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Pessoas curiosas costumam viver mais e melhor

13/07/2015
Pessoas curiosas costumam viver mais e melhor

 

Foto: pt.dreamstime.com

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Você está andando numa trilha e escuta um barulho estranho. A eletricidade da sua casa acaba bem na hora dos pênaltis do jogo. Sua paquera – que você nunca viu pessoalmente – deve chegar a qualquer momento no bar. É o primeiro dia no emprego novo. Seu amigo manda uma mensagem dizendo que tem boas novas. E você está lendo este texto pensando onde o autor quer chegar. Como essas situações fazem você se sentir? Bem, imagino que de maneiras diferentes, mas em todos os casos curioso ou curiosa.
Há tempos sou curiosa sobre o tema da curiosidade (com o perdão do trocadilho). Podemos dizer que a curiosidade começa com nosso desejo de saber mais. É esta “coceira” que nos coloca em um estado de ativo interesse. Quando estamos curiosos, vemos as coisas de modo diferente: aumentamos nossa capacidade de observação e temos mais consciência do que está ocorrendo no momento. Alguns autores tem considerado a curiosidade como um estado emocional no qual uma pessoa reconhece e busca novas informações que requerem a sua atenção.
A teologia e a mitologia reúnem diversas histórias sobre a curiosidade: Adão e Eva, Ícaro e o Sol, a Caixa de Pandora. Não é de surpreender que muitas vezes no passado ser curioso era considerado ruim, uma distração, uma “bisbilhotice”, um mal à alma e à sociedade. E por quê? Ian Leslie, autor do livro Curious: The Desire to Know and Why Your Future Depends on It, responde: a curiosidade não gosta de regras, ela prefere os caminhos desconhecidos, espontâneos; ela é desviante e busca aquilo que não entendemos, e que nos toca.
Pensando nessa questão, a psicóloga Laura Schulz do Instituto Massachusetts de Tecnologia (MIT) realizou um estudo com crianças em idade pré-escolar que pode nos ajudar a compreender melhor como funciona a curiosidade
No experimento, pesquisadores colocaram dois grupos de crianças diante de um determinado brinquedo. Um recebeu instruções sobre como ele funcionava; o outro, não. As crianças do primeiro grupo buscaram mais rapidamente um novo objeto para se divertir, enquanto as do segundo, que precisavam descobrir como ele operava, preferiram continuar com o brinquedo do que interagir com outro ao alcance delas. Assim, não foi o simples fato de estarem diante de algo novo que despertou a curiosidade delas, mas sim explorar aquilo que não era conhecido, isto é, tentar estabelecer relações causais entre os acontecimentos diante delas.
A conclusão dos pesquisadores é que nós não somos apenas curiosos em relação ao que é novo, mas sobretudo sobre aquilo que nos intriga, que de algum jeito desafia as nossas crenças e lógica. Afinal, quem nunca ficou curioso por uma coincidência totalmente improvável? Ou uma mágica aparentemente impossível? E, assim como o truque do mágico, a curiosidade termina ao se “matar a charada”.
Vemos assim o outro lado: se a curiosidade depende daquilo que não conhecemos, podemos dizer que ela cria uma abertura para experiências não familiares e descobertas. Ela motiva as pessoas a pensar e agir de maneira diferente, sendo ingrediente fundamental para aprender, conhecer pessoas, se aprofundar em assuntos de interesse, e – por que não? – sair da nossa zona de conforto e superar limites. No longo prazo, ser curioso é central para adquirir habilidades e conhecimento.
Cada vez mais, há um corpo de evidências científicas acerca da curiosidade, relacionando-a com inteligência, criatividade, habilidade em resolver problemas, aumento de iniciativa frente a desafios e autonomia. Segundo Ian Leslie, a curiosidade traz avanços em diversos aspectos da vida: desenvolvimento infantil, realização acadêmica, além do crescimento pessoal e da descoberta científica.
Estudos também destacam que ser curioso não é apenas relevante para melhorarmos nossas habilidades intelectuais, mas também para a nossa inteligência emocional e relacionamentos interpessoais. Por exemplo, há evidências de que pessoas com alto grau de curiosidade reportam mais experiências de intimidade com novos parceiros, possivelmente por dirigirem mais a atenção sobre eles e captarem mais as suas qualidades positivas, além de tenderem a manter mais interações sociais em geral. Também, costumam ter mais interesse nas suas experiências interiores, aspecto relevante para os relacionamentos.
E o que ocorre com o nosso cérebro quando estamos curiosos sobre algo? Esta foi uma das perguntas realizadas pelo Prof. Mathias Gruber e seus colegas da Universidade da Califórnia, num estudo que investigou como a curiosidade (“motivação intrínseca para aprender”) influencia a memória. Eles observaram que a curiosidade tende a colocar o cérebro em um estado que lhe permite aprender e reter qualquer informação, não apenas aquilo que se tem um interesse específico. Os pesquisadores também observaram que durante o estado de “alta curiosidade” haveria uma maior ativação do circuito cerebral relacionado ao sistema de recompensa (relevante para motivação e satisfação) e do hipocampo (relevante para a formação de novas memórias), assim como aumento da interação entre estas regiões. Assim, os autores concluíram haver uma relação entre os mecanismos presentes na curiosidade, motivação e aprendizado.
Na área do envelhecimento, pesquisas sugerem que o declínio da curiosidade em idosos pode representar piora na saúde em geral ou sinal inicial de doenças neurológicas, sendo relevante estimulá-la ao longo de toda vida. Isto porque, estando curiosos tendemos a aprender mais e, portanto, aumentamos a nossa reserva cognitiva – um fator de proteção para doenças neurológicas, como por exemplo a doença de Alzheimer. Paralelamente, crescem também as chances de termos um envelhecimento mais saudável ou “bem sucedido” (successful aging). Estudos mostram que idosos mais curiosos não só aumentam as chances de viver melhor, mas também mais tempo, isto é o que os Drs. Swan e Carmelli concluiram após avaliar o nível de curiosidade de 1.118 idosos entre 60 e 86 anos e os acompanharem durante cinco anos. Ao final, observou-se menor taxa de mortalidade entre os idosos que reportaram serem mais curiosos!
Até aqui, vimos uma série de benefícios relacionados à curiosidade ao longo da vida. Porém, será que ser curioso faz você ser mais feliz?

Curiosidade e felicidade

O que você mais quer na sua vida? Para a maioria de nós a resposta é “ser feliz”. Em uma pesquisa realizada com 10 mil de 48 países, felicidade foi considera mais importante que sucesso, inteligência, conhecimento, maturidade, sabedoria, relacionamentos e saúde.
Mas seria a felicidade em si a verdadeira meta que nós buscamos permanentemente? Essa busca funciona? Estamos nos tornando mais felizes? Para o psicólogo Todd Kashdan, autor do livro Curious? Discover the Missing Ingredient to a Fulfilling Life, a resposta é não. Segundo ele, tem sido vendida a idéia de que ser feliz é o único ou o mais importante objetivo na vida. Porém, quando centramos nossos esforços em sermos unicamente felizes, escapa a idéia de criarmos uma vida plena (fulfilling life), levando em conta toda a complexidade do ser humano. Assim, estaríamos ignorando outras peças do quebra-cabeça da vida, como por exemplo, significado da vida, maturidade, sabedoria, compaixão, entre outros.
E se fizermos as coisas unicamente para sermos felizes, o que acontece quando essa meta é alcançada? Provavelmente corremos o risco de nos encontrar numa busca monótona e sem fim pela felicidade, sem nunca, de fato, sentirmos a felicidade.
Bem, no lugar de tentarmos ser felizes a todo instante, Todd Kashdan afirma que deveríamos centrar esforços para construir uma vida com real sentido, guiada pelos nossos valores, interesses e experiências – tanto as boas como as ruins. Então, quando reconhecemos que há mais para uma vida plena do que o tal do “ser feliz”, nos resta uma importante questão: qual é o ingrediente central para construção de significados e uma vida plena? Todd responde: a curiosidade.
É possível “melhorar” a nossa curiosidade?
Boa notícia: a curiosidade pode ser nutrida e desenvolvida. Pesquisadores sugerem que podemos aumentar nosso poder de curiosidade transformando tarefas cotidianas em experiências interessantes: desde reconhecer e aprender o prazer de novas experiências, até encontrar novidade e significado em vivências familiares e corriqueiras.
As oportunidades para descobrirmos coisas novas estão à princípio em todo lugar. Mas para descobri-las precisamos desenvolver nosso “músculo da curiosidade”, por meio do uso regular e intenso dele. Veja abaixo algumas maneiras de começar a aumentar a capacidade da sua curiosidade:
– Ao caminhar: Olhe as coisas com “novos olhos”. Procure observar coisas na sua casa, parceiro ou familiares que você nunca reparou antes (algo físico, no jeito de ser, de fazer as coisas, manias).
– Ao conversar: Se esforce para se manter aberto (realmente) àquilo que lhe falam – evite julgar, categorizar, supor. Questione mais e escute com cuidado e atenção o que lhe dizem.
– Ao dirigir: Procure reparar no que as pessoas ao seu entorno estão fazendo, e tente antecipar o que os outros motoristas farão. Esteja consciente do que está além do seu horizonte.
– Ao trabalhar: Procure oportunidades para desafiar e busque maneiras de despertar seu interesse para produzir bons resultados ou coisas que lhe deixe orgulhoso. Faça perguntas como: O que é interessante aqui?; ou o que eu estou fazendo?; ou como eu posso fazer isso ficar mais divertido?
– Ao se exercitar: Em vez de apenas de movimentar, concentre sua atenção em sensações internas do seu corpo em cada movimento – o que você vê, sons e cheiros ao alcance.
– Você com você mesmo: Seja curioso sobre si próprio. Quais são seus valores e motivações? Quais atividades lhe fazem se sentir bem com a vida? O que lhe deixa realmente intrigado?