Política

Líderes políticos condenam apoio de Bolsonaro a ato anti-Congresso

26/02/2020
Líderes políticos condenam apoio de Bolsonaro a ato anti-Congresso
O presidente Jair Bolsonaro

Bolsonaro minimizou a polêmica, afirmando que não passa de uma “tentativa rasteira de tumultuar a República”

Líderes políticos de várias correntes e partidos criticaram nesta terça-feira (25/02) a atitude do presidente Jair Bolsonaro de compartilhar com seus aliados vídeos que convocam para manifestações a favor de seu governo e contra o Congresso Nacional no próximo dia 15 de março.

Os atos são em reação a declarações do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, que na semana passada fez graves críticas aos parlamentares.

Segundo os jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, a informação de que Bolsonaro teria compartilhado pelo Whatsapp a convocação para os atos foi confirmada pelo ex-deputado federal Alberto Fraga, amigo pessoal do presidente.

Estado afirma que Bolsonaro compartilhou ao menos dois vídeos com trechos idênticos de convocações para as manifestações. Segundo o jornal, as imagens estavam acompanhadas de frases que se referem a Bolsonaro como “cristão, patriota, capaz, justo e incorruptível”.

Líderes políticos de diversos partidos acusaram o presidente de atentar contra a democracia e a Constituição Federal ao encaminhar tais mensagens.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que criar “tensão institucional” não contribui para o país e pediu respeito às instituições. “Só a democracia é capaz de absorver sem violência as diferenças da sociedade e unir a nação pelo diálogo. Acima de tudo e de todos está o respeito às instituições democráticas”, disse em redes sociais. “O Brasil precisa de paz e responsabilidade para progredir”, acrescentou.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso escreveu no Twitter que, “a ser verdade [a divulgação da convocação pelo presidente], como parece, […] estamos com uma crise institucional de consequências gravíssimas. Calar seria concordar. Melhor gritar enquanto se tem voz, mesmo no Carnaval, com poucos ouvindo”.

Além de FHC, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu que o Congresso se posicione em defesa da sociedade e da democracia. “Bolsonaro e o general Heleno estão provocando manifestações contra a democracia, a Constituição e as instituições, em mais um gesto autoritário de quem agride a liberdade e os direitos todos os dias”, disse Lula.

“O que o Brasil precisa é gerar empregos, tirar o povo da pobreza. Bolsonaro nunca combinou com democracia”, acrescentou o petista em redes sociais.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), também condenou a atitude do presidente. “Devemos repudiar com veemência qualquer ato que desrespeite as instituições e os pilares democráticos do país. Lamentável o apoio do presidente Jair Bolsonaro a uma manifestação contra o Congresso Nacional”, escreveu no Twitter.

O deputado federal e líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ), pediu uma reunião com Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), além de líderes dos partidos, para tratar da atitude de Bolsonaro a favor dos atos.

“Temos que parar Bolsonaro! Basta! As forças democráticas deste país têm que se unir agora. Já! É inadiável uma reunião de forças contra esse poder autoritário. Ou defendemos a democracia agora ou não teremos mais nada para defender em breve”, disse Molon em nota.

O deputado afirmou ainda que “Bolsonaro apela ao que todos temíamos: a um ato autoritário contra a própria democracia. Não dá mais. Esses absurdos, exageros e atropelos têm que parar agora”.

Por sua vez, o líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues, (Rede-AP), alertou para os perigos à democracia. “Chega! As forças democráticas precisam repudiar este comportamento vil e impedir a escalada golpista”, disse o senador no Twitter.

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), também condenou a ação e afirmou que, se confirmada, ela “revela a face sombria de um presidente da República que desconhece o valor da ordem constitucional, que ignora o sentido fundamental da separação de Poderes, que demonstra uma visão indigna de quem não está à altura do altíssimo cargo que exerce”.

O jurista Miguel Reale Júnior, um dos autores do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, avalia que a atitude de Bolsonaro implica uma “conspiração contra um dos Poderes da República”.

“Não sei o que ele tomou nesse Carnaval para tomar um ato de tamanha ousadia. É gravíssimo. Convocar a nação para desconstituir um Poder está entre os itens que justificam um impeachment”, disse o jurista, citado pelo Estado de S. Paulo.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, tem uma interpretação semelhante à de Reale Júnior e afirmou que a atitude do presidente pode ser enquadrada no Artigo 85 da Constituição, que define como “crimes de responsabilidade” atos do presidente que “atentem contra a Constituição Federal” e que sejam contrários ao “livre exercício do Poder Legislativo”.

“O presidente está traindo o que jurou ao Congresso em sua posse, quando jurou defender a Constituição Federal”, afirmou Santa Cruz à Folha. “A Constituição e a democracia não podem tolerar um presidente que conspira por sua supressão.”

No Twitter, Bolsonaro tentou minimizar a polêmica gerada por sua atitude, afirmando que compartilha nas redes sociais “notícias não divulgadas por parte da imprensa tradicional”. Ele disse que, no Whatsapp, possui “algumas dezenas de amigos” com os quais troca “mensagens de cunho pessoal”. “Qualquer ilação fora desse contexto são tentativas rasteiras de tumultuar a República.”

A fala de Augusto Heleno que gerou polêmica foi gravada sem que ele soubesse durante uma transmissão ao vivo em rede social em 18 de fevereiro. No áudio captado, ele expressava revolta com os congressitas.

“Não podemos aceitar esses caras chantageando a gente. Foda-se”, disse o ministro-chefe do GSI aos ministros da Economia, Paulo Guedes, e da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos.

O general se referia às negociações na semana anterior entre o Planalto e os presidentes da Câmara e do Senado sobre a execução do Orçamento. No centro das tensões está a emenda do Orçamento impositivo, que diminui o poder do Executivo sobre o Orçamento federal.