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Homem morre após incêndio na favela do Cimento

24/03/2019

Após sofrer queimaduras no incêndio da Favela do Cimento, na região do Viaduto Bresser, na zona leste de São Paulo, um homem ainda não identificado morreu na tarde deste domingo, dia 24. Ele chegou ao hospital Salvalus às 20h31 de sábado, dia 23, e foi internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) já em estado grave.

Em nota, a Prefeitura de São Paulo lamentou o falecimento: “A Prefeitura de São Paulo lamenta a morte do senhor, vítima de queimaduras causadas pelo incêndio na noite de sábado, dia 23, na ocupação conhecida como ‘Favela do Cimento’. O suspeito pelo incêndio foi preso na madrugada de domingo (24), conforme Auto de Exibição e Apreensão registrado no 8° Distrito Policial da capital.”

A vítima não estava com documentos e ainda não foi identificada. A prefeitura também informou que um suspeito de iniciar o incêndio foi preso na madrugada deste domingo.

Incêndio

Na véspera do cumprimento da reintegração de posse determinada pela Justiça, um incêndio de grandes proporções atingiu a Favela do Cimento, às margens da Radial Leste, zona leste de São Paulo, na noite de sábado, 23. Até o momento, não há notícia de feridos.

O incêndio começou por volta das 19h30, segundo a Polícia Militar. “Eu estava dormindo. Acordei assustado com o barulho da fiação estralando, dando curto-circuito por causa do fogo. Já estava consumindo tudo”, conta o catador Mizael Ataíde, de 30 anos. Há oito meses, ele saiu da cidade de Contagem, em Minas, para morar na capital paulista, onde conheceu a mulher, Cláudia dos Santos, de 33.

O incêndio aumentou rapidamente, contam. Ainda assim, o casal conseguiu retirar do barraco a geladeira, o fogão e um colchão, que encostaram na parede de um posto de gasolina desativado. Outros móveis se perderam, assim como as roupas. “Vou passar a noite aqui, não temos para onde ir”, diz Ataíde. “Não sei se vou conseguir cozinhar, a comida queimou toda”, relatou Cláudia.

Ao todo, 20 viaturas e cerca de 70 homens do Corpo de Bombeiros foram acionados para apagar o fogo, trabalho que durou cerca de duas horas. A causa do incêndio ainda é desconhecida. No local, no entanto, policiais comentavam que um grupo de moradores, revoltados com a reintegração, teria posto fogo nos barracos.

“A gente já não tem nada, ia tacar foco nos nossos próprios bagulhos?”, contesta o estivador Bartolomeu Carvalho, de 45 anos, morador da Favela do Cimento desde 2015. “Eu sei que não é certo morar aqui, que a gente estava aí ilegal, mas é por falta de opção: não temos para onde ir.”

Segundo relata, Carvalho acordou às 4h30 para trabalhar: tinha três descargas de mercadoria programadas para fazer em diferentes pontos de São Paulo. Quando chegou em casa, mais de 14 horas de trabalho depois, viu o fogaréu. “Foi um susto”, diz.

A mulher e a filha de 8 anos já haviam saído nesta semana para dormir na casa de um parente. “São mais de 15 pessoas morando lá na casa da minha sogra, não cabe mais ninguém”, afirma Bartolomeu. “Eu deveria ter tirado o resto das minhas coisas hoje, mas se eu perder um dia de trabalho deixo de ganhar R$ 40. Não posso, tenho minha família para cuidar.”

O fogo destruiu a maior parte dos barracos. Nas calçadas, foram abandonados móveis queimados, ainda fumegando, metais retorcidos e entulhos. Durante o incêndio, o Viaduto Bresser ficou bloqueado por viaturas da Força Tática da PM. A via foi liberada para o tráfego de veículos por volta das 21h10.

A reintegração

Ainda pela manhã, a Secretaria de Assistência Social informou que 42 famílias aceitaram deixar o local e foram abrigadas em centros de acolhimento ou casa de parentes. Além disso, três famílias aceitaram passagens de ônibus para retornarem às sua cidades de origem.

“Os assistentes sociais da Prefeitura vão continuar conversando diariamente com as pessoas que não aceitaram ir para nossos centros de acolhimento. Não existe prazo definido para as pessoas permanecerem nos centros de acolhimento.”, disse a Prefeitura em nota divulgada nesse domingo, 24.

As pessoas que não aceitaram ir para abrigos continuam nas ruas do entorno da ex-favela, no bairro da Mooca. Moradores relataram ação truculenta da polícia momentos após o incêndio. “Teve bala de borracha, tem gente com marcas pelo corpo”, disse o Padre Julio Lancellotti – que esteve no local e acompanhou a reintegração de posse. A polícia negou qualquer confronto ou ação violenta.

O Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CONDEPE) divulgou uma nota de repúdio ao que chamou de “violação dos Direitos Humanos na comunidade do Cimento”. O CONDEPE acionará os órgãos públicos responsáveis pela apuração das violações de direitos humanos relatadas pelos moradores da Comunidade do Cimento. “É urgente que sejam apuradas as responsabilidades do incêndio ocorrido na Comunidade do Cimento, de modo a identificar os autores para puni-los rigorosamente. É preciso conter a prática de limpeza das áreas urbanas ocupadas por meio de condutas criminosas, que encontram na impunidade seu maior estímulo”, diz a nota.

Autor: Felipe Resk e Gilberto Amendola
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