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Promotora brasileira comanda equipe que apreendeu documentos de advogado de Trump

19/04/2018

Uma pernambucana está à frente da unidade de corrupção responsável pela operação de busca e apreensão na residência, escritório e quarto de hotel de Michael Cohen, advogado do presidente Donald Trump, no dia 9. A promotora federal é Tatiana Roesler Martins, de 41 anos, graduada pela Universidade de Yale e promovida para o cargo em junho, quando seu chefe, Andrew Goldstein, foi recrutado pelo procurador especial, Robert Mueller, para a equipe de investigadores sobre a interferência russa na eleição de 2016.

A operação do FBI, autorizada pelo subsecretário de Justiça, Rod Rosenstein, colocou a unidade no epicentro de um terremoto político. Trump, segundo o Washington Post, ficou tão nervoso ao saber da investigação que não conseguia se concentrar nas opções militares oferecidas por seus generais para o ataque à Síria, na Sexta-feira.

Localizado em São Paulo, o ex-promotor do Distrito Sul Nicholas Lewin falou sobre Tatiana, com quem trabalhou até outubro do ano passado, quando deixou a carreira pública para fundar um escritório com dois colegas. Lewin, veterano de processos contra a Al-Qaeda, descreve sua ex-colega como “uma promotora zelosa, agressiva, justa, que seguirá provas onde quer que seja”.

O padrasto de Tatiana é Sérgio Lira, médico imunologista e pesquisador do hospital Mount Sinai, de Nova York. “Ela entrou na minha vida quando tinha 3 anos”, lembra Sérgio, que viveu com Marina Roesler, mãe de Tatiana, até 2007. Eles mantêm uma relação próxima. Sérgio ressalta a discrição de Tatiana, que mencionava estar “sobrecarregada” por suas funções, mas não dava sinais da importância que teriam para a investigação.

Independência

Além do temor de ter documentos e comunicações com seu advogado expostos a escrutínio legal, Trump entende a gravidade da entrada no jogo do Distrito Sul, grupo de promotores federais ao qual pertence Tatiana. O Distrito Sul é conhecido em Washington pelo apelido de Sovereign District (Distrito Soberano), pela independência de seus promotores.

O tribunal do Distrito Sul, onde Cohen e a atriz pornô Stormy Daniels se encontraram, na segunda-feira, é a corte em funcionamento contínuo mais antiga dos EUA, aberta em 1789.

A história do Distrito Sul é contada no livro The Mother Court: Tales that Mattered in America’s Greatest Trial Court (“A Corte Mãe: Histórias Importantes no Mais Importante Tribunal Americano”, em tradução livre), do ex-promotor federal James Zirin, que defende, em conversa com a reportagem, a operação de busca de documentos do advogado do presidente como “seguindo a letra da lei”.

Zirin ecoa outros admitidos na rarefeita equipe de promotores que inspirou a série Billions, do canal a cabo Showtime. “O dia em que me ofereceram o cargo de promotor foi o mais importante da minha vida profissional.”

O salário mensal inicial é de R$13.700, sem décimo terceiro. Não há penduricalhos nem auxílio moradia, mas passar pelo Distrito Sul é um carimbo no passaporte para a respeitabilidade jurídica, uma possível carreira política ou um posto confortável em escritórios de advocacia.

Série de TV

De Paris, onde desfruta sua aposentadoria, Robert Hammel, ex-promotor do Distrito Sul nos anos 80, sob o lendário Rudolph Giuliani, que depois foi prefeito de Nova York durante o 11 de Setembro, lembra que a independência do Distrito é uma fonte constante de atrito como o Poder Executivo, em Washington.

“O presidente Ronald Reagan tentou impor restrições ao que podíamos investigar, em casos de previdência social, e Rudolph Giuliani ignorou”, lembra Hammel. O Distrito Sul inspirou a série Billions, baseada, em parte, na caçada do promotor Preet Bhahara a um administrador de fundos de hedge de Nova York, Stephen Cohen.

Bharara não conseguiu mandar Cohen para a cadeia e foi demitido por Donald Trump em março de 2017. Agora, tem uma carreira como comentarista na CNN e anfitrião de podcasts.

O Distrito Sul tem um papel histórico na jurisprudência americana, em casos como o desastre do Titanic e, nos anos 30, o processo do governo para censurar a publicação de Ulisses, de James Joyce.

James Zarin lembra que o caso marcou a diferença da definição entre pornografia e obscenidade e liberou a publicação de Ulisses, considerado um romance seminal do século 20. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autor: Lúcia Guimarães, correspondente
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