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Lendo & Comentando

28/09/2018
Lendo & Comentando

De quando em vez, chega-me às mãos livros de autores alagoanos a fim de comentá-los nos Semanários Tribuna do Sertão/ A Notícia, bem como no matutino Tribuna Independente.E o faço como agradecimento àqueles que enaltecem a literatura alagoana. Desta feita, o poeta Maurício de Macedo presenteia-me com mais um livro de sua lavra FRAGMENTO que, por sinal, intitula sua novel obra.

“Os pedaços de Orfeu esquartejado/ cantam na maré,/ na corrente,/ na ilha./ Canta nos pedaços Orfeu/ para onde o mar os levar.” Vate moderno sem precisar expor suas ideias com a metrificação dos clássicos.Sobressai, porém, seu pensar sem as amarras dos escritores do pretérito não muito remoto.

“Olhos d’Água. O que tenho a dizer,/ direi aos poucos/ feito um gato/ tartamudeando palavras de pedra./ Mas direi todo nos pedaços/- reflexo da lua/ nas poças das calçadas./ Direi aos poucos e sempre/ palavras de sístole,/ jatos de sangue na artéria./ Direi feito estilhaços/ – petardo da poesia/ no cerne da vida./ Não direi rios / que não sei dizê-los./ Direi olhos d’água,/ de vez em quando e sempre”. Palavras que saem de seu intelecto sem recorrer a metáforas e outras figuras de linguagem. Muito pelo contrário, segue a temática escolhida pela intimidade da sensibilidade poética.

“Quando o esquecimento liberta o tempo / da cronologia arbitrária da História,/ do cérebro onde estão impressos/ voam feito folhas ao vento/ num redemoinho/ os signos./ Passado, presente, futuro/ despertam juntos do narcótico da consciência./ As vozes burocraticamente divididas,/ mutiladas/ – sussurro calando outro sussurro,/um grito calando outro grito – / reencontram-se num coro./ A maré escura reúne os pedaços de Orfeu/ esquartejado, dispersos na corrente”. Parece-me que eleva cada vez mais seus pensamentos à procura da certeza que tem em mente. É o vate desprovido de sofismas filósofos do seu tempo.

“Ao leitor. Sou o poema náufrago,/ E peço ao leitor/ a respiração boca a boca/ que me faça sobreviver./ Sou poema inacabado./ E peço-lhe/ que arremate meus versos,/ sendo meu co-autor./Sou o poema cego./ E peço-lhe/ que me empreste seus olhos/ para que eu possa ver./Sou o poema náufrago,/inacabado,/cego,/ como todos os poemas o são”.

Dir-se-ia que Maurício recorre ao leitor a fim de compartilhar sua imaginação poética.
Estão inseridos outros poemas que merecem registro. Poesia e memória, Dizeres, Trincheiras, Para si mesmo, para todo mundo Desenhos na água, Vento e mar, Fugitivo, Apenas um cacófato, Por trás do poema, Insone, Doloso,O abismo, Demora, Travessia, Levanta-te, Existencialmente incorreto, O outro, Paralelas, A espera, Mutilado e outros poemas com as mesmas características do autor.

Cabe, portanto, ressaltar o que escrevera Antonio Carlos Secchin. “ No vasto domínio temático dos poemas de fragmento, Maurício de Macedo nos transporta a seu íntimo passado e a suas públicas admirações, atravessa geografias reais e oníricas, mas, sobretudo, celebra o inútil pode do verbo. Em Maurício, a palavra poética aponta para a irreversível perda do conceito de unidade, a partir, inclusive, da cisão do corpo do poeta primordial, Orfeu. Órfã da unidade, a poesia circula em estilhaços de poemas náufragos, voluntariamente bem –inacabados”. Por fim, escreveu dezenas de outros livros e, sendo assim, tem cátedra poética a serviço da literatura caeté. Espero receber outras produções de Maurício de Macedo como prova de minha admiração ao autor como um todo