covid-19, o campo comemora crescimento de quase 40% na receita obtida com a venda de grãos. Produção recorde de mais de 250 milhões de toneladas, forte demanda externa puxada pela China e outros países asiáticos, preços internacionais da soja e do milho historicamente elevados e, principalmente, a desvalorização de mais de 30% do câmbio neste ano explicam a grande injeção de recursos no campo.

“Foi o alinhamento perfeito dos astros”, diz o economista Fabio Silveira, sócio da Macrosector, a respeito dessa combinação favorável de fatores que sustenta esse resultado.

A pedido do jornal O Estado de S. Paulo, o economista projetou quanto os agricultores devem embolsar neste ano. Serão R$ 347,2 bilhões com a venda das safras de soja, milho, arroz, feijão, trigo, algodão e outros grãos, levando em conta dados de produção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e preços apurados pela Fundação Getulio Vargas (FGV), secretarias de agricultura e cotados na Bolsa de Cereais, entre outras fontes. É uma cifra 37,4% maior que em 2019, o maior crescimento em quase 20 anos. Só perde para 2003, quando o avanço na receita beirou 50%, também impulsionada pela desvalorização do câmbio.

Essa montanha de dinheiro se espalha pelas pequenas cidades do interior do País ligadas ao agronegócio e muda o ritmo de atividade econômica desses municípios. O movimento é mais nítido sobretudo nos Estados do Paraná, Goiás e Mato Grosso, fortes na produção de soja e milho e que registraram, de acordo com o estudo da consultoria, os maiores avanços nas receitas.

O Paraná foi o que mais ampliou a receita agrícola de grãos este ano, com avanço de 53,8%, seguido por Goiás (36,3%) e Mato Grosso (33,2%). Já o Rio Grande do Sul ficou na lanterna, com avanço de 3,4%, por conta da quebra na safra.

Em Ponta Grossa, que fica na região de Campos Gerais, onde estão as lavouras mais ricas do Paraná, há fila de espera de até 90 dias para comprar caminhonete zero quilômetro em pelo menos quatro concessionárias de marcas diferentes. O veículo pode custar até R$ 215 mil.

Só a produtora Ana Terezinha Slusarz, que cultiva 1,4 mil hectares com soja, milho, trigo, aveia e feijão nos municípios de Ponta Grossa e Tibagi (PR), comprou duas picapes com os ganhos da safra 2020. Outra parte do lucro investiu na aquisição de dois imóveis e adquiriu vários equipamentos agrícolas. “Este ano colhi muito bem e fiquei impressionada com os preços bons”, diz. Há 13 anos Ana toca as fazendas que foram conduzidas pelo pai por mais de 30 anos.

A cotação da saca de soja, hoje na faixa de R$ 170, é o dobro em relação há um ano e está em níveis recordes. No milho, o quadro não é diferente. O preço da saca do grão em 2019 girou em torno de R$ 35 e, neste ano, a média é R$ 66. Pela proximidade do porto, os grãos produzidos no Paraná têm preços maiores do que em outros Estados agrícolas e isso amplia a renda dos produtores. “Tanto o milho como a soja estão indo muito bem”, diz Edmar Gervásio, analista da Secretaria da Agricultura do Paraná.

Como a cotação dessas commodities é definida no mercado internacional e em dólar, a desvalorização cambial aumenta o preço do produto em reais e coloca mais dinheiro para girar nas cidades do interior.

Impacto

No Paraná, o peso do campo na economia dos 399 municípios é significativo. A agropecuária responde, em média, por mais da metade (52%) da geração de riqueza das cidades, aponta um estudo do economista Luiz Eliezer Ferreira, da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep). Ele chegou a essa conclusão a partir de dados oficiais da Secretaria da Fazenda. “Quando há um boom de preços das commodities, a riqueza transborda e se espalha pelas cidades do interior”, diz.

Atrás dessa riqueza, o Magazine Luiza começou a formar este ano grupos de consórcio para gerar cartas de crédito destinadas à compra de máquinas agrícolas, de terras, construção de silos, serviços de pulverização de lavouras, entre outras finalidades. No segmento de veículos pesados, que envolve máquinas agrícolas, o consórcio cresceu 183% este ano.

Claudio Ribeiro, gerente da divisão de vendas do consórcio Magalu nos três Estados do Sul, diz que o mercado de produtos e serviços para o agronegócio sempre esteve no radar. “Mas, neste ano, realmente o nosso foco se abriu para esse mercado em expansão.”

A empresa, que nunca teve lojas físicas próprias exclusivas para o consórcio, já abriu desde janeiro três no Paraná. Até dezembro, planeja inaugurar mais sete no Estado. “Nas praças onde a receita vem da agricultura, a inadimplência é baixa.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autor: Márcia De Chiara. Colaborou Millena Sartori, especial para a AE
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