Geral

Imóveis podem ser demolidos por pertencerem ao DNIT e Transnordestina

22/10/2016
Imóveis  podem ser demolidos por pertencerem ao DNIT e Transnordestina

O Juiz federal Aloysio Cavalcante esteve em Palmeira dos Índios, na semana passada, para acompanhar uma vistoria técnica, feita por peritos nomeados pela Justiça, em duas regiões. Uma, localizada no prolongamento da Vila Maria, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) diz pertencer ao seu domínio. A outra, que margeia a linha do trem, que vai da Avenida Viera de Brito até o bairro da Ribeira, a Ferrovia Transnordestina em Alagoas pede a reintegração de posse do local.

Os peritos verificaram as dimensões dos imóveis, do fundo até o meio da pista, com uma fita métrica. O primeiro trecho inspecionado está compreendido entre o viaduto e o posto Imperial das Palmeiras e abrange três casas, em uma área que o Dnit entende como irregular. Mas o perímetro a ser analisado vai muito mais além, pois envolve diversos imóveis, e que vão sendo inspecionados a partir de demandas processuais. Outro ponto também vistoriado está localizado no entorno da linha do trem, na Ribeira, onde diversas famílias correm o risco de perder seus imóveis.

A procuradora do município de Palmeira dos Índios, Sinair Porto, disse que o município tomou conhecimento do processo de forma documental, através da justiça, pois nem o DNIT e nem a Transnordestina procuraram o município para tratar do assunto. “Fomos intimados para uma audiência e lá tomamos conhecimento de toda situação. A partir daquele momento passamos a ver realmente a situação drástica que poderia ser acarretada para os moradores e para o município. Essas famílias vivem aqui uma realidade há mais de 20 anos. Essa área, da Vila Maria, é considerada pertencente ao município desde a ampliação dos limites urbanos. Então, a gente pediu ao juiz que esse processo fosse suspenso para que fossem realizadas novas perícias, estudando caso a caso, com acompanhamento não só da procuradoria do município como também de uma equipe social”, comentou.

 

Para a procuradora, as reais condições de cada família, as condições financeiras e de moradia precisam ser analisadas para que o município possa, de fato, dar apoio a elas, conduzindo-as para uma nova moradia, se for o caso. “Vamos ajuda-los não somente na defesa , mas também no apoio social. Não temos um número exato de casas, porque as demandas vão chegando e vamos sendo comunicados. A inspeção, dessa vez, foi nesse perímetro da Vila Maria, de três casas,  e uma na Ribeira, na rua São João,  na parte da linha. Até agora temos algo em torno de 18 ou 20 casas. O DNIT e a Transnordestina vão conduzindo as ações de forma gradativa, e não no todo, e o juiz está deferindo em quantitativos. Só temos conhecimento cada vez que somos intimados. O que eles querem  é reconduzir o perímetro como área  do DNIT, tirando as casas e transformando em vias para uma futura ampliação, e a rede ferroviária também para que venha novamente a conduzir os serviços de ferrovia”, informou Sinair Porto.

IMG_9779

Foto: Lucianna Araújo 

A família de Shaiane Ferreira Alves mora há 24 anos na casa construída próximo ao viaduto. Ela está grávida de sete meses e teme não ter como abrigar a filha se a perícia confirmar que a área precisa ser reintegrada e demolida. “O terreno foi doado pelo município, no governo do então prefeito Helenido Ribeiro. Meus pais construíram a casa e possuímos a documentação. Há três anos vivemos esse momento de apreensão, pois não está fácil conseguir uma casa. Depois de tudo conquistado, com muito esforço, no sentimos ameaçados. Se isso acontecer esperamos ser abrigados, pois esse é o único imóvel que possuímos. Não é fácil ter sua casa e se sentir desamparado”, reclamou.

 

Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Subsecção de Palmeira dos Índios, Klenaldo Oliveira, a decisão de conceder a posse para as partes autoras trazem enormes prejuízos financeiros e sociais. “Diversas famílias deverão ter suas casas demolidas, se de fato houver a reintegração”, lamentou.

Além da OAB, também estiveram presentes à vistoria representantes do município de Palmeira dos Índios, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), o Defensor Público Federal Diego Vitório, o vereador Júlio Cézar, entre outras autoridades.

O vereador Júlio Cézar (PSB) – prefeito eleito do município- convocou uma audiência pública, em maio deste ano, que contou com vários segmentos da sociedade, onde foi discutido o futuro das famílias que possuem imóveis nas regiões nas faixas onde a Transnordestina e o DNIT pedem a concessão. De acordo com Júlio Cézar, a audiência pública deu uma contribuição para rediscutir a questão que envolve tanto a Transnordestina quanto a faixa de domínio do DNIT. “A Audiência pública era prioritariamente discutir a questão da Transnordestina. A justiça, junto com a Defensoria Pública da União (DPU) decidiu rever o processo e fazer a perícia. Principalmente porque informou ao município sobre a questão urbana da cidade, pois teve uma lei que reformulou isso, e agora, o juiz entende que é preciso rever a decisão. É por isso que essa perícia aconteceu”, afirmou.

Ele disse, ainda, que apesar do momento tenso, isso tranquiliza os moradores, pois a perícia volta basicamente à estaca zero. “Como a DPU tem apresentado interesse à moradia e à dignidade humana, a Justiça federal entendeu que tinha que rediscutir e não só vir aqui executar como já aconteceu em outras cidades de Alagoas, que já tiveram suas demolições, de Porto Real do Colégio a São José das Lajes, por onde passa a rede da Transnordestina. O que a gente questionou é que tem vários trechos que foram danificados em 2010, com aquela enchente, e nunca foram reparados, como por exemplo, em Quebrangulo. Então,  chegar aqui e cumprir uma decisão como essa sem discutir o mérito, e também o lado dessas famílias e o impacto social disso, seria inviável. E quem vai responder por isso? É a prefeitura? Essas pessoas vão ter suas casas demolidas e elas vão para onde? Se isso chegar a acontecer, o município, sozinho, não terá condições de assumir essa responsabilidade para alojar essas famílias”, analisou.

E prosseguiu. “Eles têm as documentações das casas, que segundo os moradores são mais antigas do que a própria implantação da própria ferrovia. E por isso, essa inspeção técnica com a Justiça Federal, a perícia e a DPU foi boa porque deixa os moradores mais tranquilos, sabendo que as coisas estão sendo trabalhadas para eles. Essas três casas, o DNIT diz que elas estão na faixa deles, mas tem as casas  da linha do trem que é um processo semelhante, reclamado pela Transnordestina, com áreas ocupadas na faixa de domínio dela. É importante ter um trem funcionado? É. O interesse econômico é importante. Mas qual o nosso interesse, da Defensoria Pública da União e da Justiça é proteger o interesse das famílias para que elas tenham direito a suas moradias”, completou Júlio Cézar.

O defensor público federal, Diego Vitório, informou que tanto o DNIT quanto a Transnordestina fizeram o pedido de reintegração de posse por entender que os imóveis foram construídos em áreas consideradas perigosas, para os veículos e pessoas, por estarem muito próximas à rodovia ou à linha férrea. Mas, segundo ele, essas construções não imprimem qualquer risco.  “Essa perícia foi feita para aferir se os imóveis invadem a área de domínio como uma área que eles dizem que não se pode construir nada, tanto às margens de uma rodovia ou na da linha do trem. Mesmo que você seja o proprietário, que é para a segurança do transporte e das pessoas. Na primeira parte vistoriada, elas não ficam nessa área inapropriada para a construção. A discussão, agora, é sobre a propriedade, a quem pertenceu ou não pertence. No que diz respeito à rodovia, segundo eles alegam, aquela área foi desapropriada quando da construção da alça de acesso da BR 316. Só que o pessoal tem a documentação dos imóveis, que foi uma área doada do estado para o município e do município para as pessoas. Mas, aparentemente, parece que tem uma duplicidade de registro, como se o estado tivesse doado uma área que não era dele. Isso é o que vai definir se a ação vai ser ou não procedente”, explicou. 

Para o defensor federal, se for comprovado que o estado não poderia doar os terrenos, ainda existe uma saída jurídica que pode beneficiar os moradores dessas duas regiões. De acordo com a Medida Provisória (MP 2.220/2001), ela concede o direito real de uso, para fins de moradia para os que já estavam nesses imóveis cinco anos antes da promulgação da MP, de 1996 até 2001,. “Esses vão poder ficar. E quem não estava pode conferir esse direito junto aos órgãos da Secretaria da União, mas isso também depende de vontade política. Eu não vejo qual o interesse que a União tem naquela área, já que não imprime nenhum risco por estar às margens da rodovia ou da linha. Mostrei ao juiz a cidade toda, principalmente na área beirando a linha do trem para mostrar a situação que é muito complicada e envolve praticamente o município inteiro, pois tem muitas casas e imóveis comerciais, que geram emprego e renda. Agora, temos que aguardar quais os próximos passos do processo”, completou.

Segundo o juiz Aloysio Cavalcante, apesar de esse ter sido um momento meramente probatório, as provas são fundamentais para avaliar até que ponto essas reintegrações de posse vão ser concedidas, e se de fato elas vão acontecer. Para ele, nenhum mérito será adiantado. “Sabemos que há impactos sociais nisso e a inspeção judicial serve para aferir in loco como está a situação posta e as medições. Por isso que eu marquei de vir para cá justamente no mesmo dia da vistoria, porque é uma questão técnica. Procedemos a inspeção, que na verdade não substitui a perícia, e nenhum mérito será adiantado. Tenho que analisar as provas dos autos e verificar a pretensão de cada parte cada parte, tanto o DNIT e da Transnordestina, que querem regularizar os imóveis, e por outro lado, as pessoas que estão aqui há muito tempo e que buscam com representantes da União permanecer em seus imóveis. Não posso adiantar nenhum mérito e nem desfecho dos autos para evitar uma repercussão antecipada e desnecessária”, afirmou o juiz.