Política

Café preto e pão com manteiga para Lula

09/04/2018

Em seu primeiro dia na cadeia, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva conheceu um dos principais desafios aos presos de outros Estados apanhados pela Lava Jato: a inconstância do clima, que amanhece frio, esquenta muito à tarde e gela à noite. O preso recebeu na manhã deste domingo, 8, o mesmo pão com manteiga e café preto servido aos outros detidos que estão na carceragem da Polícia Federal. Sozinho em suas acomodações de 15 m² com banheiro privativo no 4º andar do prédio, Lula pôde acompanhara pela TV a vitória de seu Corinthians sobre o Palmeiras.

Lá fora, antipetistas e apoiadores de Lula se manifestavam – e brigavam. A noite anterior havia sido marcada pela conflito entre manifestantes, pela fumaça de fogos e bombas após a chegada do petista. Lula desceu do heliponto em cima da sede da PF e foi conduzido pelos agentes à sua cela, preparada à pedido da Operação lava Jato para o início do cumprimento de sua pena de 12 anos e 1 mês de prisão no caso do triplex do Guarujá (SP). Teve então o primeiro contato com seus advogados: Cristiano Zanin Martins e o amigo a ex-deputado do PT Sigmaringa Seixas.

Ali ficaram até meia-volta, quando deixaram o ex-presidente em sua cela, que não tem grades, mas uma porta comum de madeira. Em seu primeiro dia preso, Lula recebeu a mesma comida dos demais detentos: o almoço chegou às 11h. Por volta das 15h, seus advogados voltaram. Zanin e Sigmaringa chegaram a assistir o início do jogo com o ex-presidente, mas saíram antes do final. “O presidente está bem, embora indignado.” A defesa alega que o processo tem “motivação política”.

Na sala especial reservada como cárcere há um espaço que serve de área de contado com os advogados – e com a família, quando as visitas começarem. Como era domingo, o prédio passou o dia vazio, cercado por jornalistas, policiais e manifestantes, que ficaram depois do perímetro de duas quadras.

O jantar a Lula foi servido às 18h. Com talhares de plástico, o ex-presidente comeu sozinho na mesa colocada em sua sala o menu do dia: carne assada, arroz, feijão, chuchu e macarrão. Recebeu ainda um copo de suco de laranja. Hoje, um novo processo na Justiça Federal será aberto e nova batalha jurídica começará: o de execução penal. É nele que a defesa vai pedir a remoção do condenado para uma unidade prisional mais próxima de seu domicílio, com condições especiais – iguais à de Curitiba.

Vigília

Enquanto os advogados e Lula tratavam de seu futuro na cadeia, os policiais militares observam os manifestantes que se reuniam em uma espécie de vigília. Nela, o clima era de festa. Crianças com estrelas vermelhas desenhadas no rosto brincam nos ombros dos pais, um grupo de adolescentes fazia uma roda para tocar violão, duas agricultoras distribuíam café e bolo para homens com camisa do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) sentados no gramado de uma casa. De vez em quando, apoiadores da operação Lava Jato soltavam fogos ou passavam buzinando de carro por uma rua próxima.

Cerca de 300 deles passaram a noite em camas improvisadas com lençóis na calçada. Os organizadores já haviam providenciado banheiros químicos para os militantes desde o dia anterior. O agricultor Aniseto Pessoa, de 52 anos, que é voluntário em uma das duas cozinhas montadas em tendas, faz as contas: “De ontem para hoje, foram 22 kg de carne, 20 kg de arroz e 6 kg de feijão e de macarrão.” Ele veio com um grupo do município paranaense de Castro e dormiu na calçada, ao lado das panelas. “Só vou embora quando Lula estiver livre.”

Além das cozinhas, os militantes trouxeram barracas. O grupo aumentou às 16h30, quando a cantora Ana Cañas fez um pocket show em frente à barreira da PM. Grande parte dos acampados veio em um dos 15 ônibus com militantes, a maioria do Movimento dos Sem Terra (MST), que começaram a deixar o interior do Paraná. Nos próximos dias, a militância espera que cheguem mais 20 ônibus vindo de São Paulo, 10 de Minas Gerais e 8 do Rio. Além do MST, vão engrossar os acampados militantes do PT e da CUT.

Vizinho novo

“Moro aqui há mais de 20 anos, antes mesmo de o prédio da PF ser construído e nunca vi nada assim. A gente nem consegue sair, o trânsito está horrível e fazem muito barulho”, reclamou a auxiliar de cozinha Regiane das Neves, de 43 anos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autor: Ricardo Brandt, Fábio Serapião e Douglas Gavras, enviados especiais; colaborou Daniel Weterman
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