Brasil

O último abraço de um menino antes de ser engolido pela lama em Minas

09/11/2015
O último abraço de um menino antes de ser engolido pela lama em Minas

 

Vista aérea da destruição causada por rompimento de barragens com resíduos de mineração, em Bento Rodrigues (Foto: AFP)

Vista aérea da destruição causada por rompimento de barragens com resíduos de mineração, em Bento Rodrigues (Foto: AFP)

A secretaria municipal de Educação de Mariana, Elisabeth Costa, disse no sábado (8) que o menino Thiago Damasceno dos Santos, de 7 anos, morreu durante o rompimento de duas barragens da mineradora Samarco, na quinta-feira . A notícia foi dada à mãe da criança, a soldadora Geovanna Rodrigues, de 28 anos. “Tenho que aceitar a verdade. Só não quero ver o corpo do meu filho. Vou fazer de conta que ele está dormindo ou viajando. Era meu único filho. Minha vida acabou”, desabafou a mãe, desesperada.

Thiago Santos abraçou sua avó Darci quando começou o desmoronamento. “Jesus, me ajude!”, foram as últimas palavras do menino de sete anos antes de a avalanche de lama o engolir para calar sua voz.

Seu nome estava na lista de desaparecidos de Bento Rodrigues, o povoado que ficou devastado pela fúria do tsunami gerado pelo rompimento de dois depósitos com resíduos de minério de ferro e água.

“Minha vida acabou, antes lutava por ele, saía para trabalhar por ele, para lhe dar um futuro. Agora não tem sentido, continuar para que?”, lamenta, devastada, a mãe de 28 anos, Geovana Aparecida Rodrigues, com os olhos vermelhos de tanto chorar.

A avó, Darci Francisca dos Santos, de 58, sobreviveu. Foi encontrada a 500 metros de sua casa e está se recuperando no hospital.

Medo

Geovana passa grande parte da semana fora de Mariana, trabalhando como soldadora perto de São Paulo. Darci cuidava de Thiago de segunda a sexta-feira em Bento Rodrigues, onde o menino frequentava a escola.

Passavam os finais de semana juntos.

Um dos maiores medos do menino, relembra a mãe, era precisamente morrer afogado. Em uma ocasião, Geovana pulou na água para resgatá-lo de uma piscina funda na qual o menino entrou para buscar uma bola.

“Neste dia me disse: ‘mamãe, quase morri, mas você me salvou’. Desta vez não pude salvá-lo”, relata soluçando.

Na fatídica quinta-feira, o menino estava em casa quando começou o desmoronamento: 55 milhões de metros cúbicos de resíduos minerais misturados com 7 milhões de m³ de água derramaram para destruir 80% de Bento Rodrigues.

“No momento em que ouviram o barulho da água sua avó se aproximou e o abraçou no quarto, enquanto entrava a avalanche de lama. Aí começou: Jesus, me ajude! Jesus, me ajude… até que não o escutou mais, a lama o havia engolido”, narrou Geovana à AFP.

Não está claro por que não saíram correndo, por que optaram por ficar em casa. A avó se recupera.

 

Pessimismo

Os bombeiros se negam a declarar como mortos os 28 desaparecidos nesta tragédia. Até agora foram confirmadas duas mortes pela catástrofe.

“Trabalhamos até o último minuto na busca de vidas, em nenhum momento vamos trabalhar na busca de corpos”, declarou o comandante geral dos bombeiros de Minas Gerais, coronel Luiz Gualberto Moreira.

São 58 bombeiros especializados em resgate distribuídos em toda a zona afetada, que além de Bento Rodrigues castigou outros cinco distritos. Sete helicópteros prestam apoio aéreo.

As equipes de resgate estão abrindo buracos na lama para que um cão treinado fareje qualquer rastro de vida… ou morte.

Mas os dias passam e a esperança começa a apagar o otimismo de algumas autoridades.

“Não quero tirar a esperança de ninguém, pode ser que consigamos resgatar alguém com vida, mas à medida que vai passando o tempo a esperança vai diminuindo”, reconheceu o governador Fernando Pimentel.

Em paz

Como Geovana, Marcelo Felício não acredita que sua mãe apareça com vida.

Marcelo trabalha na mina onde ocorreu o incidente e se culpa por não ter se mudado antes deste lugar onde cresceu, sabendo dos riscos que implicava viver sob este depósito.

Estava no escritório e saiu desesperado rumo à casa quando escutou os alarmes. Sua família e a de sua esposa viviam lá.

“Quando cheguei estava tudo inundado, tive que dar uma volta. Ao chegar estava todo mundo desesperado, tive notícias de que meu irmão, meu cunhado e sobrinha estavam bem, a família de minha esposa também, mas depois me disseram: ‘sua mãe não estava na casa de sua irmã'”, recordou.

Maria das Graças Celestino da Silva, de 65 anos, estava na casa de Marcelo quando começou o desastre.

“Quando soube fechou a porta de casa e saiu correndo, mas como ela estava velhinha a lama a alcançou”, relatou.

“Se ela estiver viva será uma alegria imensa tê-la novamente, mas se Deus decidiu levá-la espero que esteja em paz, porque foi uma grande mãe, a amo muito”, completou antes de romper em lágrimas.