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Remadora paralímpica afirma: “Perdi uma perna… e achei um sentido para a vida”
Não sinto saudade de ter duas pernas. Porque eu não fazia jus a elas, sabe? Vivi até os 23 anos sem praticar um único esporte; sem dar um só passo por outro lugar que não minha cidade natal. Aí, vieram o atropelamento e a vida com uma perna a menos. Os cinco primeiros anos da nova condição foram os mais sofridos da minha vida. Em compensação, os últimos 11 têm sido incríveis. Subo em pódios, caminho por países onde nunca imaginei que pisaria. Perder uma perna me fez ir mais longe!
Mais do que perdas, o acidente trouxe ganhos
Quinta-feira, 15 de fevereiro de 2000. Mais um dia de trabalho como telefonista havia chegado ao fim. Como de costume, às 22h atravessei a primeira pista da rodovia onde ficava a empresa em que dava expediente e parei no canteiro central. Um carro me pegou em cheio e minha vista escureceu. Antes de apagar por completo, ouvi alguém dizer: “Procura a perna dela do outro lado!”.
Foram 47 dias em coma, seis meses internada e cinco anos em recuperação. Fiz 13 cirurgias e senti dores indescritíveis que, olha a ironia, trouxeram sentido para cada segundo que passo neste mundo. Em vez de focar no que o acidente levou, me concentrei no que ele trouxe – uma nova chance de viver! Isso me fortaleceu rapidamente. Lembro que, como de praxe, fui encaminhada para um psicólogo antes de receber alta. Ele começou perguntando como eu imaginava viver sem uma perna. “Preciso ir pra casa, tenho uma porção de coisas pra fazer e uma perna que precisa aprender a andar de novo”, respondi. Você está ótima. Vai pra casa!”, sorriu o doutor.
Graças à fisioterapia, um ano depois do acidente eu já andava apoiada em muletas. Por indicação médica, procurei uma academia pela primeira vez na vida. A ideia era fazer musculação, mas já no primeiro dia um professor me “convocou” para a aula de natação. Entrei na água e, ao perceber que conseguia deslizar perfeitamente por ela, vibrei feito criança: ali, eu estava inteira.
Meses depois, a convite de um professor, passei a treinar com atletas paralímpicos. Na minha primeira queda na piscina, perdi feio para uma menina sem uma perna e um braço… A derrota me deu gana de treinar mais ainda. Um ano depois, em meados de 2006, fui representar a natação paralímpica num evento. Lá conheci meu atual treinador, o Zé Paulo, que me convidou a tentar o remo. No início, desdenhei. “Meu lugar é dentro d’água, não sobre ela”, pensei. Ele tanto insistiu que fui até a raia Olímpica da USP experimentar a modalidade. Nossa, odiei!
Com oito meses de treino, me tornei campeã mundial
Zé seguiu insistindo. Ele via em mim um potencial que eu não enxergava. Só me animei quando ele garantiu que poderia competir pelo mundial em Munique, na Alemanha. Nem passaporte eu tinha, mas arrumei um rapidinho. Quem diria: a menina sem perna que nunca havia saído de Carapicuíba (SP) tinha chances de competir em terras alemãs!
Treinei o ano inteiro e, em setembro, participei da minha primeira competição. Remei como se não houvesse amanhã. A prova acabou. Fiquei em primeiro lugar e não percebi, pois a narração era toda em alemão. A ficha só caiu quando vi minha foto estampada no telão. Com oito meses de treino eu já era campeã mundial! Inesquecível, o filme que passou na minha cabeça enquanto subia naquele primeiro pódio.
Desde então, ser remadora virou minha profissão. Sou aposentada por acidente de trabalho, mas é o esporte que paga minhas contas; tenho uma bolsa federal e uma do time São Paulo. Minha rotina é remar, comer e dormir. Treino duas vezes por dia, de segunda a sábado. Como boa profissional, cumpro horários e bato metas. Meu maior desafio como atleta é encontrar patrocinador, alguém que acredite no meu potencial. Parece que grandes marcas não enxergam os paralímpicos como atletas.
Precisamos do pódio para chamar atenção e, só então, conquistar um suporte financeiro estável. Que seja! Se perder uma perna não me paralisou, não é a falta de grana que o fará. Pois os problemas ganham outro peso quando a gente para de lutar contra e aprende a viver com. É por ter essas reflexões que eu prefiro a Claudia de agora a de antes. Não trocaria meu corpo por nenhum outro. Ele carrega a minha história, é a minha marca registrada.
Claudia Santos, 39 anos, remadora paralímpica
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