Variedades

‘Uma Mulher em Guerra’ é original e encantador

28/10/2018

Todo ano é assim, a Mostra nos traz os filmes badalados, aqueles que ninguém pode perder, e também algumas surpresas muito agradáveis. Uma delas é Uma Mulher em Guerra, da Islândia. Um daqueles filmes que você pega para preencher uma vaga de horário, vai se interessando aos poucos e termina encantado com que acabou de ver.

A história é de uma originalidade rara nos dias de hoje, quando se considera que o cinema tem de enxertar um bom número de clichês para se tornar atraente ao público. Pois bem, Uma Mulher em Guerra, dirigido pelo cineasta Benedikt Erlingsson, segue caminho contrário e vai construindo sua trama de surpresa em surpresa.

A protagonista é Halla (Jalldóra Geirharosdottir), uma cinquentona que exerce dupla jornada de trabalho: é professora de expressão corporal e militante ecológica adepta de métodos radicais. Sua principal causa é contra a construção de uma usina de alumínio num paradisíaco vale do seu país. Sua tática é cortar o fornecimento de energia para impedir o prosseguimento da obra, parceria com capital chinês.

Ao mesmo tempo, Halla procura adotar uma órfã ucraniana, cujos pais foram mortos na guerra. Tem uma irmã budista, que vai se mudar para a Índia em busca de iluminação.

A trama é realista mas usa uns toques vagamente surreais. Por exemplo, um grupo de instrumentistas aparece em toda parte e em circunstâncias muito inesperadas, funcionando como coro de teatro grego com seus comentários, unicamente musicais e em geral irônicos.

Esses efeitos de distanciamento tornam a trama ainda mais atraente. Mesmo porque a história é contada com um invejável rigor de linguagem cinematográfica. O filme é preciso, tanto nos enquadramentos, como nos movimentos de câmera e na montagem. Mas o destaque maior fica mesmo para sua atriz principal, com atuação forte e refinada em dois papéis – o da guerrilheira ecológica e sua gêmea budista.

Dois filmes mais diretamente políticos podem ser vistos também neste domingo: o argentino Viaje a los Pueblos Fumigados, de Fernando Solanas, e o espanhol O Silêncio dos Outros, de Almudena Carracedo e Robert Bahar.
Solanas, autor (junto com Octavio Getino) de um dos clássicos do cinema documental sul-americano, La Hora de los Hornos (1968), continua a investir em seu cinema de denúncia, mostrando o poder das multinacionais e a complacência dos governos com o abuso dos agrotóxicos. Solanas é cineasta corajoso, que aponta a irresponsabilidade com a saúde pública. Dá, por assim dizer, nome aos bois e expõe o poder do grande capital na indústria alimentícia. Quando será feito no Brasil um documentário de fato contundente sobre o agronegócio?

Em O Silêncio dos Outros, fala-se dos crimes do franquismo de como foram calados pela Lei do Esquecimento, a Anistia espanhola que empurrou as atrocidades do regime fascista para baixo do tapete e serviu de modelo para as leis de anistia em países que saíam de ditaduras na América Latina, como Chile e Brasil.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autor: Luiz Zanin Oricchio
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