Brasil

Por falta de segurança, veículos de imprensa suspendem cobertura no Alvorada

26/05/2020
Por falta de segurança, veículos de imprensa suspendem cobertura no Alvorada
Jair Bolsonaro ao lado de ministros

O próprio presidente já proferiu uma série de ataques contra jornalistas e veículos de imprensa

Alguns veículos de comunicação brasileiros decidiram suspender temporariamente a cobertura jornalística na porta do Palácio da Alvorada, em Brasília, devido à hostilidade enfrentada pelos repórteres por parte de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.

O Grupo Globo, o jornal Folha de S. Paulo e o portal de notícias Metrópoles anunciaram nesta segunda-feira (25/05) que não vão mais enviar jornalistas ao local até que eles possam trabalhar em segurança. Segundo o portal UOL, a emissora Band também suspendeu sua cobertura.

É rotineiro apoiadores de Bolsonaro ofenderem a imprensa, mas, nos últimos tempos, o uso de palavras chulas e agressivas vem aumentando exponencialmente, segundo relatam repórteres.

O espaço reservado aos jornalistas fica próximo ao destinado aos militantes pró-Bolsonaro, que se posicionam em frente ao Palácio para ver o presidente. Os dois grupos, atualmente, são separados apenas por uma pequena grade.

Na manhã desta segunda-feira, ao deixar a residência oficial, Bolsonaro, sem máscara, conversou com os apoiadores. Depois, ao passar pelos jornalistas, afirmou: “No dia que vocês tiverem compromisso com a verdade, eu falo com vocês de novo”, recebendo gritos de apoio da militância.

Após a saída do presidente, os insultos se multiplicaram, e foram ouvidos gritos de “lixo”, “escória”, “ratos”, “ratazanas”, “imprensa podre”, “comunistas” e “Bolsonaro até 2050”.

De acordo com o Metrópoles, os apoiadores do presidente, exaltados, quase invadiram o espaço destinado à imprensa, e em nenhum momento foram contidos pelos seguranças do Alvorada.

Folha de S. Paulo questionou o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), responsável pela segurança no local, sobre as agressões, mas não obteve resposta.

O vice-presidente de Relações Institucionais do Grupo Globo, Paulo Tonet Camargo, enviou carta ao ministro Augusto Heleno, do GSI, comunicando a decisão de retirar os jornalistas da cobertura. “Com a responsabilidade que temos com nossos colaboradores, e não havendo segurança para o trabalho, tivemos que tomar essa decisão”, diz o comunicado.

A Associação Brasileira de Imprensa saudou a decisão do Grupo Globo e da Folha, os primeiros a comunicarem a suspensão da cobertura. “Esses ataques ganharam corpo e se tornaram mais graves, havendo inclusive agressões físicas a repórteres por parte da claque bolsonarista”, disse a entidade em nota assinada pelo presidente, Paulo Jeronimo de Sousa. A instituição afirma que pediu ao governo do Distrito Federal proteção aos jornalistas.

A oposição também se manifestou sobre os atos. A deputada federal Tábata Amaral (PDT) se dirigiu ao ministro Augusto Heleno no Twitter: “Imprensa livre é o 4º poder da nossa democracia! É absurdo que jornalistas sejam assediados na porta do Palácio da Alvorada, residência do PR, enquanto cumprem seu papel. Qualquer ameaça à segurança desses profissionais é uma tentativa criminosa de silenciá-los.”

A deputada federal Perpétua Almeida, líder do PCdoB na Câmara, disse no Twitter que ” é inadmissível que jornalistas não tenham assegurado o livre exercício da profissão”.

A agressividade da militância pró-Bolsonaro reflete o desdém e a repulsa do próprio presidente à imprensa. Por diversas vezes, Bolsonaro insultou jornalistas e proferiu ataques à mídia, como no episódio em que um humorista que estava com o presidente no Alvorada ofereceu bananas aos repórteres.

No dia 5 de maio, em frente ao Alvorada, Bolsonaro, na presença de apoiadores, mandou os jornalistas “calarem a boca” depois de ser questionado sobre a troca do superintendente da Polícia Federal do Rio de Janeiro.

Em 31 de março, também em frente ao Alvorada, um dos apoiadores começou a gritar que a imprensa “colocava o povo contra o presidente”. Bolsonaro reagiu incentivando o apoiador e mandando que os jornalistas ficassem quietos.

Em fevereiro, Bolsonaro proferiu xingamento com conotação sexual a uma repórter da Folha. “Ela queria dar o furo a qualquer preço”, disse presidente sobre a jornalista Patrícia Campos Mello, que investigou notícias falsas nas eleições de 2018 e foi acusada de pedir favores sexuais em troca de informações.

Em transmissão ao vivo pelo Facebook no começo de março, Bolsonaro chamou a Folha de “lixo”. Além disso, por diversas vezes o presidente ameaçou não renovar a concessão da TV Globo.

Neste mês, uma repórter da TV Bandeirantes foi atingida por uma bandeirada ao cobrir um ato de apoio ao presidente. Também em maio, dois simpatizantes do governo reviraram o lixo deixado pelos jornalistas para filmar notas fiscais e exibir dados, como nomes e CPF.