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Carne Fraca e a guerra das elites delinquentes contra a Lava Jato

30/03/2017
Carne Fraca e a guerra das elites delinquentes contra a Lava Jato

Todos os sinais amarelos acenderam. Alerta total. É um jogo de xadrez. As peças são movidas tanto por parte das elites delinquentes (político-empresariais), que querem sobreviver e escapar das punições, como da Lava Jato (que quer promover o império da lei contra os poderosos). A guerra acirra-se a cada dia.

Gilmar Mendes criticou os “vazamentos” de delações dos seus “amigos” (Aécio, Temer, Renan, Jucá, Aloysio, Serra etc.). Quer anulá-las (mas não há fundamento jurídico para isso). Uma prova obtida licitamente não é contaminada por um fato superveniente (vazamento).

Quando saiu o vazamento da delação de Delcídio, o ministro referiu-se a ele em seu voto no Plenário do STF. Vazamentos anteriores lhe causavam indignação e eram publicamente citados. Vazamentos recentes, contra os “amigos”, devem ser “anulados”. Dois pesos e duas medidas. Isso é mortal em um juiz (que deve ser imparcial).

Rodrigo Janot (PGR) reagiu às acusações de Gilmar: “procuro me distanciar dos banquetes palacianos, fugindo dos círculos de comensais que cortejam desavergonhadamente o poder político; repudiamos a relação promíscua com a imprensa, seja nacional, seja internacional; alguns tentam nivelar a todos à sua decrepitude moral, e para isso acusam-nos de condutas que lhes são próprias; há disenteria verbal”.

Como em todas as guerras, estamos vendo as elites delinquentes (caixa dois, caixa 1 corrupção, lavagem de dinheiro etc.) atacarem os “exageros” comunicacionais da Operação Carne Fraca (reconhecidos até mesmo por integrantes da PF). Tudo isso faz parte do jogo.

Quanto mais se deslegitimar a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça, mais chance elas têm de aprovar o grande “anistião” que se tornou um sonho de consumo. Na Itália, a Operação Mãos Limpas acabou quando os juízes foram massacrados e perderam o apoio popular.

Os ataques do crime organizado dos poderosos servem também para desviar a atenção da população para o sério pano de fundo da referida operação, que nasceu para apurar a corrupção do sistema de fiscalização dos frigoríficos.

Há notícias de corrupção na Unidade da BRF de Mineiros (GO). Ela teria pago propinas a fiscais agropecuários para evitar o fechamento da unidade. (Ver G1)

A empresa Peccin teria pago propina para fiscais agropecuários para conseguir laudos positivos em fiscalizações, diz a decisão do juiz federal. Os donos da companhia, a família Peccin, teriam acesso direto a líderes do esquema de corrupção, que poderiam vetar pareceres negativos à empresa em troca de propina (G1, citado).

A Operação Carne Fraca apura o envolvimento de fiscais do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento em um esquema de liberação de licenças e fiscalização irregular de frigoríficos. (G1, citado).

Os partidos PP e PMDB seriam beneficiados com propina envolvendo o esquema da venda ilegal de carnes. O foco da PF era a corrupção, não questões sanitárias, que obscureceram a realidade dos fatos.

Talvez não houvessem problemas sanitários em todos os frigoríficos investigados, mas é praticamente certa a corrupção em todos eles. A PF quer saber quantos são os funcionários com indicação política que faziam parte do esquema.

Esse esquema – que enoja tanto quanto a carne podre e adulterada que pode ter nos alimentando por muito tempo – era mantido por meio de fiscais que recebiam propinas em forma de dinheiro e mesmo de produtos – em boa qualidade, claro -, para fazerem vistas grossas às irregularidades. (ver Jusbrasil)

Eles facilitavam a produção de alimentos adulterados e emitiam certificados sanitários sem realizar as atividades fiscalizatórias necessárias e indispensáveis à nossa saúde (Jusbrasil, citado).

Dessa delinquência saía apoio financeiro para campanhas eleitorais. No pleito de 2014, último onde as pessoas jurídicas puderam fazer doações aos candidatos e partidos, calcula-se que as empresas investigadas doaram cerca de R$ 393 milhões a candidatos (Jusbrasil, citado).

Os alvos da Carne Fraca doaram R$ 65,5 milhões a 213 deputados de 22 partidos (ver Estadão, 23/3/17). As empresas JBS, BRF e Seara, investigadas na Operação Carne Fraca, doaram R$ 65,5 milhões a 213 deputados da Câmara. Dos 27 partidos representados na Casa, 22 receberam recursos (Estadão, citado).

O PP, do ministro da Agricultura, Blairo Maggi, é o que mais obteve doações na campanha de 2014: R$ 25,3 milhões; seguido do PR, com R$ 10,4 milhões e do PMDB, com R$ 5,5 milhões. Os dois partidos que se recusaram, na maioria, a assinar o requerimento de instalação da CPI da Carne Fraca na Câmara, PDT e PCdoB, conseguiram juntos R$ 6,7 milhões em doações das três empresas (Estadão, citado).

O grupo JBS financiou 106 dos atuais 513 deputados federais. Tem uma bancada de 20% da Câmara. A empresa que em 2002 fez doações eleitorais de 200 mil reais, em 2014 doou mais de 300 milhões de reais para definir quem deveria atingir o poder político no Brasil (Jusbrasil, citado).

E até ensaiou levar um dos membros da família dirigente ao governo de Goiás. Definiu a eleição de senadores, governadores. Subornar fiscais é quase nada quando se pode comprar todo o sistema político (Jusbrasil, citado).

A corrupção envolvendo todo o sistema político causa danos tão nefastos como a venda de produtos cancerígenos e estragados para a população. A compra do sistema político é um crime contra a democracia.

A corrupção mata muita gente porque retira o dinheiro público que poderia ser aplicado na saúde, educação, segurança e Justiça, que tanto tem faltado em nosso país.

Temos que implodir esse sistema político-empresarial corrupto para poder reconstruir o Brasil. Implodir para reconstruir. A Lava Jato está cumprindo o papel dela, mas o arremate final da implosão está nas nossas mãos, com o voto faxina da cidadania vigilante. #voto faxina.

Impõe-se uma limpeza no velho jeito de fazer política e negócios. Só o império da lei é capaz disso, porque não podemos esperar das elites delinquentes mudanças éticas imediatas.

A podridão da corrupção das classes dirigentes exala tanto odor como algumas carnes vendidas no Brasil.